A Polícia Federal (PF) investiga a atuação de uma suposta organização criminosa que estaria desviando recursos previdenciários do Postalis, o fundo de pensão dos funcionários dos Correios. Segundo a PF, ações iniciadas nesta quinta-feira (1º) continuarão pelas próximas 48 horas em São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal e Alagoas.
Ainda de acordo com a polícia, auditorias encaminhadas pelo Ministério Público Federal identificaram má gestão, irregularidades e impropriedades na aplicação dos recursos do fundo, que hoje tem deficit de cerca de R$ 6 bilhões – o que obrigou o aposentados e funcionários dos Correios, além do Tesouro Nacional, a aumentar a contribuição previdenciária.
Foram emitidos em torno de 100 mandados judiciais contra pessoas físicas – em especial empresários em suposta articulação com gestores que estariam envolvidos nas fraudes e dirigentes de uma instituição financeira – e jurídicas, entre elas empresas com títulos em Bolsas e instituições de avaliação de risco.
A reportagem apurou que um dos investigados na operação é a unidade brasileira do banco norte-americano BNY Mellon, com o qual o Postalis mantinha um contrato para gestão de investimentos. Não há mandados de prisão na operação de hoje.
“Em razão da dimensão dos desvios investigados, da complexidade dos crimes e do volume de documentos que se projeta encontrar, a PF optou por utilizar na Operação Pausare uma doutrina que dá maior ênfase à multiplicação das oportunidades para a investigação policial, realizando a análise da pertinência dos documentos e mídias, além de outros atos de apuração, nos próprios locais de busca, criando novas possibilidades investigativas e aumentando a agilidade, eficácia e a transparência do trabalho de investigação policial”, informou a polícia.
Alvos
Um dos alvos da operação Pausare é o empresário Milton Lyra, apontado como operador do senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Lyra é investigado no mesmo inquérito em que Calheiros por suposta atuação em investimentos fraudulentos do Postalis. Em relatório anexado ao inquérito, o MPF aponta que Lyra recebeu R$ 13,8 milhões de fundos de investimentos em que o Postalis é cotista – R$ 3,5 milhões do Atlântica Real Sovereign e R$ 10,3 do Brasil Sovereign II.
“A partir da análise documental do Relatório de Inteligência Financeira nº 20044, pode-se verificar que Milton Lyra teve movimentação financeira de forma indireta com o Postalis no montante de R$ 13.898.693,85 por meio de recebimento de valores dos Fundos de Investimento da Atlântica Real Sovereign Fundo de Investimento e da Brasil Sovereign II Fundo de Investimento de DI, visto que ambas tem a Postalis como cotista”, diz o pedido de abertura da investigação feito pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot.
No pedido de abertura do inquérito, Janot também apontou que a quebra de sigilo telemática de Lyra mostra que há nada menos que seis números de telefone e um e-mail constantes em seu celular como sendo de Alex Predtechensky, ex-presidente do Postalis e denunciado por desvios no fundo.
Predtechensky também é um dos alvos da Pausare. Responsável pelo fundo de pensão entre 2006 e 2012, o executivo, conhecido como Russo, é visto como apadrinhado político do ex-ministro de Minas e Energia e atual senador Edison Lobão (PMDB-MA).
O jornal O Estado de S. Paulo revelou em novembro de 2017 que o empresário Paulo Roberto Gazani Júnior, investigado na Operação Custo Brasil, desdobramento da Lava Jato, afirmou em acordo de colaboração premiada que o ex-presidente do Postalis Alexej Predtechensky pediu propina de 3% na negociação de uma operação de debêntures envolvendo a empresa JHSF, em um total de R$ 75 milhões.
À época, Predtechensky apontava a necessidade de honrar “compromissos” com seus padrinhos políticos do PMDB. Predtechensky comandou o fundo de pensão entre 2006 e 2012.
No termo de colaboração, Gazani diz que o ex-presidente do Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios, não deixou claro quem do PMDB era o responsável por sua indicação para o posto, mas ele é conhecido por ser apadrinhado político do senador Edison Lobão (MA). Predtechensky já foi sócio de um dos filhos do senador, Márcio Lobão, em uma empresa que fechou há alguns anos. O peemedebista nega a indicação política.
Gazani Júnior também afirmou na delação que até uma igreja foi utilizada para mascarar suposto pagamento de propina para o ex-presidente do Postalis Alexej Predtchensky.
A reportagem está tentando contato com o ex-presidente do Postalis Alexej Predtechensky e com Milton Lyra. O espaço está aberto para as manifestações.
A operação
O nome da operação faz referência ao infinitivo presente do verbo latino pauso – pausare –, palavra empregada com o sentido de aposentadoria.
A Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) decretou, em outubro de 2017, a intervenção na entidade que tem 140 mil participantes. O Postalis é o maior fundo de pensão brasileiro em número de participantes e responsável por administrar um patrimônio de R$ 8,77 bilhões.
Até o fim de 2015, o plano de benefício definido do fundo (um tipo de plano mais antigo, que foi suspenso a novos participantes, em que o benefício era previamente estipulado, independentemente da evolução das contribuições) acumulava rombo de R$ 7,2 bilhões. No ano passado, o plano voltou a ter déficit, de R$ 1,1 bilhão.
Boa parte do rombo é consequência de maus investimentos, como papéis atrelados à dívida da Argentina e da Venezuela a aplicações em títulos de bancos liquidados (Cruzeiro do Sul e BVA) e ações de empresas de Eike Batista.
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