Um dia depois de o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, apresentar projeto que propõe a criminalização do caixa 2 e levanta a possibilidade de isenção de pena a policiais que matarem em serviço, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) apontaram falhas no pacote de medidas que representa o pilar da política de segurança e combate à corrupção do governo de Jair Bolsonaro (PSL). Para diminuir as resistências, Moro deve programar uma série de visitas aos integrantes do tribunal.
Uma das propostas defendidas por Moro é retirar dos juízes eleitorais a competência para processar e julgar os crimes comuns que forem conexos com os crimes de natureza eleitoral. Para Moro, se há indício de caixa 2 e corrupção em um caso, a Justiça Eleitoral deve ficar com a investigação de caixa 2, enquanto a federal apura corrupção. As punições são mais brandas na Justiça Eleitoral, o que tem motivado políticos a pedirem que seus casos sejam investigados nessa esfera judicial.
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“O curioso é que o anteprojeto seria de lei ordinário, mas matéria de atribuições e competências e da Justiça Eleitoral a Constituição exige lei complementar hoje. Projeto de lei ordinária obviamente não pode alterar o artigo 35 inciso segundo (do Código Eleitoral). observação a ser debatida oportunamente”, ressaltou o decano do STF, ministro Celso de Mello, durante sessão da Segunda Turma desta terça-feira (5).
Um outro ministro ouvido reservadamente pela reportagem acredita que um dos pontos mais controversos do pacote de Moro é o excludente de ilicitude, sobre a possibilidade de redução ou isenção de pena de policial que causar morte em serviço.
Criminalidade
Para esse integrante da Suprema Corte, os pontos tocados no pacote de Moro são polêmicos – como assegurar a execução de pena após julgamento em segundo grau e transformar em crime a utilização de caixa 2 nas campanhas eleitorais –, mas não resolvem por si só a alta criminalidade no País.
Esse ministro ressalta que o problema da segurança pública vai além da modernização de projetos de lei, exigindo cooperação com os Estados, mais recursos e melhoria das condições das polícias e do sistema prisional.
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Sobre a proposta de aumentar na lei brasileira a possibilidade de acordo em que o acusado e o Ministério Público podem negociar pena (o “plea bargain”), esse ministro aponta que há déficits de defensores públicos, de assistência às pessoas que vão fazer as negociações, “então surgem todos os problemas que podem contaminar a legitimidade do próprio procedimento”.
Visitas
Além de articular com o Congresso, Moro sabe que poderá enfrentar resistências no Supremo diante de precedentes firmados pelo tribunal. O ministro programará visitas aos ministros da Suprema Corte, a primeira delas com o presidente Dias Toffoli.
Quando apresentou na segunda-feira o projeto à imprensa, Moro mostrou deferência ao ministro Alexandre de Moraes, que já havia apresentado ao Congresso uma proposta de incluir o chamado “plea bargain” na lei brasileira. “Essa sugestão foi do ministro Alexandre de Moraes. Com a licença dele, nós plagiamos”, acenou.
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A proposta de Moro de prever que os condenados por corrupção ou peculato (desvio de dinheiro público) iniciem o cumprimento de pena regime fechado esbarra em um precedente do Supremo. Em diversas decisões, o tribunal declarou inconstitucional o trecho da lei de crimes hediondos que previa o cumprimento da pena em regime inicial e disse que não se podia impor regime inicial fechado.
A regra de Moro faria que corruptos ou condenados por roubo a mão armada resultando lesão física ou morte começassem presos sem permissão para deixar a penitenciária mesmo se a pena for inferior a oito anos – o prazo que a lei fixa para que isso seja feito. O entendimento da Corte é que toda pena tem de ser individualizada, com fundamentação específica.