Nunca nenhuma operação de combate à corrupção chegou tão longe no Brasil. Em três anos de existência, a Lava Jato desnudou um gigantesco esquema de corrupção que já atinge em cheio dois ex-presidentes, um presidente em exercício e boa parte do Congresso Nacional – além de ter ramificações em outros estados brasileiros, atingindo de vereadores a governadores.
Com isso, a sociedade passa a olhar com muito mais dúvidas e descrédito para a figura do “político tradicional” e busca novas lideranças para o cenário eleitoral de 2018. Levantamento do Instituto Paraná Pesquisas divulgado no final do ano passado mostrou que só 32% dos eleitores brasileiros votariam em um político, contra 49% que preferem escolher um candidato de fora do meio caso tenham essa opção em 2018.
Para um dos principais advogados que atua na defesa de réus da Lava Jato, a operação não vai resolver o problema da corrupção no país, mas é “um marco histórico importante para advertência”. “E uma advertência que também é importante é que nós tenhamos muito cuidado com nosso sistema político, de não aceitarmos os corruptos, mas também não aceitarmos os messias”, alerta Antônio Figueiredo Basto, advogado do doleiro Alberto Youssef – um dos primeiros colaboradores da Lava Jato.
Para ele, a Lava Jato pode acabar contribuindo para o surgimento de heróis na política, que na prática não são melhores que os políticos tradicionais. “O pior não é o vício da corrupção, é a arbitrariedade de um moralizador”, explica. “Porque o moralizador não deixa você viver, ele aponta o dedo, ele é o pior tipo de gente, ele pratica a pior corrupção, que é a das ideias”, conclui Basto.
Acerto de contas
Para Basto, a Lava Jato possibilita um “acerto de contas” com o passado do Brasil, permeado por casos de corrupção que ficaram impunes. “Todos os nossos avós sabiam que isso existia e nunca fizeram nada. Então, de certa forma, nós estamos redimindo nossos ancestrais e fazendo hoje um velho acerto de contas com a corrupção, que nesse país é vitalícia ou hereditária”, diz.
A advogada Alessi Brandão, que também atua na Lava Jato, concorda que a corrupção no país não é uma novidade. Para ela, houve durante muito tempo uma certa omissão dos órgãos de investigação no Brasil. “No mundo perfeito, pessoas como Marcelo Odebrecht e outras situações já teriam sido descobertos. Porque uma coisa que não se pergunta é onde estavam os promotores e juízes há cinco, dez anos, que não viam tudo que acontece. A gente vivia no País das Maravilhas? Não vivia”, critica a advogada, que é responsável pela defesa de réus como o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, a doleira Nelma Kodama e dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura.
O Brasil tem jeito?
Os dois advogados têm visões diferentes sobre o papel da Lava Jato em uma mudança de comportamento dos políticos brasileiros. Para Basto, a questão da corrupção vai muito além do comportamento dos políticos e passa também pelo comportamento da sociedade civil. “Quem elege o congressista é o povo. É inevitável dizer que nosso Congresso é um espelho do nosso povo”, lembra o advogado. “Nós temos um povo que não é lá grande coisa e o Congresso é o espelho dele. É um povo que está acostumado a subornar guarda de trânsito, a furar fila. Enfim, isso é um problema cultural, que talvez um dia se resolva, ou nunca”, analisa.
Para Alessi, o país passa por um momento de mudança. “Quem vai passar o Brasil a limpo somos nós, não a operação como um todo”, afirma. “Como diz meu porteiro, há cinco, oito anos, todo mundo sabia o nome dos 11 jogadores da seleção brasileira, hoje todo mundo sabe o nome dos 11 ministros do STF. Isso para mim já é uma mudança. Acho que a Lava Jato não vai ser a última operação [contra a corrupção] que vamos ter, mas acho que para chegar a um nível tão alto de desfaçatez daqui para frente é difícil”, analisa a advogada.
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