Dentro da Polícia Federal, o clima é de perplexidade entre os policiais com o fim da força-tarefa da Operação Lava Jato no Paraná. Para especialistas e políticos da oposição, a medida divulgada nesta quinta-feira (6) demonstra clara tentativa de esvaziamento das ações de investigação e combate à corrupção. No governo, o tom é de naturalidade e o argumento é de que apenas foi adotada a “descentralização” das investigações.
O momento em que foi anunciado o fim não poderia ser mais estranho: nesta semana a denúncia criminal contra o presidente Michel Temer chegou à Câmara e foi preso um dos políticos do núcleo próximo a Temer, o ex-ministro Geddel Vieira Lima.
Há uma crise entre governo e a PF. Os agentes e delegados vinham alertando para a desatenção do governo com o trabalho e os problemas da corporação, mas foram pegos de surpresa com o fim da força-tarefa neste momento. A interrupção de atividades na PF, como a emissão de passaportes, e a redução de ações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) foram formas de os agentes sinalizarem que a situação política estava ficando ruim.
A posição do governo foi a de que não era mais necessário manter delegados exclusivos para a Lava Jato, mas essa explicação é pobre para um grupo de delegados. Para eles, o ideal seria que a força-tarefa fosse transformada em algo permanente. No futuro, com o fim da investigação na Petrobras, por exemplo, eles poderiam começar a escrutinizar outras estatais, bancos. Isso agora estaria “sepultado”, avaliam pessoas com trânsito junto a delegados da PF.
Em nota, a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), disse que recebeu “com cautela” a notícia. Para a entidade, há risco de a medida trazer prejuízos à Lava Jato.
“Ao desestruturar unilateralmente a força-tarefa, a Lava Jato passará, em tese, a seguir o rito normal de um inquérito comum. Corre-se o risco de a maior operação de combate à corrupção sofrer com os trâmites burocráticos do já ultrapassado modelo investigativo do país, uma vez que no formato de força-tarefa, o contato da Polícia Federal com o Ministério Público e com o Judiciário era permanente e exclusivo. Agora, não mais, mesmo que não tenha havido modificação das peças, com a preservação da equipe atual, que passará a concorrer a escalas de sobreaviso e distribuição de outros inquéritos”, argumenta a Fenapef.
André César, cientista político da Hold Assessoria Legislativa, vê “esvaziamento” das investigações com a decisão de encerrar a força-tarefa da PF do Paraná. Para ele, pode ter ocorrido alguma mudança política dentro da PF e o momento em que isso acontece é sintomático.
O sepultamento da força-tarefa paranaense pode indicar que a cúpula da Polícia Federal está cedendo a pressões políticas, avalia César. “Temos de esperar mais informações, mas o que temos agora, e analisando com base no histórico recente, é um sinal de esvaziamento. A operação Lava Jato já não tem mais aquela pegada”, afirmou o analista.
Para a oposição, a medida simboliza um acordo para esvaziar as investigações e impõe prejuízo à PF. O deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) afirmou que “[a mudança é] gravíssima. A cada dia o presidente Michel Temer tira um tijolo de sustentação de instituições importantes como o Polícia Federal. As investigações correm risco de serem comprometidas”. Já Chico Alencar (PSOL-RJ) acredita que “eles [os investigados] estão fazendo um acordão para esvaziar a Lava Jato”.
Governo fala que medida prioriza investigações
O Ministério da Justiça, pasta à qual a PF é ligada, afirmou que a Operação Lava Jato não acabou e até alega que, com isso, as investigações ganham prioridade. Os delegados que integravam a força-tarefa irão compor a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (Delecor).
“A medida visa priorizar ainda mais as investigações de maior potencial de dano ao erário, uma vez que permite o aumento do efetivo especializado no combate à corrupção e lavagem de dinheiro, e facilita o intercâmbio de informações. Com a nova sistemática de trabalho, nenhum dos delegados atuantes na Lava Jato terá aumento de carga de trabalho, mas, ao contrário, ela será reduzida em função da incorporação de novas autoridades policiais”, afirmou o Ministério, em nota.
Deputados da base do governo Temer trataram com naturalidade o assunto. “Não acho que vai enfraquecer”, disse Darcísio Perondi (PMDB-RS). “Vai haver uma descentralização. Eu confio nos técnicos do Ministério da Justiça”, afirmou.
Questionado sobre o simbolismo que o fim do grupo especial teria neste momento político, Carlos Marun (PMDB-MS) não respondeu e se limitou a dizer que “nada mudou”, pois o diretor da PF, Leandro Daiello, está mantido.