Vem aí o maior crescimento econômico dos últimos seis anos. Mas não será um espetáculo. Também não vai provocar grande melhora no mercado de trabalho. Tem mais: para garantir esse avanço, será preciso aprovar a reforma da Previdência, ou no mínimo deixá-la muito bem encaminhada. É o que temos para 2019.
(Ah: antes de continuar, esteja ciente de que em oito dos últimos dez anos os especialistas superestimaram o desempenho da economia.)
Comecemos pela parte boa. Segundo o Banco Central, a mediana das previsões de consultorias, bancos e corretoras aponta para um aumento de 2,55% no Produto Interno Bruto (PIB) no ano que vem, o maior desde 2013. Em outros tempos, uma taxa dessas seria recebida com desdém. Hoje é muito bem-vinda. O país, afinal, vem de dois anos de forte recessão seguidos por outros dois de baixo crescimento, pouco acima de 1%.
Os dados mais recentes reiteram que a atividade econômica mais patina do que avança. Mas, sob outros aspectos, Jair Bolsonaro vai herdar um quadro favorável.
“Está fácil crescer. A inflação está quieta e há muita capacidade ociosa, com gente desempregada e máquina parada. Então o crescimento econômico não será, tão cedo, um fator gerador de inflação. E o Banco Central não será, tão cedo, constrangido a elevar os juros”, avalia Fernando Sampaio, diretor de macroeconomia da LCA Consultores.
A taxa básica de juros (Selic) está em 6,5% ao ano, o menor nível da história, e as perspectivas são de que suba apenas no segundo semestre do ano que vem – se subir. “Nessas condições, o mercado de crédito pode avançar mais rápido”, diz Thaís Marzola Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados.
LEIA TAMBÉM: Imposto de Renda de 35% – e outras dicas de Temer para Bolsonaro arrecadar mais
Outro ponto favorável é que muitas empresas e famílias já se livraram das dívidas mais pesadas e podem pegar dinheiro emprestado para voltar a investir e consumir. “As famílias já passaram por esse processo de desalavancagem, ajudadas por facilidades como o saque do FGTS de contas inativas e do PIS/Pasep, e as empresas estão concluindo”, diz o economista-chefe da consultoria Parallaxis, Rafael Leão.
Parte dessas condições, diga-se, já existe há algum tempo: o juro básico está em 6,5% ao ano desde março e a inflação já esteve abaixo do nível atual. Era para o país estar crescendo mais. Tanto que, no início do ano, os departamentos econômicos projetavam uma alta de 2,7% no PIB. O que mudou tudo foi a greve dos caminhoneiros, em maio. Hoje a percepção é de que 2018 vai fechar com algo próximo de 1,3%.
Engana-se quem pensa que a melhora esperada para 2019 se deva à posse de Bolsonaro. As previsões para o avanço do PIB no que vem já foram até maiores, chegando a 3% em média, mas também pioraram na esteira da paralisação dos transportadores. Estão próximas de 2,5% desde junho e mal se moveram após a vitória do ex-militar.
E esse velho palpite não tem a ver só com a produção econômica. É um tanto baseado, desde bem antes das eleições, na esperança de que o futuro governo faça reformas que sinalizem uma contenção no aumento da dívida pública. “Já estava embutida, nesse cenário [de alta de 2,5% no PIB em 2019], a eleição de alguém pró-mercado, que promova uma melhora nas contas públicas”, diz Pedro Paulo Silveira, economista da corretora Nova Futura.
É aqui que entra a reforma da Previdência. E é aqui que as coisas complicam.
A explosão da dívida pública, que mantém credores desconfiados da capacidade do país de honrar seus compromissos, é reflexo do persistente rombo das contas federais, que estão no vermelho desde 2014. E esse rombo é, em grande parte, resultado do déficit da Previdência. Assim, não há como equilibrar as finanças públicas e conter a dívida sem limitar as despesas com aposentados e pensionistas, que têm regras incompatíveis com o envelhecimento da população e sobem além da inflação, do PIB e da arrecadação. Elas já consomem mais da metade dos gastos primários (não relacionados à dívida) e a cada ano deixam menos espaço para investimentos em outras políticas públicas.
SAIBA MAIS: E agora, Brasil? O bônus acabou – cinco anos mais cedo
Acontece que esse raciocínio não convence boa parte da população nem sensibilizou o Congresso nas tentativas do governo Temer de mexer no sistema previdenciário. Mas, para boa parte dos economistas, a reforma vai se impor cedo ou tarde, porque sem ela o país ficará ingovernável. É por isso que ano após ano ela continua aparecendo no chamado “cenário-base” das planilhas.
Todos os economistas consultados pela Gazeta do Povo contam com a aprovação da reforma da Previdência em suas projeções para a evolução do PIB em 2019, que variam de 2% a 3%.
Que fique claro: nenhum deles acredita que a eventual mudança das regras de aposentadoria será capaz de gerar, logo no primeiro ou segundo ano de governo, uma grande economia de dinheiro a ser usado no abatimento da dívida ou em investimentos capazes de girar a economia. O efeito esperado da reforma no curto prazo é mais sobre a confiança, em especial a dos credores da dívida pública – até porque não é fácil encontrar cidadão entusiasmado com a possibilidade de se aposentar mais tarde e ganhando menos.
A tese é a seguinte. Com a certeza de que a trajetória do endividamento público ficará mais tranquila, os credores passam a exigir juros menores, ou pelo menos não exigir juros maiores, para continuar financiando o governo. Este, por sua vez, fica menos tentado a elevar impostos para bancar os gastos. A pressão sobre o dólar também perde força, mantendo os preços comportados. De resto, a economia toda fica mais previsível, o que facilita a vida de quem quer consumir, empregar, investir na produção. É dessa combinação de condicionantes que viria o empurrão para mover a roda.
Articulação política
Como o governo estará no início, munido do capital conferido por quase 58 milhões de votos, as condições políticas para a aprovação de uma reforma parecem boas. Mas as declarações de Bolsonaro sobre o tema são contraditórias, e o “superministro” da Economia, Paulo Guedes, não tem se esforçado para fazer amigos no Congresso.
Para Rafael Leão, da Parallaxis, há 60% de chances de um avanço do PIB entre 2% e 2,5% no ano que vem, desde que o governo não enfrente grande turbulência – inclusive vinda do exterior, onde há perspectiva de desaceleração de grandes economias – e aprove reformas fiscais, principalmente a da Previdência. E 40% de chances de um crescimento menor, fruto de dificuldades de articulação no Congresso e um eventual escândalo que leve o governo a adotar políticas populistas. Sem reforma, calcula o economista, o crescimento ficaria limitado a algo próximo de 1%.
ANÁLISE: Qual é a reforma da Previdência de Jair Bolsonaro?
Fernando Sampaio, da LCA, vê como mais provável um aumento entre 2,5% e 3%, a depender da velocidade com que o Planalto se acertar com os parlamentares. Por outro lado, um cenário de desarranjo político – e de frustração da reforma – faria o PIB avançar 1%. Mas, para o economista, a probabilidade de isso ocorrer é menor, de 15%.
O Ministério da Fazenda também crê que o país só pode crescer 2,5% em 2019 se fizer reformas fiscais. Sem elas, a estimativa cai para 0,7%, segundo relatório entregue à equipe de transição.
Mercado de trabalho
A expectativa de dificuldades na articulação política – e, portanto, no avanço das reformas – levou a Rosenberg a reduzir ainda em setembro sua projeção para o aumento do PIB, de 3% para 2,8%, o que mantém a consultoria ligeiramente mais otimista que a média do mercado. Nem esse crescimento, no entanto, será capaz de provocar um grande aquecimento do mercado de trabalho.
A expectativa da Rosenberg é de que a taxa de desemprego recue de uma média estimada em 12,2% neste ano para 11,4% em 2019, cálculo semelhante ao da LCA, que trabalha com um índice de 11,6% no ano que vem. Quatro anos atrás, a desocupação era de 6,5%.
LEIA TAMBÉM: Revés para Bolsonaro: Lewandowski garante reajuste de servidores federais em 2019
“O emprego deve ter uma recuperação progressiva, mas lenta, pois ainda há muita capacidade produtiva a ser ocupada”, diz Sampaio. Segundo ele, a remuneração tende a crescer ainda mais devagar porque, com muita gente procurando trabalho, o empresário não precisa oferecer salários mais altos.
A LCA prevê 666 mil novos empregos com carteira assinada em 2019, ante 378 mil em 2018. A Parallaxis, por sua vez, estima 480 mil vagas formais em 2018 e perto de 1 milhão em 2019. Entre 2015 e 2017, mais de 3 milhões de postos com carteira assinada foram fechados no país.
Hugo Motta troca apoio por poder e cargos na corrida pela presidência da Câmara
Eduardo Bolsonaro diz que Trump fará STF ficar “menos confortável para perseguições”
MST reclama de lentidão de Lula por mais assentamentos. E, veja só, ministro dá razão
Inflação e queda do poder de compra custaram eleição dos democratas e também racham o PT