“Privatizar” deixou de ser verbo proibido em Brasília e o próximo foco serão os serviços municipais básicos, como água e esgoto, mobilidade, resíduos sólidos e iluminação pública. O governo federal vai lançar iniciativa de apoio às concessões e parcerias privadas nos municípios brasileiros, que contará com um fundo de R$ 100 milhões para dois anos. Nas contas do Ministério do Planejamento, o setor privado deve investir cerca de R$ 2 bilhões a partir desses projetos, contando em receber, em troca, a tarifa que você para em sua conta de água e luz.
A indústria da construção espera ainda que o governo libere cerca de R$ 5 bilhões para financiar as concessões, por uma linha de crédito com recursos do FGTS, concedidos pelo Banco do Brasil e pela Caixa, conforme informou o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), João Carlos Martins. Segundo o executivo, os serviços que serão privatizados ou concedidos geram uma receita fixa (paga pela população na conta de água e luz, por exemplo) que poderá ser oferecida como garantia do financiamento, o que reduz as taxas de juros e ajuda a atrair mais interessados em assumir os serviços.
A formatação do projeto é bem diferente do que se adotou nos governos Lula e Dilma Rousseff, quando o governo injetava recursos nas empresas públicas, muitas delas atoladas em dívidas e com suas gestões marcadas por decisões políticas.
“Ninguém tem dúvida de que o dinheiro acabou no setor público. Mas a vida das pessoas continua. A gente demanda serviço público. Não vejo outra forma de resolver se não pelas diversas formas de parceria entre setor público e privado, para que o investimento e a responsabilidade do investimento sejam do setor privado. O setor público não tem capacidade de tomar dinheiro. Não adianta você fazer um PAC e mandar a companhia pública de água e luz pegar dinheiro”, afirmou João Carlos Martins, presidente da CBIC.
A privatização não deve afetar diretamente as tarifas que os consumidores pagam pelos serviços (que são fixadas por lei e reguladas pelos órgãos competentes) e passarão a ser direcionadas para a empresa que vencer o leilão de concessão. Porém, melhorias que forem realizadas poderão ser incluídas nas tarifas, como já ocorre com as empresas distribuidoras de energia elétrica. Na avaliação dos empreendedores, a privatização traz benefícios ao consumidor, que saberá de quem cobrar qualidade pelos serviços.
Para João Carlos Martins, a contratação por meio de concessão e não licitação também traz maior transparência ao processo. Outro efeito positivo é a continuidade do atendimento enquanto a concessão existir, evitando a interrupção de obras com mudanças políticas, com a troca do prefeito, por exemplo.
O potencial de recursos que podem ser alcançado com esse modelo de privatização de serviços com receita fixa é muito grande. Para se ter uma ideia, segundo a FNP, a receita da Contribuição para Custeio dos Serviços de Iluminação Pública (COSIP) em 2015 foi de R$ 32 por habitante. Ou seja, algo em torno de R$ 6,5 bilhões no ano. Isso sem contar as receitas de outros serviços públicos abarcados pela iniciativa.
Prefeituras querem mais recursos para privatizar mais
Os R$ 100 milhões alocados em fundo para auxiliar na licitação é montante considerado pequeno pela FNP, mas poderá ajudar a reduzir a carência desses serviços em muitos municípios. Dados da entidade apontam que os investimentos anuais das prefeituras alcançam algo em torno de R$ 50 bilhões ao ano em todo o pais, considerando todas as rubricas (inclusive aquisições de móveis e imóveis, por exemplo). Os municípios deverão arcar com 30% dos estudos e o restante será coberto pelo fundo. Quando a licitação for concluída, a empresa vencedora ressarce o valor integral dos estudos.
O pacote de incentivos também contará com medidas de desburocratização. A CBIC, que encabeça o núcleo empresarial da iniciativa, contribuiu com a formatação de minutas-padrão de documentos – como editais, contratos e minutas de legislação municipal -, entregues em 01/06. Agora esse material deverá entrar em consulta pública conduzida pelo Ministério do Planejamento, por sessenta dias.
A expectativa dos prefeitos em acessar as linhas de crédito e modelos documentais é grande. Gilberto Perre, secretário-executivo da FNP, afirmou que as prefeituras já contam com a liberação dos R$ 5 bilhões em crédito e consideram o montante pequeno para a necessidade dos municípios. Será uma “ajuda”, mas não algo que vai “revolucionar” o setor, avalia Perre. Ele também afirma que é preciso atacar as diversas dificuldades encontradas pelos prefeitos, que não serão resolvidos “em um passe de mágica”.
Porto Alegre já iniciou processo de parceria na iluminação
A prefeitura de Porto Alegre iniciou processo, conduzido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para ter sua iluminação pública administrada por parceiro privado. O banco prestará assessoria no planejamento e na contratação de consultores, na realização de estudos para modelagem da parceria, roadshow, audiência pública, consulta pública, atendimento a órgãos de controle até a realização dos leilões para contratação do parceiro privado.
De acordo com a CBIC, os equipamentos de iluminação serão trocados pelo parceiro privado, substituindo por outros “com menor impacto ambiental e tecnologias para a redução no consumo de energia elétrica”. A cidade tem 80 mil pontos de iluminação pública e potencial de investimentos de R$ 250 milhões na modernização.
Deixe sua opinião