| Foto: MENAHEM KAHANA/AFP

A decisão de manter a embaixada brasileira em Tel Aviv e abrir um escritório oficial em Jerusalém parece ter desagradado a todas as alas que de alguma maneira se sentem afetadas pela questão.

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Logo após o anúncio feito pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), ao chegar em Israel, vieram as primeiras queixas e uma retaliação: a Palestina convocou seu embaixador. Os evangélicos também reclamaram, e o agronegócio teme que mudança atinja os negócios com países árabes.

Reunião de emergência

No início da tarde desta segunda-feira (1º), embaixadores de países árabes no Brasil fizeram um pedido formal de reunião com Bolsonaro e com o chanceler Ernesto Araújo assim que a comitiva brasileira voltar de Israel. O retorno está previsto para a noite da próxima quarta-feira (3).

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A informação foi confirmada ao portal UOL pelo embaixador palestino Ibrahim Alzebel. Ele é decano do conselho de embaixadores árabes e islâmicos no Brasil, que conta com representantes de 41 países. A reunião foi convocada em caráter emergencial, e está programada para acontecer na sede da Liga Árabe, que reúne 22 países - incluindo Arábia Saudita, Palestina e Jordânia.

ENTENDA:  Brasil anuncia escritório em Jerusalém e desiste de retirar embaixada de Tel Aviv

Em nota divulgada anteriormente, o Estado da Palestina informou que chamaria Alzebel de volta. A ideia era consultá-lo para saber quais medidas adotar. A autoridade informou que considera a decisão do governo de Bolsonaro uma “violação flagrante da legitimidade e das resoluções internacionais, uma agressão direta ao nosso povo e a seus direitos e uma resposta afirmativa para a pressão israelense-americana que mira reforçar a ocupação e a construção de assentamentos e na área ocupada em Jerusalém”.

O presidente foi questionado por jornalistas sobre como a decisão seria recebida pelos palestinos e se ela viola resoluções da ONU sobre Jerusalém. Bolsonaro se limitou a dizer: “É direito deles reclamar”.

Mudança de embaixada pode acontecer até 2022

Já a mudança da embaixada de Tel Aviv para Jerusalém, desejada por Bolsonaro, é uma questão ainda mais delicada. O mundo árabe considera que isso implicaria no reconhecimento da ocupação israelense de Jerusalém Oriental - cidade que os palestinos querem que seja sua capital.

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O escritório comercial seria um indício de recuo nesse objetivo, mas nesta segunda-feira (1º), porém, Bolsonaro deu a entender que não desistiu da mudança, e deixou no ar a possibilidade de realiza-la até 2022.

“Tem o compromisso [de mudar a embaixada], mas meu mandato vai até 2022, ok? Está explicado?”, disse a jornalistas. “E a gente tem que fazer as coisas com calma, sem problema, mantendo contato com o público de outras nações.”

Militares e ruralistas pressionam

Em novembro do ano passado, militares próximos a Bolsonaro já o haviam orientado a desistir da ideia de transferência da embaixada, pois a mudança geraria atrito nas relações diplomáticas e comerciais com nações árabes e poderia incentivar retaliações de radicais islâmicos.

O agronegócio também teme reações adversas por parte de países árabes, um importante mercado consumidor. Números do Ministério da Economia revelam que as vendas para os países do Oriente Médio ao longo de 2018 somaram R$ US$ 9,78 bilhões, variação negativa de 16,22% em relação ao registrado em 2017. Nos dois primeiros meses deste ano, chegaram a US$ 1,75 bilhão: alta de 7,99% na comparação com o mesmo período de 2018.

Segundo números da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, as exportações de carnes de frango e bovina halal (com abate realizado conformidade com a Lei Islâmica) para países árabes cresceram 418% nos últimos 15 anos, saltando de US$ 706 milhões registrados em 2003 para US$ 3,65 bilhões em 2017.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]

O presidente da associação, Rubens Hannun, informou em entrevista à Folha de S.Paulo que, por meio de cartas e movimentações diplomáticas, países árabes têm demonstrado preocupação com a possibilidade de mudança da embaixada.

A pressão também veio de grandes empresas. Em novembro do ano passado, Pedro Parente, CEO da BRF, maior fornecedor de frango para países árabes no Conselho de Cooperação do Golfo, manifestou preocupação quanto ao fluxo de exportações - o Brasil é hoje o maior exportador de carne halal do mundo, com um mercado consumidor que reúne 1,8 bilhão de consumidores muçulmanos.

Presidente da União das Câmaras Árabes e ex-ministro do Abastecimento e Comércio do Egito, Khaled Hanafi declarou em janeiro que se a embaixada brasileira em Israel for transferida haverá boicotes a todos os produtos do país por consumidores árabes, e que até os empregos brasileiros estão em risco. A afirmação foi feita em visita ao Brasil, durante reunião com o vice-presidente Hamilton Mourão e a ministra da Agricultura, Teresa Cristina.

Para ala evangélica, escritório é “carne de segunda”

O anúncio da abertura de um escritório comercial em Jerusalém desagradou também a ala evangélica. Eles queriam a concretização da “promessa de campanha” de transferência da embaixada. Irritado, um dos representantes da bancada comparou a iniciativa a uma decepção culinária: algo como esperar um filé mignon e receber uma carne de segunda.

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O deputado e pastor Marco Feliciano (Pode-SP) fez uma provocação ainda no domingo: “Respeito a abertura do escritório, porém o segmento evangélico, um terço do eleitorado brasileiro, que deu uma vantagem de 11 milhões de votos ao presidente Jair Bolsonaro, garantindo sua eleição, confia que ele cumprirá sua palavra e em breve mudará a embaixada brasileira para Jerusalém”.

 

Outros evangélicos utilizaram as redes sociais para registrar insatisfação com o que classificaram de “esmola” diante da promessa de Bolsonaro de transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém.

Ligado ao pastor Silas Malafaia, o deputado federal Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), também reclamou: “O compromisso com o povo evangélico e judeu é outro. Confio que o presidente tem uma só palavra! Aguardamos a transferência”, pressionou.

“Estelionato eleitoral”

Fiéis engrossaram o tom de parlamentares e lideranças evangélicas e cobraram Bolsonaro pelas redes sociais. Em mensagens como “queremos mais, cumpra o que prometeu”, eleitores chegaram a chamar o presidente de covarde. Outros evangélicos pediram calma: dizem que “o tempo é de Deus” e já, já Bolsonaro cumpre a palavra.

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O próprio Malafaia buscou contemporizar, dizendo que o americano Donald Trump levou nove meses para fazer a mudança de embaixada. “Em que lugar Bolsonaro falou que iria transferir a embaixada por ocasião de sua visita a Israel? Nenhum. O processo está apenas começando. Bolsonaro disse para mim que a mudança seria paulatina”, afirmou o pastor.

Na semana passada, quando deputados evangélicos escolheram o novo líder de sua bancada, dois deles disseram que seria uma decepção se o presidente empurrasse com a barriga a prometida transferência e se mostravam confiantes que o anúncio ocorreria na viagem. Admitiram que o escritório em Jerusalém os deixou frustrados, mas não quiserem bater de frente com Bolsonaro publicamente, então pediram que seus nomes fossem omitidos.

Por que Jerusalém é tão importante para o meio evangélico?

Destino de forte turismo evangélico, Jerusalém virou o que virou para seguidores dessa fé por causa de uma profecia religiosa.

Evangélicos argumentam que Jesus -judeu, como seus apóstolos- teria vindo à Terra para redimir a nação eleita por Deus. Veem, portanto, seguidores da Torá como herdeiros de direito da cidade hoje repartida entre um lado ocidental e outro oriental (com mais palestinos). E é nesta “nação escolhida” que, sob a perspectiva das Escrituras, o Armagedom acontecerá.

Narra o livro de Gênesis: “E apareceu o Senhor a Abraão, e disse: à tua descendência darei esta terra”. Terra que, segundo a Bíblia, exercerá papel crucial na epopeia da humanidade.

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“As profecias de Apocalipse, Daniel e outros textos bíblicos apontam para a segunda vinda de Cristo após a reconstrução do Templo de Salomão em Jerusalém”, afirma o teólogo Marcelo Rebello.