O governo federal abriu uma caixa de surpresas ao decidir enviar uma medida provisória (MP) para ajustar alguns pontos da reforma trabalhista. Ao lançar o debate sobre o assunto, os parlamentares bateram o recorde de emendas apresentadas (foram pelo menos 967 propostas), muitas tratando de temas que não estão abordados pela MP, como a tentativa de trazer de volta o imposto sindical obrigatório ou recuperar medidas de fortalecimento dos sindicatos.
Pelo menos duas dezenas de propostas pedem o retorno do pagamento, prazo de escalonamento para seu fim, ou obrigatoriedade de que o sindicato assista o pedido de rescisão de contratos e tenham papel fundamental na assinatura de acordos coletivos. A perda de receitas pelos sindicatos com a mudança da lei, que acabou com a contribuição obrigatória, preocupa os sindicatos. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) iniciou um Programa de Demissão Incentivada (PDI) para enxugar em quase 60% sua folha de pagamento, justificada pelo fim da contribuição.
São propostas como a do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), que pede a manutenção da contribuição sindical obrigatória por mais oito anos, sendo reduzida em 25% a cada dois anos após a aprovação da lei. Mesmo após esse prazo, a contribuição sindical seria decidida anualmente em assembleia geral da categoria. Proposta similar foi apresentada pelo deputado Hildo Rocha (PMDB- MA), que pede que a contribuição deixe gradualmente de ser compulsória, em escalonamento de dois em dois anos e depois sendo decidida em assembleia.
Já o deputado Marco Maia (PT-RS) apresentou emenda para restaurar por completo o texto anterior à reforma trabalhista sobre a contribuição sindical, mantendo-a obrigatória. “O alcance de tão grande ataque às estruturas sindicais é incalculável. Tornar essa contribuição facultativa é um eufemismo para sua mera revogação. Nossa proposta é o de retomar o arcabouço jurídico que vigorou por décadas, até então estabilizado, e que permitiu o florescimento de uma estrutura sindical combativa que sustentou direitos e garantias dos trabalhadores por muitos anos”, justifica.
O governo promete, desde a aprovação da reforma, que não cederá às pressões sindicais para voltar a obrigatoriedade da contribuição sindical. Alas do DEM, PSDB e PMDB se opõem vigorosamente à medida que beneficia os sindicatos.
Revogação total da reforma e indenização de R$ 276 mil em caso de morte
A oposição promete dificultar o debate e o grande número de emendas apresentadas reflete isso. Entre as quase mil emendas, pelo menos uma centena tenta revogar a reforma trabalhista, em sua totalidade ou em partes, mas dificilmente devem passar pelo crivo do relator, que ainda não foi definido.
Essa foi a tentativa de diversos parlamentares do PT, como a senadora Gleisi Hoffmann (PR), que apresentou nove emendas. A primeira delas pede a total revogação da reforma trabalhista, trazendo à vigência as regras da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), de 1943, e suas alterações feitas na década de 1990.
Outra tentativa da oposição pede que o assunto seja levado a referendo popular. O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) sugere que todas as alterações feitas na reforma (268 apenas na lei e outras 22 pela MP) sejam colocadas em referendo a ser realizado em 90 dias.
Apesar dessas tentativas de derrubar por completo a reforma, mesmo entre os partidos da oposição a análise é de que o governo não permitirá essas tentativas e deve enterrar a maioria das emendas, via relator na comissão, que deve ser da base aliada.
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A liderança do governo tem uma lista de oito nomes que estavam sendo negociados, de dentro da base aliada, para relatar o projeto. Entre eles, o do deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), que foi o relator da reforma na Câmara. Marinho seria uma escolha natural e favorável ao governo: agradaria ao PSDB com o comando de uma reforma econômica importante, podendo trazer pontos positivos para a articulação com os tucanos para a reforma da Previdência, em um momento de ruptura do partido com o Palácio do Planalto.
Também é de um tucano algumas das emendas mais duras apresentadas à MP complementar à reforma trabalhista. O deputado Izalci Lucas (PSDB-DF) apresentou emenda para limitar o valor máximo em caso de morte de um trabalhador. Ele avalia que já é “bastante elevada” a indenização nos casos de dano gravíssimo, que é de até R$ 276.565,50 e pede que nos casos de morte seja fixada essa mesma indenização máxima. O mesmo deputado também defende a fixação das indenizações no valor do piso dos benefícios da Previdência Social e não no salário do trabalhador lesado.
Pontos principais da MP ainda merecem aprimoramento
A MP complementar à reforma trabalhista foi apresentada em acordo com os senadores, como uma forma de evitar que o texto aprovado no Senado tivesse de voltar à Câmara. O governo queria correr com a aprovação, em um momento político difícil para o presidente Michel Temer – que se preparava para enfrentar a votação sobre a segunda denúncia por formação de quadrilha e obstrução de justiça na Câmara. Mas mesmo senadores governistas queriam que alguns pontos fossem vetados pelo presidente e ajustados por lei ou regulamentação.
O texto da MP 808, apresentado assim que a reforma trabalhista entrou em vigor no começo de novembro, dava conta de oito grandes temas: trabalho insalubre de gestantes e lactantes; definição de jornada 12x36; trabalho intermitente; autônomos; dano extrapatrimonial; gorjetas; comissões de empregados; e remuneração previdenciária.
O deputado Miro Teixeira (REDE-RJ) avalia que o governo extrapolou ao enviar uma MP para alterar pontos que já foram debatidos, mas admite que é provável que o governo aceite debater apenas dois ou três assuntos durante a tramitação da MP, sem voltar aos temas centrais da reforma ou à contribuição sindical.
Os temas que padecem de ajuste mesmo na visão da base governista são a definição do dano extrapatrimonial e a fixação das indenizações nesses casos; o trabalho de gestantes e lactantes em local insalubre; e regramentos sobre o trabalho intermitente.
“Essa MP altera critérios básicos, como a incidência de multas no dano extrapatrimonial. Altera o conceito do que foi discutido e cria uma insegurança que não agrada e não favorece as boas relações do trabalho. Teria que ser como aprovamos antes, com base no salario do trabalhador”, afirmou. “Esses sempre tentam aplicar o rolo compressor. Quando falta argumento, usa-se a força. E eles não têm mais argumento. Estamos percebendo um fim de governo. O governo Temer acabou”, afirmou.
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