A multa bilionária que a J&F terá de pagar no acordo de leniência com o Ministério Público Federal, que pode chegar a R$ 11 bilhões, vai machucar o caixa da empresa, mas não a ponto de inviabilizar os negócios da família Batista. No entanto, essa é só uma das batalhas que a holding terá de enfrentar. A principal delas será com a Justiça americana, onde as leis anticorrupção são bastante severas, com multas pesadas e sanções. Outra dificuldade está na provável necessidade de venda de ativos pelo grupo, que poderá esbarrar nas exigências maiores dos compradores, receosos em assumir parte dessas penalidades em um processo de sucessão de controle. “Agora, são todos ativos tóxicos. As empresas do grupo ficaram contaminadas. Quem for comprar, para se resguardar, vai querer pagar menos pelo ativo”, diz um advogado especialista no assunto.
O temor está baseado na falta de clareza do envolvimento de outras empresas do grupo, além da JBS, nos esquemas de corrupção confessados pelos controladores da matriz, ou outros atos ilícitos. “Quem comprar vai querer um contrato bem amarrado e vai pensar mais nas consequências jurídicas. Vai ser um processo mais demorado”, afirmou o executivo de uma assessoria financeira.
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No Brasil, a J&F propôs pagar multa de R$ 4 bilhões, mas o valor foi negado pelo Ministério Público Federal, que mantém a exigência de um valor bem maior: R$ 11 bilhões. O grupo J&F tem faturamento anual de cerca de R$ 192 bilhões, sendo que a JBS responde por quase 90% desse total.
Lei americana
Além dessa multa, a J&F terá de acertar as contas também com a Justiça americana, e a fatura também não deve ser baixa. A empresa praticou – e já confessou – uma série de crimes que a colocam na mira da Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), que pune empresas com atuação nos Estados Unidos que tenham praticado atos de corrupção, ainda que em outros países. A JBS tem uma presença relevante em território americano, com 37 unidades de processamento de carnes, além de fábricas de rações, de pratos prontos e confinamentos.
Para lidar com os problemas jurídicos nos Estados Unidos, que vão desde ações de acionistas até as negociações com o Departamento de Justiça, a empresa contratou o escritório Baker & McKenzie. A J&F afirmou que os acordos com as autoridades brasileiras e americanas serão feitos em separado e que espera uma solução ocorra dentro de um prazo razoável: “A J&F contratou o escritório Baker McKenzie para assessorar a empresa nos Estados Unidos. A companhia está cooperando completamente com as autoridades e está focada em encontrar um desfecho adequado em um prazo razoável. O acordo com o Ministério Público Federal, no Brasil, é tratado de maneira independente e as negociações estão em curso”, disse a companhia em nota.
Venda de ativos
A holding tem estrutura de capital para bancar essa multa no Brasil e outros compromissos financeiros, mas vender ativos pode ser uma saída para se concentrar ainda mais no seu principal negócio e também para fazer um caixa para enfrentar algum período de maior restrição a recursos financeiros por parte dos bancos, ainda mais se o patrimônio da empresa precisar ser ajustado. “Acho que o acordo de leniência não coloca em risco a viabilidade da empresa. Mas de qualquer forma não é positivo, porque vai afetar a capacidade de alavancagem da empresa e a rentabilidade”, disse Pablo Spyer, diretor de operações da corretora Mirae.
Dois bancos consultados pela reportagem afirmaram que, no curto prazo, não há preocupação com a estrutura de capital (capacidade de pagamento dos diversos compromissos financeiros) das empresas da J&F, que segue em dia com suas obrigações. Além disso, alguns de seus ativos são facilmente “vendáveis”. Por enquanto, a atuação das instituições financeiras tem sido observar as movimentações para saber que consequências financeiras as ações decorrentes da delação premiada dos executivos da JBS vão causar sobre as empresas.
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Ativos considerados não estratégicos para o principal negócio do grupo, a JBS, devem ser vendidos. A Alpargatas e a Vigor são consideradas as empresas mais atrativas. No entanto, os compradores vão ter um cuidado redobrado ao definir o preço a pagar e também deverão pedir cláusulas de proteção, para evitar qualquer problema no futuro. “Não há um impedimento da venda de controle, mas qualquer mudança societária ou reorganização faz com que o comprador seja solidário, se a Justiça entender que a operação teve como objetivo o esvaziamento do patrimônio dos controladores. É algo subjetivo. Sob a ótica do comprador, ele vai ter de fazer uma análise muito mais cuidadosa para não ser surpreendido”, avalia o professor de direito da FGV-SP Mario Engler, especialista em direito empresarial.
Além de uma análise mais minuciosa dessas empresas, os compradores devem também negociar proteções adicionais, como a criação de uma conta-depósito para cobrir eventuais multas futuras. E, enquanto a imagem da maior empresa do grupo está arranhada, os investidores migram para outras empresas do setor. “Há uma troca de ações para BR Foods e Minerva. Elas estão se beneficiando da delação premiada da JBS”, afirma Spyer, da Mirae.
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