A Polícia Federal concluiu em relatório que não há prova de crime de obstrução à Justiça por parte dos senadores Romero Jucá (PMDB-RR) e Renan Calheiros (PMDB-AL) e do ex-senador José Sarney (PMDB-AP) no caso investigado a partir da delação do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado.
A polícia também propôs que Machado deixe de obter os benefícios do acordo de delação fechado em 2016 com a Procuradoria-Geral da República (PGR) e homologado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, morto em janeiro passado.
O relatório é assinado pela delegada Graziela Machado da Costa e Silva e foi entregue nesta sexta-feira (21) ao Supremo. A conclusão será avaliada pela PGR, a quem cabe pedir arquivamento ou denunciar os investigados. O órgão também poderá pedir mais prazo para novas diligências. No ano passado, a Procuradoria pediu a prisão dos três políticos, acusando-os de obstrução à Justiça. As prisões foram negadas por Teori.
No relatório, a delegada trata de gravações feitas por Machado com os três em que, na avaliação da PGR, eles discutiram formas de obstrução da Lava Jato. A delegada, no entanto, afirmou que “as conversas estabelecidas entre Sérgio Machado e seus interlocutores limitaram-se à esfera pré-executória, ou seja, não passaram de meras cogitações” e que “as condutas evidenciadas não atingem, numa concepção exclusivamente criminal, o estágio” de se provar “o delito em questão”.
“Estancar a sangria” e “solução Michel”
As conversas foram gravadas por Machado entre fevereiro e março de 2016. Em uma delas, revelada em maio daquele ano, Jucá falou da necessidade de um “acordo nacional”, que incluiria membros do STF, para “estancar a sangria” da Operação Lava Jato. “Só política, como é a política, tem que resolver essa porra, tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria”, disse Jucá, conforme a transcrição feita pela PF.
O senador também falou sobre a “solução Michel”, em referência à substituição da presidente Dilma Rousseff pelo seu então vice, Michel Temer (PMDB), o que veio a ocorrer depois do diálogo, com o impeachment e afastamento da presidente do cargo.
Após a revelação do teor do áudio, Jucá pediu demissão do cargo de ministro do Planejamento do governo de Temer, que acabara de ter início, de forma interina, após o afastamento de Dilma pelo Senado no processo de impeachment. O episódio gerou a primeira grave crise política no Palácio do Planalto. Hoje, Jucá é líder do governo no Senado. Na época dos diálogos, Renan presidia a Casa.
Para a delegada, não ficou comprovado que os três tenham procurado impedir que o inquérito que investigava Machado, em Brasília, no STF, fosse enviado à primeira instância da Justiça Federal, para o juiz de Curitiba Sergio Moro. O delator pedia, nas conversas com os três, que o inquérito permanecesse no Supremo.
Para a delegada, “não são poucas as vezes em que ele próprio, Sérgio Machado, instiga a adoção do procedimento que ora delata e ao qual foi atribuído viés criminal”.
Segundo o relatório policial, o tipo penal da obstrução à Justiça “sofre duras críticas da doutrina, por ser extremamente aberto, gerando insegurança e perplexidade ao intérprete. A dificuldade se soma ainda ao limiar da definição do que seria a ‘criminalização da política’ e a atividade parlamentar livre e imune”.
A delegada disse que, ao longo da investigação, “com uma nova oportunidade de esclarecimento por parte do colaborador e apresentação da versão dos interlocutores das gravações, bem como análise da atuação parlamentar dos investigados, não conseguimos vislumbrar a concretização dos núcleos do crime ‘obstrução à justiça’“.
Não houve mudanças legislativas, diz a PF
A PF diz ainda ter investigado se os três políticos tentaram fazer mudanças legislativas para embaraçar a Lava Jato. Ela concluiu que “não foram encontradas proposições relacionadas especificamente aos temas de leniência, colaboração premiada e execução de pena após condenação em segunda instância”.
Para a policial, “qualquer iniciativa tendente a modificar a legislação atual não escaparia de percorrer o processo legislativo estabelecido na Constituição Federal, o que lhe daria legitimidade”.
Ouvido pela PF, Jucá disse que “o processo de impeachment poderia ser barrado naquela corte [STF], como efetivamente se tentou fazer, sendo necessário que houvesse uma conversa entre todos os ‘atores’, incluindo Executivo, Judiciário e Legislativo, sendo que a função do STF seria a de modular ou balizar o processo de impeachment que, ao final, acabou fazendo”.
Segundo o senador, “o contexto da conversa era sobre uma solução política que envolvia a substituição do presidente da República, consistindo no grande crise que abalava o país, e não sobre a operação Lava Jato”.
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