Logo após a deflagração da 60ª fase da Lava Jato do Paraná, que prendeu Paulo Vieira de Souza, o suspeito de ser operador do PSDB conhecido como Paulo Preto, o procurador Deltan Dallagnol foi às redes sociais. “Vejo tweets receando que o ministro Gilmar Mendes solte Paulo Preto mais uma vez em liminar. Isso é impossível debaixo da lei. O relator desse caso no Supremo não é ele e sim o ministro Fachin”, disse.
Em resposta, a ex-coordenadora da Lava Jato em São Paulo, Thaméa Danelon, afirmou: “Mas Gilmar Mendes pode proferir uma decisão completamente ilegal e inconstitucional dizendo que ele é o juiz prevento para todos os casos em que Paulo Preto for preso. Um absurdo? Sim. Mas Gilmar já proferiu varias decisões absurdas!!!”. Deltan retuitou, acrescentando que “se isso acontecesse seria um caso de exercício arbitrário de poder, fora do Direito”.
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Com a argumentação de que eventuais desvios de dinheiro cometido por Paulo Preto foram repassados para ex-diretores e ex-gerentes da Petrobras, a Lava Jato conseguiu afastar – ao menos a princípio – o que sempre considerou um entrave para casos relacionados aos governos tucanos em São Paulo: a relatoria do ministro Gilmar Mendes nos recursos feitos ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A conexão com a Petrobras faz com que o caso de movimentação de R$ 130 milhões em contas na Suíça passe de São Paulo, onde a apuração começou e ficou travada por mais de um ano por determinação de Gilmar, para Curitiba, que tem relatoria de Edson Fachin, cujas decisões têm sido mais rígidas e em consonância com os pedidos da Procuradoria.
O inquérito relatado por Gilmar Mendes foi enviado a São Paulo apenas no início de 2019, mesmo assim apenas para o Tribunal Regional Eleitoral. “As evidências revelaram que, no mesmo período que se seguiu à entrega dos valores em espécie por Paulo Preto para a Odebrecht, propinas foram pagas pela empreiteira, em espécie, para os seguintes gerentes e diretores da Petrobras: Djalma Rodrigues, Maurício Guedes, Roberto Gonçalves, Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Sérgio Machado”, diz o material divulgado pelo Ministério Público Federal à imprensa.
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O procurador da República Roberson Pozzobon negou que a operação tenha sido uma manobra. Segundo ele, a investigação não se centra nos crimes de corrupção praticados por Paulo Preto, mas na lavagem e evasão de divisas que ele cometeu em favor da Odebrecht – algo que, no entendimento do STF, é de competência da Justiça Federal do Paraná.
“Aqui, nós investigamos Paulo Preto como operador financeiro, e não como agente corrompido”, disse. “O nosso foco não está em como ele recebeu esse dinheiro e quais foram os ilícitos, mas sim o fato de que ele forneceu valores à Odebrecht e, em contrapartida, recebeu recursos ilícitos da empresa no exterior.”"
A Procuradoria argumenta que “no mesmo período que se seguiu à entrega dos valores em espécie por Paulo Preto para a Odebrecht, propinas foram pagas pela empreiteira, em espécie, para os seguintes gerentes e diretores da Petrobras: Djalma Rodrigues, Maurício Guedes, Roberto Gonçalves, Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Sérgio Machado”.
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“Compreender o esquema criminoso desde a sua gênese é muito caro para nós, até para que tenhamos provas mais robustas contra esses agentes”, afirmou Pozzobon.
Como as apurações sobre a movimentação financeira de Paulo Preto não podiam avançar na capital paulista, a Lava Jato do estado apresentou outras duas denúncias contra ele: por suspeita de desvios em reassentamentos no Rodoanel Sul e formação de cartel para obras viárias.
Ex-diretor da Dersa (estatal paulista de rodovias) no governo do tucano José Serra (2007-2010), ele chegou a ser preso preventivamente duas vezes no ano passado, mas em ambas as situações foi solto por habeas corpus concedidos por Gilmar.
Nesses dois casos, se tornou réu, mas deve ser beneficiado com a prescrição do primeiro após uma decisão de Gilmar que tornou mais lenta a tramitação do processo – em 7 de março, Paulo Preto completa 70 anos e o prazo para que acusações contra ele caduquem se reduz à metade. A primeira prisão levantou suspeitas de que o ex-diretor pudesse firmar um acordo de delação premiada que miraria o alto escalão do PSDB paulista.
Na Lava Jato, Paulo Preto é citado por sete delatores, que dizem que ele pediu a dez empreiteiras que fizeram o trecho sul do Rodoanel um suborno equivalente a 0,75% de tudo que elas recebessem.
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As contas de Paulo Preto na Suíça foram encerradas no primeiro trimestre de 2017, depois de o acordo da Odebrecht ter se tornado público. Em seguida, os valores foram transferidos para contas nas Bahamas. Ele sempre negou ter cometido qualquer irregularidade.
Com essa nova prisão, o ex-diretor passa a ser considerado pela Procuradoria um operador financeiro da Odebrecht, e não mais apenas das campanha do PSDB de São Paulo.
Em nota, o procurador Julio Noronha, de Curitiba, expõe o entendimento do Ministério Público Federal com a nova ação: “É fundamental que as apurações sobre corrupção não sejam deslocadas para a Justiça Eleitoral e que a execução das penas pelos agentes corruptos não seja postergada indefinidamente.”
Juíza cita Gilmar
No despacho que autorizou a prisão preventiva, a própria juíza substituta da 13ª Vara Federal de Curitiba, Gabriela Hardt, cita Gilmar Mendes. “Não desconhece esta julgadora que Paulo Vieira de Souza é também acusado perante a Justiça Federal de São Paulo”, escreveu Hardt.
“Naquele contexto, a pedido do MPF, em abril de 2018, a 5ª Vara Federal Criminal da Justiça Federal de São Paulo decretou a sua prisão preventiva. O fundamento consistiria no risco à instrução penal, haja vista que Paulo Vieira de Souza teria ameaçado coacusada colaboradora.”
“A prisão foi suspensa pelo Eminente Ministro Gilmar Mendes”, acrescentou. “De acordo com o Eminente Ministro, além de não existirem indícios de autoria das ameaças, a preventiva seria ineficaz a prevenir o risco atrelado ao depoimento de corré em juízo.”
Ela cita ainda a segunda prisão preventiva de Paulo Preto, também revogada por Gilmar, e afirma: “O presente caso, respeitosamente, foge ao alcance das decisões do Eminente Ministro.”
Segundo ela, o processo não discute suspeitas de crimes relativos a desvios de dinheiro pelo ex-diretor enquanto integrante da Dersa, mas à geração de dinheiro para o setor de propinas da Odebrecht.
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