Metade dos servidores do Executivo federal poderá se aposentar nos próximos dez anos. E a forma como o governo vai repor – ou não – esses profissionais terá grande impacto sobre as contas públicas nas próximas décadas, segundo um amplo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), do governo federal.
Realizado ao longo de 2017, o trabalho foi publicado em fevereiro deste ano. Os pesquisadores Bernardo Schettini, Gustavo Pires e Cláudio Hamilton dos Santos fizeram simulações com base em dados do Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos (Siape), que abrange os empregados do Poder Executivo civil federal.
O estudo concluiu que 28% dos servidores ficariam elegíveis à aposentadoria, preenchendo os requisitos mínimos, até o fim de 2017. Isto é, eles podem deixar o serviço público assim que quiserem. Outros 23%, segundo o estudo, estarão aptos em algum momento ao longo dos próximos dez anos. Ao todo, portanto, 51% dos empregados civis do Executivo federal poderão se aposentar até 2027.
Caso a reforma da Previdência fosse aprovada com o mesmo texto que passou pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados em maio de 2017 (a PEC 287-A), o porcentual de servidores que desde já poderiam se aposentar não seria afetado e permaneceria em 28%, mas a proporção dos que se habilitariam para a aposentadoria no decorrer de uma década cairia para 20%, reduzindo assim o total para 48%.
A quantidade efetiva de aposentados nesse período, no entanto, tende a ser menor, porque nem todos os servidores deixam o serviço público logo que conseguem atender aos critérios mínimos de aposentadoria. Em vez disso, parte deles prefere aguardar alguns anos até cumprir condições que permitam um benefício de valor mais alto.
Considerando esse comportamento, os pesquisadores do Ipea fizeram uma “distribuição de probabilidade”, simulando um processo mais gradual de aposentadoria. Nessa estimativa, cerca de 46% dos servidores civis federais devem se aposentar nos próximos dez anos, caso não haja reforma da Previdência.
Se a reforma for aprovada, esse porcentual cai para 36%. E com isso o governo deixa de gastar cerca de R$ 78 bilhões em benefícios previdenciários ao longo de uma década, o equivalente a 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB) de 2016, dos quais R$ 32 bilhões em pensões por morte e R$ 45 bilhões em aposentadorias.
Menos concursos, salários iniciais mais baixos
A questão é que nem toda a redução de gastos com a Previdência do funcionalismo significaria uma economia efetiva para os cofres públicos, dizem os autores do estudo. Por um motivo simples: se por um lado o servidor vai demorar mais para se aposentar, o que alivia a despesa previdenciária, por outro ficará mais tempo na folha de pagamento dos funcionários ativos.
Para poupar mesmo, o governo terá de controlar a reposição dos aposentados, deixando de preencher parte dos cargos que ficarem vagos – o que significa negar pedidos de concurso até determinado limite – ou reduzindo os salários de entrada no serviço público. Ou uma combinação de ambos.
“As simulações para a reposição evidenciaram que não é pequena a economia viável de ser obtida pelo governo adotando uma política mais restritiva de contratação aliada a menores salários de entrada para os novos concursados”, apontam os pesquisadores.
No cenário em que o governo diminui em 10% os quadros de cada órgão, a despesa com a folha salarial diminuiria R$ 44,3 bilhões no acumulado de uma década, ou 0,7% do PIB de 2016. Em caso de aprovação da reforma da Previdência, essa economia seria ligeiramente menor, de R$ 42,8 bilhões, porque menos pessoas se aposentariam ao longo desses anos, permanecendo mais tempo na folha de ativos.
Os pesquisadores do Ipea projetaram o efeito de cortes mais drásticos no quadro de pessoal, que naturalmente levariam a gastos ainda mais baixos. Uma redução de 40%, por exemplo, diminuiria a despesa com salários em R$ 104,3 bilhões ao longo de uma década no cenário sem reforma da Previdência, ou em R$ 83,8 bilhões com reforma.
Em outro cenário, os autores simularam o que ocorreria se o governo preenchesse todas as vagas abertas por aposentadorias (a chamada reposição 1:1), mas limitando o salário inicial dos futuros concursados a R$ 5 mil e, para os cargos não afetados por essa medida, reduzindo proporcionalmente os salários de entrada.
Conforme o estudo, a imposição do teto de R$ 5 mil, combinada a uma redução de 10% na remuneração inicial, proporcionaria uma economia de R$ 35,2 bilhões em dez anos, ou 0,6% do PIB. Na hipótese de aprovação da reforma da Previdência, o impacto seria menor, de R$ 26,9 bilhões. Uma queda muito mais forte no salário inicial, de 40%, elevaria o valor poupado para R$ 54,3 bilhões (sem reforma) ou R$ 40,9 bilhões (com reforma).
A tarefa de pôr um freio às contratações não será simples, admitem os autores. “Apesar de as admissões recentes terem introduzido um grupo jovem no serviço público, não se pode concluir que os pedidos de concursos deverão ser muito menores de agora em diante, dado que parte dessas contratações visaram preencher os quadros das novas universidades e dos institutos federais de educação”, afirmam, no estudo.
Outro problema, segundo eles, é a política que elevou as remunerações iniciais e reduziu a amplitude salarial – ou seja, a diferença entre o piso e o topo de remuneração das diferentes carreiras. Essa política tornará a reposição mais onerosa.