A mais recente pesquisa Ibope que mediu a aprovação do governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) acende um alerta para as movimentações políticas que visam às eleições municipais do ano que vem. Se o governo não der uma guinada e deixar as crises políticas para trás, candidatos a prefeito ligados ao presidente podem não ter a vida tão fácil nas urnas como o esperado.
Em 2018, o “fenômeno Bolsonaro” renovou o Congresso Nacional e fez com que o partido do presidente, o PSL, que tinha eleito apenas um deputado federal em 2014, conquistasse a segunda maior bancada da Casa, com mais de 50 parlamentares. Além disso, candidatos a governador que surfaram na onda e apoiaram explicitamente o capitão da reserva nas eleições acabaram eleitos com certa facilidade.
Foi o caso, por exemplo, do governador eleito em Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), que estava em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto até declarar apoio a Bolsonaro – contrariando o próprio partido, que tinha candidato próprio na disputa presidencial. Zema passou para o segundo turno e venceu as eleições no estado.
Em São Paulo e no Rio de Janeiro, o “fenômeno Bolsonaro” também produziu efeitos, elegendo João Doria (PSDB) e Wilson Witzel (PSC), respectivamente, que apoiaram o presidente eleito.
A expectativa natural seria de que a onda Bolsonaro também influenciasse as eleições municipais de 2020. Figuras do próprio PSL já chegaram a ser cotadas para as prefeituras de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo.
Pesquisa Ibope e crises
A pesquisa divulgada pelo Ibope em março mostrou que a aprovação do governo Bolsonaro caiu 15 pontos e chegou a 34%. O índice é menor do que os dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula (PT) e Dilma Rousseff (PT) no mesmo período do primeiro mandato. A reprovação ao governo Bolsonaro, por outro lado, subiu de 11% para 24%.
Aliada à queda no índice de aprovação está uma série de crises no governo, que está completando apenas três meses. A mais recente envolveu o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), e colocou em risco a aprovação da reforma da Previdência, considerada crucial para o governo.
Para o cientista político Leonardo Barbosa e Silva, Bolsonaro pode ter dificuldade em se tornar um bom cabo eleitoral nas eleições do ano que vem. “O governo por si só não conseguiu montar com a sociedade aquele diálogo um pouco mais calmo, mais sereno, mostrando os projetos de longo prazo que pretende colocar em ação. Acho que do ponto de vista do diálogo direto com a sociedade o governo não conseguiu manter base de apoio dele”, diz o especialista.
Segundo o cientista político, se o desgaste do governo se aprofundar daqui para frente, é possível que eventuais candidatos possam tentar se desvincular do presidente. “Se eu pudesse fazer alguma projeção para o futuro, diria que vamos ter muita dificuldade do governo Bolsonaro produzir o mesmo impacto nos municípios como produziu na Câmara dos Deputados. E se o desgaste do governo continuar nesse ritmo, é bem provável que as próprias candidaturas municipais vão tentar se afastar do governo”, diz.
“Toda vez que um candidato se associa a um governo que está em processo de desgaste, há uma tendência que ele também perca parte da aprovação popular, então a tendência, se confirmada a realidade hoje, é que os candidatos mais próximo às eleições municipais, tentem não se vincular a figura do presidente da República”, explica Silva.
Possíveis candidatos : Joice e Janaína em São Paulo
No caso de São Paulo, a deputada federal Joice Hasselmann (PSL) admitiu ter sido sondada pelo próprio Bolsonaro para entrar na disputa pela prefeitura. Joice foi eleita com mais de um milhão de votos para a Câmara dos Deputados – a mulher mais votada para esse cargo da história – e atualmente ocupa é líder do governo no Congresso.
Em fevereiro, Joice admitiu que o partido já estudava nomes para lançar à prefeitura de São Paulo no ano que vem. “Fui eleita deputada. Quem decide para que rumo eu vou é o povo de São Paulo, que me elegeu. Meu partido, por óbvio já me sondou, tanto o presidente quanto o vice. Eu e a Janaína [Paschoal]. Eu conversei com ela, mas ainda tem muita água para passar debaixo da ponte. Estou aqui para o que o povo decidir”, afirmou.
Janaína Paschoal foi eleita deputada estadual – a mais votada do Brasil –, também pelo PSL, e é um dos nomes cotados pelo partido para disputar o cargo na prefeitura. Ela também foi cotada para ser candidata a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, mas não aceitou o convite, Recentemente, concorreu à presidência da Assembleia Legislativa de São Paulo, mas foi derrotada.
Segundo Silva, no cenário atual, Janaína tem mais chances de vencer uma eventual disputa pela prefeitura de São Paulo do que Joice. “A Janaína mostrou em alguns momentos alguma independência, alguma autonomia, fazendo críticas a posturas e ações do governo. Coisa que alguém que é líder do governo não pode fazer. A Joice, por ofício, está impedida de externar as contradições do governo. A Janaína não tem tanto essa obrigação. Esse movimento de afastamento em relação ao governo é que pode render a ela algum tipo de expectativa para as eleições”, explica.
No Rio também já se fala em nomes para candidatos de Bolsonaro
No Rio de Janeiro também há nomes do PSL que foram sondados para comandar a prefeitura. Entre os nomes, chegou a ser cogitado o ex-ministro Gustavo Bebbiano, que foi uma peça central na campanha do presidente Jair Bolsonaro. A situação do ex-ministro ficou incerta depois dos desentendimentos com a família Bolsonaro que levaram à sua exoneração do cargo. Mesmo assim, um dos motivos pelos quais o ministro não deixou o governo “atirando” contra Bolsonaro seria justamente a pretensão de disputar a prefeitura.
O mais cotado, porém, é o deputado estadual Rodrigo Amorim (PSL). Ele foi o mais votado do estado, com mais de 140 mil votos. Amorim se envolveu em uma polêmica na campanha ao quebrar a placa com o nome da vereadora assassinada Marielle Franco (PSol) em um evento ao lado do então candidato ao governo, Wilson Witzel (PSC). O deputado é próximo do senador Flávio Bolsonaro (PSL), um dos filhos do presidente.
Especialista diz que ainda é cedo para prever cenários
Faltando cerca e um ano e meio para o início das campanhas para as eleições municipais, Silva diz que ainda é cedo para cravar cenários para as disputas. “Esse turbilhão que tem sido a relação entre o Executivo e o Legislativo no Brasil, acho que ele ainda deixa cada peça do jogo de xadrez em uma condição de grande aventureiros. Acho que precisaria esperar mais um pouquinho para que isso se consolidasse”, destaca o cientista político.
“A gente tem que esperar primeiro para ver se o governo consegue retomar algum nível de pacificação da relação com a imprensa, com o mercado, com o Congresso e com o resto da sociedade. Se isso não for possível, o cenário de crise se aprofunda e a gente pode ter algumas surpresas em termos de nomes para as prefeituras”, diz Silva.
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