O procurador-geral da República Rodrigo Janot denunciou criminalmente o presidente Michel Temer e o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) por corrupção passiva no caso JBS. A denúncia foi protocolada nesta segunda-feira (26) no Supremo Tribunal Federal (STF). Janot atribui crime a Temer a partir do inquérito da Operação Patmos – investigação desencadeada com base nas delações dos executivos do grupo J&F, que controla a JBS.
É a primeira vez na história da República brasileira que o Ministério Público Federal (MPF) acusa um presidente no exercício do cargo pela prática de crime comum.
Leia a íntegra da denúncia do procurador-geral Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer
A ação proposta por Janot não pode ser aberta diretamente pelo Supremo. O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte máxima, terá de enviar a acusação formal do procurador à Câmara dos Deputados. Para autorizar a abertura do processo contra o presidente é necessária a aprovação de dois terços dos 513 deputados.
O caso JBS mergulhou o presidente em sua pior crise política. Na noite de 7 de março, Temer recebeu no Palácio do Jaburu o executivo Joesley Batista, que gravou a conversa com o peemedebista. Nela, Joesley admite uma sucessão de crimes, como o pagamento de mesada para comprar o silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB).
A investigação revelou os movimentos do homem da mala, Rocha Loures, ex-assessor especial do presidente. Na noite de 28 de abril, Loures foi flagrado em São Paulo correndo com uma mala de propinas da JBS – 10 mil notas de R$ 50, somando R$ 500 mil. Janot aponta que a propina seria destinada a Temer, o que é negado pela defesa do presidente.
Segundo a denúncia do procurador-geral, “entre os meses de março a abril de 2017, com vontade livre e consciente, o Presidente da República Michel Miguel Temer Lulia, valendo-se de sua condição de chefe do Poder Executivo e liderança política nacional, recebeu para si, em unidade de desígnios e por intermédio de Rodrigo Santos da Rocha Loures, vantagem indevida de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) ofertada por Joesley Mendonça Batista, presidente da sociedade empresária J&F Investimentos S.A., cujo pagamento foi realizado pelo executivo da J&F Ricardo Saud”.
“Além do efetivo recebimento do montante espúrio mencionado, Michel Temer e Rodrigo Loures, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, com vontade livre e consciente, ainda aceitaram a promessa de vantagem indevida no montante de R$ 38 milhões”, diz Janot.
Procurador diz que Temer “ludibriou os cidadãos brasileiros”
Na denúnciaF, Janot foi duro com Temer e afirmou que o peemedebista “ludibriou” sobretudo os eleitores que votaram na chapa que ele compôs com a presidente Dilma Rousseff.
“Não se nega que Michel Temer tem, atualmente, projeção política. Afinal de contas, é o atual Presidente da República, tendo sido vice-presidente da República de 2011 a 2016. É um dos chamados caciques do PMDB, foi eleito presidente da Câmara dos Deputados por duas vezes e eleito presidente nacional de seu partido em 2001. Ludibriou os cidadãos brasileiros e, sobretudo, os eleitores, que escolheram a sua chapa para o cargo político”, diz Janot, no final da denúncia.
O procurador diz ainda que, em dimensão menor, Rocha Loures violou a dignidade do cargo de deputado federal. E que a cena dele correndo com uma mala cheia de dinheiro é uma “afronta ao cidadão”.
“A cena do parlamentar correndo pela rua, carregando uma mala cheia de recursos espúrios, é uma afronta ao cidadão e ao cargo público que ocupava. Foi subserviente, valendo-se de seu cargo para servir de executor de práticas espúrias de Michel Temer. Não há dúvida, portanto, de que o delito perpetrado pelos imputados Michel Temer e Rocha Loures, em comunhão, de ação e unidade de desígnios, causou abalo moral à coletividade, interesse este que não pode ficar sem reparação”.
Obstrução da Justiça
Também nesta segunda, a Polícia Federal encaminhou ao STF o relatório final do inquérito contra Temer, com o laudo da perícia feita na gravação de Joesley. A PF concluiu que há elementos concretos que apontam para a prática do crime de obstrução de investigação de organização criminosa por parte do presidente da República.
O relatório final deve embasar uma segunda denúncia que Janot pretende fazer contra Temer, agora pelo crime de obstrução da Justiça.
Outro lado
O Palácio do Planalto não vai se manifestar a respeito da denúncia protocolada pelo procurador-geral da República no STF. Oficialmente, a Secretaria de Imprensa respondeu que a orientação é procurar o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, advogado de Michel Temer.
Segundo um auxiliar do presidente, “é zero” a chance de que o porta-voz oficial da presidência, Alexandre Parola, faça algum tipo de pronunciamento nesta segunda. Até o momento, a reportagem não conseguiu retorno de Mariz.