O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou impaciência com o procurador Athayde Ribeiro Costa ao ser questionado sobre obras feitas no sítio em Atibaia durante interrogatório na tarde desta quarta-feira (14), na Justiça Federal de Curitiba. O procurador do MPF insistia em perguntas sobre a propriedade do imóvel e as obras de melhorias, que teriam sido feitas a pedido de Lula, conforme sustenta a acusação.
O ex-presidente disse que estava “afirmando categoricamente” que jamais pediu a realização de obra alguma e que, por isso, não pagaria por elas. “As obras não foram feitas pra mim, portanto eu não tinha que pagar porque achei que o dono do sítio tinha pago. Só isso”, disse Lula.
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Nessa parte do depoimento, Lula começava respondendo a uma pergunta sobre o tríplex do Guarujá e o sítio em Atibaia. O procurador queria saber qual era a diferença do argumento do petista em relação aos imóveis: o tríplex não era dele, já que Lula não frequentava o condomínio, enquanto no sítio, do qual ele também nega a posse, havia bens pessoais. Já demonstrando irritação, Lula disse que “o tríplex não era, não é e não será” dele.
Sobre o sítio, o ex-presidente alegou que tinha bens pessoais no local porque tinha autorização do dono do sítio para frequentá-lo. “Que bens pessoais eu tinha no sítio? Cueca, roupa de dormir? Sabe, isso eu tenho em qualquer lugar que eu vou. E nenhum empresário pode afirmar que o sítio é meu se ele não for meu”, disse.
O procurador tentou questioná-lo sobre as obras, mas foi interrompido por um desabafo de Lula contra as delações. “Você não acha muito engraçado alguém fazer uma obra que eu não pedi e depois alguém negociar uma delação, sobre a pressão de que é preciso citar o Lula, e vocês colocam isso como se fosse uma verdade? Eu até nem ia responder coisa de delator aqui, mas eu tenho muitos amigos, eu sei como é a vida na cadeia, sei como é o sofrimento, sei qual é o preço da liberdade, eu sei qual é... e eu me ative a ficar quieto. Agora eu repudio qualquer tentativa de qualquer pessoa dizer que foi feita uma obra pra mim naquele sítio”, rebateu.
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Novamente, o procurador insistiu na pergunta e tentou explicar que, no crime de corrupção, há uma modalidade de receber coisas. Nesse momento, ele foi interpelado pelo advogado de defesa de Lula, Cristiano Zanin, que voltou a afirmar que o ex-presidente não havia recebido nenhuma obra e que era o procurador que insistia em tratar uma questão técnica fora do momento adequado.
A conversa sobre as obras voltou, com Lula reafirmando que não pagou nada, porque não tinha solicitado nenhuma obra e que isso seria por conta do dono do sítio, Fernando Bittar. Bittar foi ouvido na segunda-feira (12) e disse imaginar que Lula e sua esposa, Marisa Letícia, estavam pagando pelas obras feitas no local. Questionado sobre isso, Lula respondeu que se ele declarou isso, “paciência”. “Se ele falou que não pagou achando que a Marisa tinha pago [Lula bate as mãos na mesa], eu não tenho mais como perguntar”, disse.
Entenda o caso
A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) aponta que o petista é o dono de um sítio em Atibaia, que teria sido reformado por empreiteiras como forma de pagamento de propina ao ex-presidente. O imóvel está em nome de laranjas, segundo os procuradores, mas há uma série de elementos que ligam Lula ao sítio.
O MPF acusa as empreiteiras Odebrecht, OAS e Schahin de gastarem R$ 1,02 milhão em obras de melhorias no sítio em troca de contratos com a Petrobras.
Quem são os réus no processo?
Além de Lula, são réus no processo os executivos da Odebrecht, Carlos Paschoal, Emyr Costa, Alexandrino Alencar, Marcelo Odebrecht e Emílio Odebrecht; da OAS, Leo Pinheiro, Agenor Medeiros e Paulo Gordilho; o ex-segurança de Lula, Rogério Aurélio Pimentel; o advogado do petista, Roberto Teixeira; o proprietário formal do sítio, Fernando Bittar; e o pecuarista José Carlos Bumlai.
Outros interrogatórios
Desde o dia 5 de novembro, a juíza está interrogando os réus do processo. Os primeiros a serem ouvidos foram os ex-executivos Carlos Paschoal e Emyr Costa, da Odebrecht. Eles confirmaram a versão do MPF e disseram que a reforma realizada pela empreiteira no sítio era para o ex-presidente.
Marcelo Odebrecht também foi interrogado e contou que a reforma do imóvel era para “pessoa física de Lula”. “Seria a primeira vez que a gente estaria fazendo uma coisa pessoal para o presidente Lula”, disse o delator.
Na última segunda-feira (12), Hardt ouviu o ex-assessor de Lula, Rogério Aurélio Pimentel; o dono do sítio, Fernando Bittar; e o advogado Roberto Teixeira. Bittar afirmou à Hardt que acreditava que Lula pagou pelas obras realizadas na propriedade e que elas foram “superdimensionadas”.
Moro pediu férias para “evitar controvérsias desnecessárias”
A juíza Gabriela Hardt assumiu os processos da operação Lava Jato desde que o juiz Sergio Moro, que era responsável pelo caso, pediu férias para se dedicar ao planejamento de sua gestão à frente do Ministério do Planejamento do presidente eleito Jair Bolsonaro. Moro deve pedir exoneração da carreira de juiz em janeiro, para assumir o cargo. O juiz que ficará definitivamente à frente da Lava Jato será definido depois da exoneração de Moro, através de um concurso interno.
Hardt está interrogando os réus do processo do sítio em Atibaia desde o dia 5 de novembro. Ela também é responsável pelos 25 processos da Lava Jato em tramitação na Justiça Federal em Curitiba.
Outro lado
A defesa do ex-presidente divulgou a seguinte nota:
“O ex-presidente Lula rebateu ponto a ponto as infundadas acusações do Ministério Público em seu depoimento, reforçando que durante o seu governo foram tomadas inúmeras providências voltadas ao combate à corrupção e ao controle da gestão pública e que nenhum ato de corrupção ocorrido na Petrobras foi detectado e levado ao seu conhecimento.
Embora o Ministério Público Federal tenha distribuído a ação penal à Lava Jato de Curitiba sob a afirmação de que 9 contratos específicos da Petrobras e subsidiárias teriam gerado vantagens indevidas, nenhuma pergunta foi dirigida a Lula pelos Procuradores da República presentes à audiência. A situação confirma que a referência a tais contratos da Petrobras na denúncia foi um reprovável pretexto criado pela Lava Jato para submeter Lula a processos arbitrários perante a Justiça Federal de Curitiba. O Supremo Tribunal Federal já definiu que somente os casos em que haja clara e comprovada vinculação com desvios na Petrobras podem ser direcionados à 13ª. Vara Federal de Curitiba (Inq. 4.130/QO).
Lula também apresentou em seu depoimento a perplexidade de estar sendo acusado pelo recebimento de reformas em um sítio situado em Atibaia que, em verdade, não têm qualquer vínculo com a Petrobras e que pertence de fato e de direito à família Bittar, conforme farta documentação constante no processo.
O depoimento prestado pelo ex-Presidente Lula também reforçou sua indignação por estar preso sem ter cometido qualquer crime e por estar sofrendo uma perseguição judicial por motivação política materializada em diversas acusações ofensivas e despropositadas para alguém que governou atendendo exclusivamente aos interesses do País.”
Cristiano Zanin Martins
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