“Estranho seria se Temer não tivesse sido preso”, disse o procurador Eduardo El-Hage a jornalistas, na tarde desta quinta-feira (21), na Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro. Enquanto a equipe do Ministério Público Federal listava argumentos que, segundo eles, justificam as prisões preventivas, o ex-presidente Michel Temer (MDB) era levado para o prédio da PF, onde permanecerá detido.
A tese do MPF é simples, embora a execução dos supostos crimes tenha sido complexa: o órgão sustenta que Temer liderou uma organização criminosa que durante 40 anos recebeu vantagens indevidas por meio de contratos envolvendo órgãos públicos e empresas estatais.
Segundo os procuradores, foi prometido, pago ou desviado para a organização mais de R$ 1,8 bilhão. O caminho de boa parte deste dinheiro, no entanto, ainda não foi identificado pelos investigadores.
LEIA TAMBÉM: 9 pontos para entender a prisão de Temer
A operação deflagrada nesta quinta teve como foco um contrato firmado entre a Eletronuclear e as empresas Argeplan (do amigo de Temer, o coronel João Baptista Lima Filho), AF Consult e Engevix. A delação de José Antunes Sobrinho, executivo da Engevix, foi um ponto de partida para a investigação.
De acordo com o Ministério Público, as empresas contratadas não tinham qualificação para executar o projeto de engenharia da usina nuclear de Angra 3. Por isso, subcontratam a Engevix, em troca do pagamento de cerca de R$ 1 milhão em propina em benefício do ex-presidente.
Os procuradores afirmam que Othon Silva, ex-presidente da Eletronuclear, foi colocado no cargo por Temer, com o objetivo de gerar propina por meio da estatal.
LEIA TAMBÉM: Ministros do STF, juristas e parlamentares criticam ‘espetacularização’ da prisão de Temer
Segundo as investigações, as vantagens indevidas foram pagas por meio de transferências da empresa Alumi Publicidades para a PDA Projeto e Direção Arquitetônica, controlada pelo coronel Lima. Para isso, foram simulados contratos de prestação de serviços.
Moreira Franco, à época ministro da Secretaria de Aviação Civil, teria ajudado a viabilizar o pagamento da propina, pensando em formatos para cobrir atividades ilícitas. A Alumi, que fez o repasse para a empresa do coronel Lima, estava envolvida em um projeto no aeroporto de Brasília.
Os investigadores dizem ter encontrado um dos destinos da propina oriunda do contrato de Angra 3: uma reforma na casa de Maristela Temer, filha do ex-presidente. Segundo o Ministério Público, além de administrar as obras, o coronel Lima empregou na reforma vantagens indevidas recebidas pelo grupo criminoso, em um ato de lavagem de dinheiro.
Foi identificado o uso do e-mail da Argeplan, empresa de Lima, na transmissão de recibos de pagamentos de materiais e serviços, além da atuação de funcionários da empresa na reforma. Relatório policial indica que contratados da obra disseram que receberam a maior parte do pagamento em dinheiro vivo, em valores que podem ultrapassar R$ 1,5 milhão.
O Ministério Público sustenta que as vantagens indevidas resultantes deste contrato representam apenas um braço da organização criminosa que atua há décadas sob o comando de Temer.
Esse grupo, segundo o órgão, continua em operação, recebendo, movimentando e ocultando valores ilícitos, inclusive no exterior. A organização teria acertado propinas que ainda não foram pagas, o que também teria motivado as prisões.
LEIA TAMBÉM: Endereço fixo, 78 anos e à disposição da Justiça: Temer jamais achou que seria preso
Para o MPF, uma tentativa de depósito de R$ 20 milhões em espécie na conta da Argeplan, em outubro de 2018, indica que o grupo ainda está ativo. O setor de compliance do banco rejeitou o dinheiro.
O procurador José Augusto Vagos afirmou a jornalistas que três razões justificam as prisões desta quinta – a garantia da ordem pública, a garantia da aplicação da lei penal e a conveniência da instrução criminal. Ele argumentou que os alvos da operação forjaram documentos e destruíram provas para dificultar as investigações. Segundo Vagos, tudo produzido na Argeplan era destruído em seguida.
Além disso, de acordo com o procurador, agentes da Polícia Federal estavam sendo monitorados pelos envolvidos. Segundo ele, foram apreendidos papéis com dados pessoais dos investigadores.
LEIA TAMBÉM: A rebelião de Rodrigo Maia: por que o presidente da Câmara subiu o tom contra Moro
Vagos também sustenta que funcionários da Argeplan combinaram a mesma versão para justificar as atividades ilícitas. Ele ressaltou que o mesmo grupo criminoso já havia tentado obstruir a Justiça no esquema que envolveu a empresa J&F e que teve como símbolo a famosa frase de Temer: “Tem que manter isso, viu”. “Se foram capazes de fazer aquilo naquele momento, obviamente continuam capazes até hoje”, afirmou.
Por fim, o Ministério Público argumenta que as prisões também se justificam pela necessidade de descobrir onde estão os valores ocultados e ressarcir os cofres públicos. O órgão deve apresentar duas denúncias envolvendo o caso na próxima semana.
O minério brasileiro que atraiu investimentos dos chineses e de Elon Musk
Desmonte da Lava Jato no STF favorece anulação de denúncia contra Bolsonaro
Fugiu da aula? Ao contrário do que disse Moraes, Brasil não foi colônia até 1822
Sem tempo e sem popularidade, governo Lula foca em ações visando as eleições de 2026