O presidente Michel Temer (PMDB) é um político de hábitos discretos. Entre eles, um é recorrente: encontros secretos, de preferência na calada da noite. Não são poucas as reuniões de Temer fora da agenda oficial da presidência que acabam reveladas. O mais famoso foi o encontro com Joesley Batista, um dos donos da JBS, no dia 7 de março no Palácio Jaburu. A conversa ocorrida no fim da noite daquele dia não foi divulgada na agenda oficial do presidente. Nesse caso, o que abalou a República foi o teor do diálogo. “Tem que manter isso, viu”, disse Temer ao empresário, na frase mais repercutida do papo.
Em seu segundo pronunciamento após as revelações da JBS, Temer assumiu que tem esse costume de ouvir qualquer pessoa, em qualquer horário. “E confesso que eu ouvi à noite [em referência ao encontro com Joesley Batista],como ouço muitos empresários, políticos, trabalhadores, intelectuais e pessoas de diversos setores da sociedade brasileira. No Palácio do Planalto, no Jaburu, no Alvorada e em São Paulo”, disse.
Como o próprio presidente assume esse hábito, o Palácio do Planalto geralmente tem por costume confirmar encontros fora da agenda eventualmente flagrados pela imprensa – mesmo o delatado por Joesley Batista foi confirmado. A última reunião foi com Raquel Dodge, que vai assumir a procuradoria-geral da República (PGR) e por consequência, da Lava Jato, depois das 22h da terça-feira (8), no Palácio do Jaburu.
Raquel afirmou à Folha de S. Paulo que o encontro com Temer tinha pauta definida: discutir a agenda de sua posse no cargo, em setembro. “O presidente indagava sobre a data e horário possível para a minha posse, pois precisava viajar para os Estados Unidos no dia 18 de setembro, segunda, para fazer a abertura da Assembleia Geral da ONU no dia 19. O mandato do PGR termina no dia 17, domingo”, disse Dodge. “Por esta razão, a posse será de manhã, em vez do final da tarde”, afirmou.
Dodge esteve no Palácio do Jaburu por volta das 22h de terça, segundo imagens registradas por um cinegrafista da TV Globo. O encontro não constava da agenda oficial de Temer. O Palácio do Planalto confirmou a informação de Dodge sobre o motivo da conversa. Curiosamente, na terça-feira a defesa do presidente entrou com pedido no Supremo Tribunal Federal (STF) de suspeição de Rodrigo Janot, o atual PGR, nas investigações contra Temer - a alegação é de que ele atua para perseguir pessoalmente o presidente.
Encontros recorrentes
A reunião com Raquel Dodge não foi a única “fora da agenda” de Temer nesta semana. No domingo (6), o presidente recebeu o ministro do STF Gilmar Mendes para um jantar. O tema do encontro, segundo Mendes, teria sido sobre como aperfeiçoar o sistema presidencialista. O ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, também esteve no jantar.
Mendes, aliás, é um costumeiro interlocutor do presidente nesses encontros secretos. Em junho, o ministro do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) recebeu Temer em sua casa - acompanhado de Moreira Franco e do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha. A reunião, que não estava na agenda oficial de ninguém, ocorreu na véspera da escolha de Raquel Dodge para a PGR e da sessão do STF que avaliou a validade da delação da JBS.
A informação do encontro foi divulgada pelo blog da Andréia Sadi, no dia 28 de junho. De acordo com a jornalista, a sucessão de Rodrigo Janot foi tema do encontro. O Planalto não comentou se o tema foi discutido, mas emitiu nota para explicar a razão do encontro: Temer teria marcado um jantar com Mendes para discutir a reforma política e, ao saberem do encontro, seus ministros resolveram participar.
Fora da agenda, em qualquer lugar
Antes de serem “inimigos públicos”, Temer e Janot também mantiveram encontros fora da agenda. A coluna Painel, da Folha, revelou em 29 de maio, que o Palácio do Planalto encaminhou à PGR um documento que afirmava que Temer e Janot tiveram seis reuniões entre 2015 e maio de 2017 – e um encontro não-oficial, em março de 2015, no Palácio do Jaburu. Nessa ocasião, Janot teria informado ao então vice-presidente sobre o pedido de inquérito contra Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Renan Calheiros (PMDB-AL), então presidentes da Câmara e Senado.
Em junho de 2016, Temer teria tido um encontro secreto com Eduardo Cunha, que já estava afastado da presidência da Câmara. O encontro foi confirmado pelo Planalto e negado pelo deputado. O encontro teria ocorrido em um domingo à noite, no Jaburu, quando Cunha já era acusado de tentar interferir na Lava Jato. O Planalto apenas disse que a intenção da reunião era de avaliar o atual cenário político.
Ainda em 2016, mas em abril, o Estadão noticiou que Temer teria se encontrado com o presidente do PP, Ciro Nogueira, em São Paulo. O encontro teria sido intermediado por um amigo em comum. Nogueira negou.
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