Um instrumento que está presente há décadas no processo penal brasileiro agora é considerado inconstitucional, justamente quando atingiu as classes sociais mais elevadas. Para alguns dos procuradores da força-tarefa da operação Lava Jato no Paraná, foi isso o que ocorreu com a discussão sobre a condução coercitiva. Na quinta-feira (14), por seis votos a cinco, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional esse tipo de expediente, que é muito usado na Lava Jato, e consiste em conduzir um investigado, com auxílio de força policial, para prestar depoimento.
“A decisão de hoje me causa um pouco de preocupação, no sentido de que isso pode ser uma abertura para que, em pouco tempo, comecem a questionar outras questões relativas aos procedimentos da Lava Jato. Como o próprio ministro [Luís Roberto] Barroso falou ontem: de repente, do nada, quando se começou a atacar réus de maior poder aquisitivo, houve um surto de garantismo no Brasil”, argumentou Diogo Castor de Mattos, procurador que estava lançando o livro “O amigo do direito penal”, com noite de autógrafos nesta quinta-feira (14), em um shopping de Curitiba.
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O argumento de Castor de Mattos é que o dispositivo condução coercitiva é usado há anos sem nenhum questionamento, “até que chegou a um ponto que começou a ser feito com pessoas que estão no ápice da pirâmide social”. “A minha preocupação é de que, no futuro, essa seja uma válvula de escape para outros procedimentos da operação Lava Jato,que sejam questionados ou mesmo invalidados”, desabafou.
Quem engrossou as críticas foi o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, conhecido por seus ‘textões’ de Facebook e também por ter sido alvo de um processo disciplinar por criticar o presidente Michel Temer (MDB), que acabou arquivado. “O código de processo penal é de 1941, nós temos essa prática já de muitos anos da condução coercitiva, mas quando ela se aproximou das pessoas que realmente tem poder, aí o Supremo foi chamado a decidir”, ponderou.
Lima ainda afirmou que não entraria no mérito da decisão do Supremo, mas que no entendimento deles, a condução coercitiva era constitucional. “Vamos respeitar a decisão do Supremo, com a obediência que toda a decisão do Supremo merece. No entanto, decisões do Supremo devem ser cumpridas, mas devem ser criticadas também”, declarou.
Para ele, o Direito não pode mais ser trabalhado como uma abstração, mas precisa funcionar tanto para proteger o acusado como também para chegar a uma sentença que possa ser executada. “Coisa que não temos no Brasil e pontos fora da curva, como a Lava Jato e o mensalão, ainda não mudaram essa normal brasileira de impunidade”, completou e foi aplaudido pelos presentes.