Centrais sindicais e movimentos sociais lideram um “tuitaço” nesta segunda-feira (19), com fotos e vídeos de protestos contra a reforma da Previdência, usando a hashtag #QueroMeAposentar. As publicações no Twitter também buscam desmontar os argumentos do governo federal, que, apesar da intervenção federal no Rio de Janeiro, garante que a mudança nas leis previdenciárias continua sendo uma prioridade.
Numa dessas publicações, a CUT expõe um dos argumentos do presidente Michel Temer, para quem “a reforma não vai alterar a aposentadoria da maioria dos trabalhadores”. A central afirma que a frase é mentirosa e que, na verdade, “a reforma atinge mais quem recebe salário mínimo”.
A maioria dos aposentados pelo INSS realmente recebe um salário mínimo, que é o menor valor de uma aposentadoria. Segundo o mais recente Boletim Estatístico da Previdência Social, 60% dos benefícios pagos pelo Regime Geral de Previdência Social têm esse valor.
Mas, ainda que possam ser prejudicados de alguma maneira, os trabalhadores que ganham o mínimo não serão os mais afetados pela reforma.
Isso porque a principal alteração proposta é a fixação de uma idade mínima de aposentadoria, de 62 anos para mulheres e de 65 anos para os homens, que acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição e, com isso, dificultar as aposentadorias precoces. Essa mudança terá impacto maior sobre aqueles que hoje conseguem se aposentar mais cedo que isso, por tempo de contribuição – que são os trabalhadores de classe média e alta. Os números mostram que os mais pobres, hoje, já se aposentam bem mais tarde na maioria das vezes.
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Quem ganha salário mínimo, ou até menos que isso, costuma se aposentar por idade – aos 60 anos, no caso das mulheres, e aos 65 anos para os homens, segundo as regras atuais. Como a reforma propõe idades mínimas de 62 e 65 anos, respectivamente, nada muda para os homens pobres. As mulheres, sim, terão de trabalhar dois anos a mais que o exigido atualmente. Após um período de transição de quase duas décadas, a idade de 62 será exigida delas a partir de 2036.
Pobres passam mais tempo na informalidade
Os mais pobres se aposentam depois porque, por mais que entrem no mercado de trabalho mais cedo, às vezes na infância ou na adolescência, eles passam boa parte da vida na informalidade. Trabalhando por muito tempo sem carteira assinada, dificilmente conseguem contribuir ao INSS por 30 anos (mulheres) ou 35 anos (homens), como exige a aposentadoria por tempo de contribuição, modalidade que permite as aposentadorias precoces, antes dos 60 anos. Resta aos mais pobres, portanto, continuar trabalhando e se aposentar por idade, porque nesse caso precisam comprovar somente 15 anos de contribuição.
Os valores médios pagos aos aposentados dão um indício de que a aposentadoria por idade está mesmo reservada aos mais pobres. Segundo o mais recente Boletim Estatístico da Previdência Social, o valor médio pago aos 10,5 milhões de aposentados por idade, em dezembro de 2017, era de R$ 950,20 – pouco mais que um salário mínimo, que é o piso da Previdência e na época estava em R$ 937. Os 6 milhões de aposentados por tempo de contribuição, por sua vez, recebiam em média R$ 1.945,66 – mais que o dobro.
Em outras palavras: os valores mais altos são pagos a quem se aposentou mais cedo, por tempo de contribuição. É o caso das pessoas das classes média e alta, que, mais escolarizadas, passam mais tempo no mercado formal e conseguem contribuir mais ao INSS. Quem se aposentou mais tarde, por idade, ganha um salário mínimo, ou perto disso.
Outros dados reforçam a percepção de que as classes média e alta é que serão mais afetadas pela reforma, com a exigência de uma idade mínima. Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), quase dois terços dos brasileiros que se aposentaram precocemente, por tempo de contribuição, estão entre os 40% mais ricos do país. O trabalho foi conduzido pelos pesquisadores Luis Henrique Paiva, Leonardo Alves Rangel e o atual secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano.
“Para os trabalhadores urbanos mais pobres, de menor qualificação e menor capacidade contributiva, temos uma idade média de aposentadoria de 63 anos. Para os trabalhadores de maior renda e qualificação, reservamos aposentadorias aos 54 anos”, afirmam os pesquisadores Rogério Nagamine Costanzi, Graziela Ansiliero e Luis Henrique Paiva em outro estudo.
Sem mudança no tempo de contribuição
A primeira versão da reforma, já deixada para trás, afetava de forma significativa os mais pobres ao ampliar de 15 para 25 anos o tempo mínimo de contribuição. E, segundo a Previdência Social, a grande maioria das pessoas que hoje se aposentam por idade não juntam esse tempo todo. Em 2015, por exemplo, 79% dos que alcançaram a aposentadoria nessa modalidade contribuíram ao sistema por menos de 25 anos.
Ao longo da tramitação da reforma no Congresso, no entanto, o governo Temer desistiu de aumentar o tempo de contribuição. Em sua versão mais recente, a proposta mantém a contribuição mínima em 15 anos.