| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

O projeto de lei que muda as regras de aposentadoria dos militares e reestrutura a carreira mostrou que as Forças Armadas venceram a queda de braço com a equipe econômica, colocando em risco toda a reforma da Previdência. O Ministério da Economia esperava obter uma economia de quase R$ 100 bilhões com a reforma da Previdência dos militares, mas teve de ceder e aceitar como moeda de troca uma reestruturação da carreira que vai custar bilhões aos cofres públicos ao criar e aumentar gratificações.

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Com isso, o saldo líquido para o Tesouro será de uma economia de apenas 10% do foi projetado em dez anos com todas as mudanças nas regras dos militares, bem menor do que o almejado. Parlamentares criticaram nesta quarta-feira (20) a redução de ganho e a reestruturação da carreira, que pode abrir margem para que outras categorias exijam o mesmo na tramitação da reforma.

OPINIÃO: Reforma de militares tem economia pífia e é difícil de justificar

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Entenda a queda de braço

A disputa em torno da economia que seria gerada com as mudanças no regime previdenciário dos militares começou em fevereiro e se intensificou neste mês. Inicialmente, o plano da equipe econômica era apresentar somente um projeto para reformar a aposentadoria dos militares – e que valerá também para policiais militares e Bombeiros.

As projeções previam uma economia de R$ 92,3 bilhões ao longo de dez anos com as novas regras. Só que os militares exigiram uma contrapartida: aumento de soldo (salário-base), que estaria defasado. Isso foi rapidamente descartado, devido ao alto custo.

Então, integrantes das Forças Armadas exigiram uma reestruturação da carreira, com novas gratificações e elevação das existentes em compensação às perdas pela falta de reajuste salarial. Isso foi aceito pelo governo. Foi a única categoria que teve poder de barganha para exigir uma moeda de troca ao governo. 

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A reestruturação da carreira custará aos cofres públicos R$ 86,85 bilhões ao longo de dez anos. Já as mudanças nas regras de aposentadoria dos militares renderão R$ 97,3 bilhões em até dez anos. Com isso, o saldo líquido da economia gerada aos cofres públicos será de R$ 10,45 bilhões em dez anos, bem inferior ao idealizado pela equipe econômica.

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Equipe econômica nega derrota 

O secretário especial adjunto da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, negou que a reestruturação da carreira seja uma desidratação da proposta da nova Previdência. “Nós cumprimos o combinado. Todos os ajustes no sistema de proteção social dos militares serão feitos e são maiores do que nós propusemos”, afirmou, em coletiva de imprensa nesta quarta. 

Bianco fez questão de dizer que a economia gerada com as regras de aposentadoria dos militares ficou até um pouco maior do que o previsto – R$ 97,3 bilhões, contra R$ 92,3 bilhões calculado inicialmente. Ele minimizou a perda gerada pela reestruturação, que consome quase todo o ganho da mudança nas regras de aposentadoria.

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“O projeto de lei [dos militares enviado ao Congresso] é um só, mas trata de coisas diferentes. Por questão de transparência estamos tratando em conjunto e mesmo assim ele é superavitário.” 

Rogério Marinho, secretário especial de Previdência e Trabalho, ressaltou que as Forças Armadas são uma categoria especial e, por isso, têm um tratamento diferente. E que a reestruturação da carreira é um reconhecimento para uma categoria que tem perdas salariais há anos. 

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Negociações longas e tensas 

A contrapartida exigida pelas Forças Armadas travou o projeto dos militares. O grande dilema da equipe econômica foi equilibrar os custos que seriam gerados pela reestruturação da carreira com algum ganho para o Tesouro com as mudanças das regras de aposentadoria. As discussões se estenderam até esta quarta-feira e não acabaram nem mesmo quando o projeto foi apresentado ao Congresso. 

Na segunda-feira (18), o secretário Especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, quem está cuidando das negociações da Previdência por parte da equipe econômica, se reuniu por mais de duas horas com integrantes da cúpula das Forças Armadas para aparar as arestas do projeto que seria apresentado na quarta ao presidente Jair Bolsonaro. Ao final, ao conversar com jornalistas, se esquivou de dizer qual seria economia gerada aos cofres públicos. Se limitou a dizer que seria positiva e quem daria a palavra final seria o presidente. 

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Na terça-feira (19), na condição de presidente interino, o general Hamilton Mourão chegou a afirmar a jornalistas que a economia líquida (mudanças na aposentadoria menos gastos com a reestruturação da carreira) seria de R$ 13 bilhões. Foi a primeira sinalização concreta de um integrante do governo de que o ganho fiscal esperado seria menor do que o esperado devido à reestruturação. No final, o ganho foi ainda menor do que o projeto por Mourão.

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Nesta quarta-feira (20), ao chegar de viagem dos Estados Unidos, Bolsonaro recebeu o secretário Marinho e integrantes militares do governo, como o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. A reunião aconteceu no Palácio do Alvorada e durou mais de três horas. Somente nessa reunião foi batido o martelo sobre o projeto, no prazo limite que o próprio governo tinha estabelecido para apresentar a proposta ao Congresso. 

Logo após o envio do projeto à Câmara, na tarde desta quarta, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), se reuniu com o ministro da Economia, Paulo Guedes. O assunto da reunião não foi divulgado pelas assessorias de imprensa, mas tratou-se de um encontro de última hora, fora da agenda oficial. 

Disputa dos militares será agora no Congresso 

Se venceram fácil a disputa com a equipe econômica, os militares não devem encontrar a mesma facilidade no Congresso. Os parlamentares já tinham estabelecido que a reforma da Previdência dos civis só iria tramitar após a chegada do projeto dos militares. Foi um recado ao governo de que todas as categorias terão de dar sua contribuição. 

O próprio presidente da Câmara, antes da reunião com o Guedes nesta quarta, deu declarações contra privilégios aos militares. Ele criticou na terça-feira a manutenção da integralidade (receber o último salário quando aposentador) e paridade (ter o mesmo reajuste da ativa). Esses benefícios já foram extintos para novos servidores públicos. Apesar disso, continuarão a valer para os militares, mesmo com a reforma.

Nesta quarta, na presença de Bolsonaro, Maia adotou um tom mais brando, mas fez questão de dizer que um civil vai relatar a proposta na Câmara, que pode ser modificada pelos parlamentares ao longo da tramitação.

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O deputado Delegado Waldir (PSL-GO), líder do PSL na Câmara dos Deputados, partido do próprio presidente Bolsonaro, disse que aguarda conhecer em detalhes o texto, mas afirma que a reestruturação dos militares não era esperada e que ela pode abrir brechas para que outras categorias exijam o mesmo, comprometendo a reforma. 

“Estamos analisando a questão da igualdade em relação à Nova Previdência [reforma dos civis]. Existe uma questão que precisa ser discutida que é em relação à redução de gastos com a proposta. Eu penso que a redução não é a ideal. E tem a reestruturação da carreira que não estava prevista, e isso pode trazer uma enxurrada de outras instituições querendo também reestruturação”, afirmou o deputado. 

O líder do DEM na Câmara, deputado Elmar Nascimento (BA), afirmou que é preciso dar o mesmo tratamento a civis e militares “sob pena de contaminar o ambiente [de votação]”. “Fico preocupado quando se fala em reestruturação de carreira, será que era o momento adequado para se tratar disso”, indagou.

Frente antirreforma diz ter apoio de um terço do Congresso

Parlamentares de oposição lançaram nesta quarta uma frente parlamentar mista contra a reforma da Previdência. Os organizadores dizem que 171 deputados (33% do total) e 27 senadores (também 33%) assinaram a lista para a implantação da frente.

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O documento não foi apresentado, mas nomes foram citados, como os dos deputados Jandira Feghali (PC do B-RJ), Alessandro Molon (PSB-RJ) e Fernanda Melchionna (PSOL-RS) e dos senadores Rogerio Carvalho (PT-SE), Jaques Wagner (PT-BA), Paulo Rocha (PT-PA) e Zenaide Maia (PROS-RN). Para aprovar a reforma, é necessário o apoio de dois terços dos congressistas, em duas votações na Câmara e no Senado.

Além disso, 92 entidades, entre sindicatos, federações, confederações e centrais que representam os servidores públicos, participam da mobilização da frente, que acusa o governo de querer desmontar o atual sistema previdenciário.