Apesar da discrição em grande parte da campanha eleitoral, a nova primeira-dama do Brasil, Michelle Bolsonaro, deve ter uma atuação mais ativa no governo. Ela já afirmou que pretende participar de “todos os projetos sociais possíveis” durante o mandato de seu marido, o presidente Jair Bolsonaro (PSL), e chamou atenção no fim do ano ao usar uma camiseta com a frase “se começar nesse tom comigo, a gente vai ter problema”, bronca dada pela juíza Gabriela Hardt ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante depoimento sobre o sítio de Atibaia (SP).
Se Michelle vier mesmo a assumir certo protagonismo no novo governo, teremos o resgate de uma tradição interrompida neste século. No Brasil, a primeira-dama tem uma função protocolar. Ela é não obrigada por lei a se envolver em funções públicas, mas, tradicionalmente, ocupa posições ligadas a causas sociais. A tradição começou com Darci Varga, mulher de Getúlio Vargas, e seguiu até Ruth Cardoso, esposa de Fernando Henrique Cardoso (FHC), reconhecida academicamente e pela defesa de políticas sociais.
Marisa Letícia e Marcela Temer: primeiras-damas não atuantes
A sequência acabou sendo quebrada por Marisa Letícia, esposa do ex-presidente Lula, que não ocupou nenhuma função social durante os dois mandatos do marido. Ela também pouco se envolveu com política na época em que Lula ainda exercia o mandato.
A ex-primeira-dama Marcela Temer, esposa de Michel Temer, chegou a ser nomeada embaixadora voluntária do Programa Criança Feliz, voltado para o desenvolvimento integral da primeira infância, mas pouco apareceu durante os dois anos de governo do emedebista.
Michelle: o interesse por projetos sociais
Já Michelle Bolsonaro, em sua primeira entrevista coletiva após a eleição de seu marido, deixou bem claro que quer retomar a tradição. “(Quero participar de) todos os projetos sociais possíveis, até porque era algo que eu já fazia antes de me casar com o Jair. Eu tenho um chamado para ação social. É algo que Deus colocou na minha vida, no meu coração”, afirmou Michelle no fim de novembro. Ela também explicou que, dentre as suas prioridades, estarão projetos voltados para “comunidade surda, pessoas com deficiência e portadores de síndromes”.
Antes mesmo de virar primeira-dama, Michelle já atuava com projetos ligados à comunidade surda. Ela é uma defensora dos direitos do surdos e sabe se comunicar em Libras, a linguagem de sinais usada pelos deficientes auditivos. Apesar disso, não se apresenta como intérprete de Libras.
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Ela participa há alguns anos de projetos de educação de surdos e mudos e, atualmente, desenvolve a atividade na Igreja Batista da Atitude, na Barra da Tijuca, zona Oeste do Rio de Janeiro, que frequenta há cerca de dois anos. Ela também fez Bolsonaro assinar, ainda durante a campanha, um termo de compromisso com a comunidade surda em defesa dos direitos de todas as pessoas que apresentam algum tipo de deficiência auditiva.
Em entrevista a um canal no YouTube voltado para a comunidade surda, Michelle contou como despertou o seu interesse pela causa. Ela disse que tem um tio surdo e que esse tio lhe ensinou o alfabeto em libras. Mas que foi ao conhecer um casal de surdos na antiga igreja que frequentava no Rio de Janeiro, a Assembleia de Deus Vitória em Cristo, que descobriu o amor pela língua brasileira de sinais. “Quero que todas as pessoas aprendam libras para interagir com as pessoas surdas”, disse Michelle.
Vivência na política
A nova primeira-dama, diferente das duas últimas (Maria Letícia e Marcela Temer), também já teve vivência política. Ela foi secretária parlamentar na Câmara dos Deputados, em Brasília, de 2006 a 2008. Ela trabalhou com os, na época, deputados federais Vanderlei Assis (PP-SP) e Dr. Ubiali (PSB-SP) e na liderança do PP.
Foi lá Câmara que ela conheceu e começou a namorar com Jair Bolsonaro. Depois, já junto de seu futuro marido, passou a trabalhar com ele no gabinete parlamentar, também como secretária. A contratação se deu em 18 de setembro de 2007. Dois meses depois, casou-se no papel com Bolsonaro. Em novembro de 2008, foi exonerada, já que o Supremo Tribunal Federal baixou uma súmula proibindo a prática de nepotismo na administração pública, vedando a contratação de parentes até terceiro grau, conforme prevê a Constituição Federal.
Depois da exoneração, ela não ocupou mais cargos ligados à política.
Blindagem durante a campanha
Durante o ano passado, entre os períodos de pré e de campanha eleitoral, Michelle pouco apareceu ou falou. Além de ela ser realmente uma pessoa discreta, foi uma espécie de blindagem, ideia do próprio Bolsonaro e de seus três filhos mais velhos, todos políticos, fruto de seu primeiro casamento. A estratégia era preservar Michelle de ataques e exposição da vida pessoal. Deu certo.
Michelle só apareceu na reta final do segundo turno para rebater críticas feitas a seu marido e para relatar o seu envolvimento com causas sociais, em especial com a comunidade surda. Bolsonaro por pouquíssimas vezes apareceu ao lado da mulher ou falou dela.
As poucas declarações foram para explicar como se conheceram, por que ela trabalhou em seu gabinete e para falar sobre seu sogro, a quem chama de “Paulo Negrão”.
Michelle começa a aparecer mais
Já depois da eleição, Michelle começou a aparecer mais. Ela deu algumas entrevistas a canais de televisão e concedeu a sua primeira entrevista coletiva em Brasília, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), onde estava instalado o governo de transição. Na ocasião, destacou o desejo de participar de projetos sociais no governo Bolsonaro.
Também visitou as residências oficiais do presidente da República para decidir onde morar com Bolsonaro e suas duas filhas (uma do casamento com Bolsonaro, a Laura, e a outra adolescente, de outro relacionamento). Eles ficarão instalados no Palácio Alvorada, a residência oficial e principal. A Granja do Torto será usada como casa de veraneio.
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Mas, o dia em que mais chamou a atenção, foi na última semana de dezembro, ao aparecer com uma camiseta provocativa ao ex-presidente. Ela foi fotografada deixando a lha de Marambaia (RJ), onde passou o Natal com Bolsonaro e família, com a camiseta com a inscrição “se começar nesse tom comigo, a gente vai ter problema”.
A frase ficou famosa por ter sido dita por Gabriela Hardt, juíza temporariamente substituta de Sergio Moro nos casos da Lava Jato em Curitiba. A juíza falou isso ao ex-presidente Lula, após ele, durante o interrogatório sobre o sítio do Atibaia, dizer que a Justiça é quem deveria responder se ele é ou não dono do imóvel. Lula está preso desde abril do ano passado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP). O petista ainda responde a outros processos no âmbito da Lava Jato, incluindo o do sítio.
Michelle também teve seu nome evidência no fim do ano passado no caso do Coaf. Seu nome apareceu como tendo recebido R$ 24 mil, através de um cheque, de Carlos Queiroz, ex-assessor parlamentar de Flavio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente eleito, ex-deputado do Rio e agora senador. Queiroz é investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro após o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) identificar movimentações atípicas de Queiroz e de diversos outros assessores de parlamentares da Assembleia do Rio.
Jair Bolsonaro confirmou o pagamento, mas disse se tratar de um empréstimo feito pela família a Queiroz.
Biografia
Michelle de Paula Firmo Reinaldo é natural de Ceilândia, cidade satélite de Brasília. Nasceu em 22 de março. Tem duas filhas, a Laura, de oito anos, e a Letícia, de 16. É evangélica e por muitos anos frequentou a igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, de Silas Malafaia, que celebrou seu casamento religioso com Bolsonaro em 2013.
Foi assessora parlamentar e, antes, chegou a se inscrever no curso de Farmácia, mas nunca cursou. Faz parte do Ministério de Surdos e Mudos da Igreja Batista Atitude e sempre militou em favor da causa das pessoas com surdez. É torcedora do Flamengo.
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