Pressionado pela contínua queda das receitas e pela regra que impõe um teto para as despesas públicas, o governo federal está conseguindo reduzir seus gastos. Nos quatro primeiros meses deste ano, o desembolso caiu 4,3% em termos reais – já descontada a inflação – em relação ao mesmo período de 2016. Em valores absolutos, o corte foi de R$ 17,4 bilhões.
O problema está na qualidade desse processo. Para manter o pagamento de salários e aposentadorias, que estão consumindo mais recursos, a União está tirando dinheiro de áreas como educação, saúde, saneamento e infraestrutura.
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Dados do Tesouro Nacional revelam que o maior corte está sendo feito nas despesas discricionárias, ou não obrigatórias – aquelas que, segundo o glossário do Orçamento, “efetivamente concorrem para a produção de bens e serviços públicos”. Coisas que vão da manutenção dos equipamentos de um posto de saúde a obras de saneamento, do material escolar ao recapeamento de rodovias.
Esse tipo de gasto somou R$ 69,1 bilhões de janeiro a abril – R$ 21,4 bilhões a menos que em igual período do ano passado. Em termos relativos, a tesourada foi de 23,6%
Dentro do grupo das despesas discricionárias, chama atenção a redução violenta nos investimentos públicos. Eles vinham encolhendo desde 2015, mas desta vez o tombo foi mais forte. Na comparação entre os primeiros quadrimestres de 2016 e 2017, o desembolso baixou 60,3%, para R$ 8,2 bilhões, o equivalente a um quarto do valor investido nos quatro primeiros meses de 2014.
Torneira fechada
O Ministério dos Transportes – que cuida, por exemplo, das estradas – investiu 40% menos. O da Saúde, 42%. No Ministério da Educação, o investimento caiu pela metade. Na pasta das Cidades, responsável por obras de infraestrutura urbana, o corte chegou a 63%.
Também houve quedas consideráveis nos ministérios da Integração Nacional (-44%), que toca programas de desenvolvimento regional, e da Defesa (-76%). No Ministério de Minas e Energia, a torneira secou: a pasta, que investiu cerca de R$ 1 bilhão entre janeiro e abril de 2016, desembolsou menos de R$ 6 milhões neste ano.
Infográfico: Cortes passam de 40% nos principais ministérios
Torneira aberta
Grande parte do dinheiro poupado nessas áreas tem sido usada para cobrir o forte crescimento das principais despesas obrigatórias – os salários do funcionalismo, as aposentadorias e as pensões.
Inflado pelos reajustes concedidos pelo presidente Michel Temer, o gasto com pessoal e encargos sociais consumiu R$ 6,1 bilhões a mais no primeiro quadrimestre deste ano, com aumento de 7,3% acima da inflação. Na Previdência, o aumento foi de 5,5%, ou R$ 8,8 bilhões, num reflexo do rápido crescimento do número de beneficiários de aposentadorias e pensões.
Queda na arrecadação mantém contas públicas no vermelho
A queda de 4,3% nos gastos totais não foi suficiente para colocar no azul as contas do governo federal, porque a arrecadação também caiu. Descontadas as transferências a estados e municípios, a receita do governo baixou 1,9% em termos reais. Com receita líquida de R$ 383,6 bilhões e despesa de R$ 389,3 bilhões, a União fechou o primeiro quadrimestre com déficit primário de R$ 5,6 bilhões, resultado um pouco melhor que o do mesmo período de 2016 (déficit de R$ 8,2 bilhões).
Previdência já consome 64% das receitas
O relatório do Tesouro traz números alarmantes sobre a trajetória dos gastos com aposentadorias e pensões. Na soma do INSS com o regime próprio dos servidores federais e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), a Previdência Social está consumindo o equivalente a 64% da receita líquida do governo federal, já descontadas as transferências a estados e municípios.
Em outras palavras, quase dois terços da arrecadação federal são usados para pagar aposentados, pensionistas e as pessoas de baixa renda – idosos e deficientes físicos – que recebem o BPC. Seis anos atrás, esses gastos abocanhavam 46% da receita.
Como o governo tem de arcar com outros gastos obrigatórios, como os salários do funcionalismo, e as receitas despencaram por causa da recessão, a União está precisando se endividar mais para dar conta do orçamento. Com isso, as contas federais já estão no quarto ano de déficit primário – ou seja, o saldo é negativo antes mesmo do pagamento dos juros da dívida.
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