O Ministério Público (MP) de Goiás decidiu ingressar na Justiça estadual com um pedido de busca e apreensão de uma tornozeleira eletrônica. Trata-se do equipamento que a Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária de Goiás emprestou ao Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, para que o ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) pudesse deixar a carceragem da Polícia Federal, em Brasília, e cumprir prisão domiciliar, monitorada por meio do uso da tornozeleira. O MP alega que hoje faltam equipamentos para atender aos sentenciados goianos que poderiam ser beneficiados com penas alternativas à prisão.
O promotor de Justiça Fernando Krebs decidiu recorrer à Justiça após ouvir o depoimento do superintendente de administração penitenciária, coronel Victor Dragalzew Júnior, na tarde desta terça-feira (11), no inquérito civil que apura suspeita de irregularidade no fornecimento da tornozeleira eletrônica ao ex-deputado federal.
Autor de ao menos duas ações judiciais anteriores que questionam a falta de tornozeleiras eletrônicas no estado, o Ministério Público goiano acusa o governo estadual de ter favorecido Rocha Loures. “Se é público e notório que faltam tornozeleiras para os presos de Goiás, o Estado não pode se dar ao luxo de emprestar um aparelho destes para outro ente [federativo], mesmo que seja o Depen. Isso é um desvio de finalidade”, disse o promotor.
Krebs disse que o MP está acompanhando a questão das tornozeleiras eletrônicas em Goiás há algum tempo. “A Secretaria de Segurança Pública afirma que não faltam tornozeleiras, mas nós temos ações na Justiça questionando isso. Logo, o empréstimo para um preso de outra unidade da federação, em um processo que nada tem a ver com o estado, é muito estranho”, disse o promotor, explicando que o inquérito civil apura também a hipótese de tráfico de influência em benefício de Loures.
Sem monitoramento
Ao longo da apuração, o MP apontou também a hipótese de Loures não estar sendo monitorado remotamente, pois o contrato entre o governo goiano e a empresa privada SpaceCom prevê o acompanhamento em tempo real apenas dos sentenciados em Goiás. A Secretaria de Segurança Pública do estado, no entanto, garante que Loures está sendo monitorado.
Em seu depoimento, o superintendente Victor Dragalzew Júnior disse que o contrato com a SpaceCom prevê o fornecimento de 1.855 tornozeleiras eletrônicas, sendo que, atualmente, cerca de 950 estariam em uso – 300 das quais pagas com recursos federais repassados pelo Depen. No termo de depoimento a que a reportagem teve acesso, consta que o superintendente não soube informar se há uma lista de presos goianos à espera de receber uma tornozeleira.
O superintendente também reafirmou que a tornozeleira usada por Loures foi emprestada após um pedido feito pela direção do Depen por telefone – solicitação que, segundo Júnior, ainda não foi oficializada por meio do envio de um ofício. O superintendente também declarou ter conhecimento de que Loures está sendo monitorado e que a Secretaria de Segurança Pública pode fornecer ao MP um relatório de monitoramento de cada um dos sentenciados a usar tornozeleira eletrônica.
Operação Patmos
Ex-deputado e ex-assessor especial do presidente Michel Temer, Loures foi preso preventivamente em Brasília, no dia 3 de junho. Ele foi filmado pela PF recebendo uma mala com R$ 500 mil enquanto era investigado pela Operação Patmos, deflagrada em maio deste ano, para apurar informações fornecidas por executivos da JBS, incluindo um dos donos da empresa, Joesley Batista.
Em 30 de junho, o ministro-relator das ações da Lava Jato do Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, mandou a PF soltar o ex-deputado. Em troca de responder às acusações em liberdade, Loures deverá cumprir algumas medidas cautelares, como recolhimento domiciliar e o uso de tornozeleira eletrônica.
Antes de cumprir a sentença, a PF informou que não dispunha de tornozeleiras eletrônicas, nem dos meios necessários para monitorar um sentenciado. O Depen então solicitou ao governo de Goiás que emprestasse uma tornozeleira para que a determinação judicial pudesse ser cumprida e Loures solto.
Outro lado
Procurado, o Ministério da Justiça, ao qual estão subordinados o Depen e a PF, informou que a questão do monitoramento deveria ser averiguada com o governo goiano. A Superintendência Executiva de Administração Penitenciária assegurou que forneceu o aparelho a pedido do Depen e da Polícia Federal e que, como financia grande parte dos aparelhos em uso em Goiás, o Depen tem “o direito de requisitar reciprocidade”, como, por exemplo, o empréstimo do equipamento.
“A Seap considera absolutamente absurdas e improcedentes as afirmações segundo as quais teria existido ingerência política neste processo, uma vez que a cessão do aparelho foi feita dentro do princípio da cooperação federativa”, ponderou a superintendência estadual, garantindo que Loures está sendo monitorado via satélite, sem nenhum prejuízo legal.
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