Está em vigor a nova tabela do fator previdenciário, índice usado no cálculo das aposentadorias por tempo de contribuição do INSS. A nova versão, válida para os benefícios requeridos a partir de 1.º de dezembro, reduz um pouco mais o valor da aposentadoria.
Implantado em 1999, na gestão de Fernando Henrique Cardoso, o fator previdenciário leva em conta a idade, o tempo de contribuição e a expectativa de sobrevida do beneficiário a partir do momento em que se aposenta. Esta última é estimada, todos os anos, pelo IBGE, nas chamadas tábuas de mortalidade.
Cada nova tábua leva a uma atualização no fator. Quando a projeção de longevidade aumenta – e ela aumenta praticamente todo ano, dada a tendência de envelhecimento da população –, o desconto provocado pelo fator também cresce.
Foi o que ocorreu no início deste mês, com a publicação da tábua referente a 2017. Ela já está sendo usada no cálculo das novas aposentadorias e continuará sendo referência durante quase todo o ano de 2019.
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A expectativa de vida ao nascer, por exemplo, aumentou de 75,8 anos de idade na tábua de 2016 para 76 anos na versão de 2017. Em termos mais precisos, o aumento foi de três meses e 11 dias. Na mesma comparação, a expectativa de sobrevida de um brasileiro com 57 anos passou de 24,6 para 24,8 anos.
Em termos práticos, isso significa o seguinte. Um homem com 57 anos de idade e 35 de contribuição que tenha se aposentado no mês de novembro – antes da mudança – ficou sujeito a um fator de 0,74. No cálculo do valor da aposentadoria, a média dos 80% maiores salários de contribuição do segurado foi multiplicada por esse índice, o que resultou em um benefício 26% menor que a chamada “aposentadoria integral”. Se a média salarial dele fosse de R$ 2,5 mil, por exemplo, o valor da aposentadoria seria reduzido a R$ 1.850 após a aplicação do fator.
A partir de 1º de dezembro, o fator aplicado para um trabalhador com as mesmas características passou a ser de 0,735 (confira a tabela completa). Assim, o desconto em relação ao benefício integral é de 26,5% – e, nesse caso, uma média salarial de R$ 2,5 mil resulta num benefício mensal de R$ 1.837,50.
A ideia por trás da criação do fator previdenciário era simular uma poupança, formada pelas contribuições do trabalhador ao longo da vida, a ser devolvida a ele em parcelas mensais durante sua aposentadoria. Quanto maior a expectativa de sobrevida, maior é o tempo pelo qual ele supostamente vai usufruir do benefício – e menor o valor mensal que receberá do INSS.
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Trata-se de simulações, baseadas em expectativas. Por óbvio, não há como saber ao certo quantos anos o segurado viverá após a aposentadoria. Então seu benefício acaba sendo decidido por uma projeção, que conforme o caso pode favorecê-lo (se ele viver mais que a sobrevida projetada) ou prejudicá-lo (se viver menos).
Fator adiou aposentadorias, mas longevidade avançou ainda mais
Na época da criação do fator, havia a expectativa de que, ao reduzir o benefício para quem se aposentasse precocemente, o mecanismo levasse os brasileiros a adiar a aposentadoria. Isso ocorreu, mas não a ponto de compensar o avanço da longevidade.
Segundo estudo de seis pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a idade média com que as pessoas se aposentam por tempo de contribuição no país passou de 51,8 anos em 2000 para 54,5 anos em 2014 – um aumento de 2,7 anos. No mesmo intervalo, a expectativa de sobrevida de quem chega aos 60 anos aumentou de 17,7 anos para 21,8 anos, na média de homens e mulheres – um crescimento de 4,1 anos. A projeção de longevidade, por sinal, continuou crescendo desde então. Pela tábua de 2017, a expectativa de sobrevida de quem chega aos 60 anos já está em 22,4 anos.
De todo modo, segundo o mesmo estudo, a aplicação do fator ajudou o INSS a poupar cerca de R$ 75 bilhões ao longo dos 15 anos analisados. Conforme os autores, a manutenção do mecanismo pelas próximas décadas – uma dúvida, dada a intenção do governo eleito de reformar a Previdência – seria quase tão eficiente para limitar os gastos previdenciários quanto a implantação de uma idade mínima “benevolente” de aposentadoria, que começaria em 55 anos para mulheres e 60 para homens e seria gradualmente elevada até chegar a 60 e 65 anos, respectivamente, na década de 2040.
Regra 85/95 “dribla” fator e garante aposentadoria integral
Uma forma de driblar o desconto do fator previdenciário é recorrer à regra 85/95, que entrou em vigor em 2015 numa espécie de contrarreforma da Previdência. Ela garante garante vencimento integral – sem incidência do fator – às mulheres que alcançarem 85 anos na soma de idade e tempo de contribuição. Uma trabalhadora que tenha 31 anos de contribuição e 54 de idade, por exemplo. Para os homens, o valor tem de chegar a 95. Como um segurado de 59 anos de idade e 36 de contribuição.
A fórmula, no entanto, é progressiva e será elevada aos poucos, tornando mais difícil a aposentadoria integral. A primeira mudança ocorre ainda neste mês, no dia 31, quando as somas necessárias passam a 86 e 96. Depois, a soma será elevada para 87/97 em 31 de dezembro de 2020, 88/98 no fim de 2022, 89/99 em 2024 e, por fim, 90/100 em 2026.
Segundo estudo do especialista em Previdência Rogério Nagamine Costanzi, somente nos 25 primeiros meses de vigência essa fórmula gerou despesas adicionais de pelo menos R$ 50,4 bilhões, em valores a serem desembolsados pelo INSS nas próximas décadas.
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