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| Foto: Rafael Arbex/ Estadão Conteúdo

A Polícia Federal encontrou no celular de Wesley Batista, presidente-executivo e sócio da JBS, uma série de mensagens que reforçam a atuação do ex-procurador Marcello Miller a favor da empresa quando ainda atuava no Ministério Público Federal (MPF).

Um relatório da PF afirma que integrantes da Procuradoria-Geral da República (PGR) tinham “ciência de que Miller estava atuando de forma indireta nas negociações da colaboração premiada”. O ex-procurador fazia parte de um grupo de WhatsApp com diretores e delatores da JBS. Ele só se manifestou no grupo, porém, no dia 4 de abril, seu último dia de trabalho no MPF no Rio.

Outras mensagens, porém, mostram que ele já orientava o acordo de delação desde março. As mensagens estavam no celular de Wesley Batista, que foi apreendido durante a quarta fase da Operação Lama Asfáltica, deflagrada em maio deste ano.

Confidencialidade

Um dos diálogos revela que ele foi convidado a ir para a reunião, em 28 de março, em que os empresários assinaram o termo de confidencialidade com a PGR se comprometendo a dar início às tratativas da delação. “Amanhã ele tem expediente no atual emprego dele e não pode, não”, disse Francisco de Assis e Silva, executivo e advogado da JBS, também delator.

Em outra mensagem, porém, ele afirmou “estou tentando levar o Marcello amanhã”. Não fica claro se o ex-procurador esteve ou não presente na PGR no dia 28 de março. Segundo a PF, as mensagens evidenciam “a participação de Marcello Miller como peça fundamental no êxito do acordo”.

Para a polícia, a JBS cooptou um agente público para lograr êxito em uma delação que lhes garantiu imunidade. “O que impressiona é o fato de que a cooptação de Miller ocorre no momento em que supostamente os investigados se apresentavam às autoridades públicas com uma proposta baseada fundamental em um duplo alicerce: arrependimento, diga-se dispostos a não mais delinquir, e propensos a colaborar de forma efetiva”.

Vantagem

A polícia sustenta que houve no mínimo a promessa de vantagem ilícita, apontando o crime de corrupção passiva e ativa. A PF ainda conclui que o advogado Francisco de Assis e Silva mentiu em depoimentos quando disse que Miller não havia participado do acordo de delação.

O relatório, ao qual a reportagem teve acesso, faz parte da investigação sobre supostos crimes cometidos pelos irmãos Batista, acusados de se beneficiarem da compra de dólares e com a venda de ações da JBS, aproveitando-se do impacto no mercado de seu acordo de delação premiada.

O documento da PF justifica o pedido de prisão de Wesley e Joesley e diz inclusive que a participação de Miller também seria motivo para a preventiva. Foi feita ainda uma solicitação de busca e apreensão nas residências de Fernanda Tórtima e Marcello Miller, mas o juiz não deferiu.

Gabinete de Janot

A polícia transcreve no relatório mensagens do grupo de WhatsApp que, no seu entendimento, demonstram a ciência de pessoas do gabinete de Janot sobre a participação de Miller. Em um dos diálogos, a advogada Fernanda Tórtima diz que os procuradores Eduardo Pelella, chefe de gabinete de Janot, e Sérgio Bruno, que faz parte do grupo de trabalho da Lava Jato, sabiam ao menos de uma viagem de Miller para os Estados Unidos para tratar da leniência.

As mensagens reproduzidas no documento são:

Francisco de Assis e Silva: “Fernanda, ele precisa por na mesa a leniência, a imunidade e as demais penas corporais e que eles têm que assumir o protagonismo no DOJ conforme o Pelella assumiu o compromisso. Amanhã a gente combina a agenda do Joesley com eles”.

Fernanda Tórtima: “Amanhã de manhã eu digo que o Marcello foi e que vai ligar. Lembra que o Pelella disse que ficaria esperando uma ligação da Esther [Flesh, advogada do mesmo escritório que Miller foi fazer parte após saída do Ministério Público] antes de fazer contato com o DOJ? Essa ligação será do Marcello. Eu disse que ele teria que falar hoje com o DOJ e disse que o Marcello iria. Nessa hora achei estranho ele dizer que já tinha a informação de que o Marcello iria”.

Linha do tempo

A PF coloca em seu relatório uma linha do tempo da participação de Miller.

1) 17 de março: Ricardo Saud afirma que estaria “jeitando” a situação empresarial com Marcello Miller

2) 27 de março: Wesley pede a presença de Miller na reunião que ocorreu no dia 28 de março na PGR para assinatura de termo de confidencialidade

3) 31 de março: ocorre provável reunião entre Miller e os advogados Francisco de Assis e Silva e Fernanda Tórtima

4) 3 de abril: Marcello trata com o DOJ (Departamento de Justiça dos EUA) por telefone o acordo de leniência

5) 4 de abril: último dia de Marcello como procurador, dando orientação para a colaboração e a leniência em um grupo de WhatsApp com diretor e delatores da JBS

6) 5 de abril: data em que é exonerado do Ministério Público, Miller se reúne com Wesley no aeroporto do Galeão antes de embarcar para os Estados Unidos para tratar de leniência com o DOJ

7) 6 de abril: Miller participa de reunião no DOJ defendendo interesses da JBS na leniência

Outro lado

Por meio de nota, a PGR afirma que “não procedem as informações” e que não tem conhecimento do relatório da PF. O órgão diz que “trata-se de conversas de terceiros fazendo suposições sobre a atuação de integrantes do Grupo de Trabalho que auxilia o procurador-geral da República nos processos da Lava Jato perante o Supremo Tribunal Federal”.

A PGR alega que os fatos veiculados mostram “que foi frustrada a tentativa dos advogados dos colaboradores de misturar indevidamente negociações de colaboração premiada e leniência. A PGR, de fato, negociou as colaborações (matéria penal), firmadas em maio, e a Procuradoria da República no DF conduziu as tratativas de leniência (matéria cível), cuja conclusão ocorreu em junho deste ano”.

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