Uma das bandeiras do ministro da Economia, Paulo Guedes, é a redução dos benefícios fiscais concedidos pela União – que, pelas contas da Receita Federal, devem tirar dos cofres públicos pouco mais de R$ 300 bilhões neste ano, ou 4,1% do Produto Interno Bruto (PIB).
Durante a campanha eleitoral, Guedes disse que pensava em cortar de 10% a 20% dos incentivos, o que significaria recuperar para os cofres federais algo como R$ 30 bilhões a R$ 60 bilhões por ano. A título de comparação, o pagamento dos benefícios do Bolsa Família deve consumir perto de R$ 30 bilhões em 2019.
Até agora, no entanto, o ministro não revelou quais desonerações pretende atacar. Ao contrário: de concreto, o que o governo de Jair Bolsonaro fez foi prorrogar um incentivo fiscal que acabaria no fim de 2018.
Sugestões de corte nesse tipo de benefício não faltam. Em dezembro, a equipe econômica de Michel Temer entregou ao time de Guedes um relatório sobre a situação fiscal do país em que elencava medidas para o governo gastar menos e arrecadar mais. O Ministro da Economia já deu sinais de que concorda com algumas das iniciativas listadas – como a taxação de dividendos e juros sobre capital próprio. Um dos responsáveis pelo documento é o secretário do Tesouro Mansueto Almeida, especialista em contas públicas que assumiu o cargo ainda no governo Temer e foi mantido pelo novo governo.
No tópico das desonerações tributárias, o “Panorama Fiscal Brasileiro” listou duas alternativas para se obter uma redução de 10% nesse tipo de benefício:
1) Um corte linear em todos os cerca de 80 programas de gasto tributário, com redução de 10% em cada um. A economia estimada seria de R$ 30,6 bilhões em 2019 e R$ 136,1 bilhões no acumulado de quatro anos; ou
2) Uma redução focada em cinco programas específicos. Eles foram escolhidos conforme seu tamanho (a renúncia fiscal, em bilhões de reais), a distorção que causam no sistema tributário e sua regressividade (ou seja, em que medida beneficiam mais pessoas de renda alta que pessoas pobres).
Ao promover um corte linear, o governo afeta todos os beneficiários de renúncias fiscais, o que dá menos margem a acusações de que estaria favorecendo ou prejudicando este ou aquele grupo em particular. Por outro lado, alterar a legislação de aproximadamente 80 programas, calibrando-os de forma a promover um corte de 10% em cada um, é tarefa complexa.
CONFIRA:A evolução das desonerações desde o governo Lula até a gestão Bolsonaro
Caso escolha os cortes em programas específicos, o governo terá pela frente uma tarefa mais simples do ponto de vista técnico. Mas não do ponto de vista político, pois enfrentará a resistência de quem for prejudicado.
A equipe do antecessor de Bolsonaro listou os cinco benefícios a seguir. Uma das sugestões – justamente a de maior impacto – deve ser ignorada pelo governo e, em vez de acabar, a renúncia fiscal deve até aumentar. Entre as demais opções, há cortes que certamente despertariam polêmica, envolvendo o Simples e o MEI e também deduções do Imposto de Renda da Pessoa Física.
QUATRO BENEFÍCIOS QUE PODEM DIMINUIR
Os técnicos do Ministério da Fazenda estimaram o impacto de uma elevação de alíquotas aplicadas às diversas atividades e faixas de faturamento desses dois programas, de forma a reduzir em 15% a renúncia fiscal. O impacto, para os cofres do governo, seria de R$ 12,3 bilhões em 2019 e de R$ 58 bilhões no acumulado do período 2019-2022.
O relatório aponta que esses regimes permitem a entrada de empresas relativamente grandes, em comparação a programas similares de outros países, e têm alto nível de “incumprimento tributário”, entre outros problemas.
Segundo o documento, a dedução de despesas médicas da base tributável do IR está concentrada entre contribuintes de maior renda e é majoritariamente destinada a subsidiar o pagamento de planos de saúde. A proposta é criar um teto para a dedução desse tipo de despesa, como já existe para os gastos com educação. Uma redução de 15% nesse benefício fiscal levaria a um aumento de arrecadação de R$ 1,97 bilhões no primeiro ano e quase R$ 9 bilhões no acumulado de quatro anos.
Aposentados com mais de 65 anos ou que tenham se aposentado em decorrência de acidente ou moléstia grave têm a faixa de isenção de Imposto de Renda duplicada. Na avaliação da equipe econômica de Temer, o benefício é regressivo – ou seja, assim como ocorre com a dedução das despesas médicas, ele favorece principalmente pessoas de renda mais alta. Uma redução de 10% nessa renúncia elevaria a receita federal em R$ 1,93 bilhão no primeiro ano de aplicação e em R$ 8,6 bilhões em quatro anos.
Ampliada ao longo do tempo, a desoneração de produtos da cesta básica acabou incluindo produtos que são mais relacionados ao consumo de famílias de renda média e alta – muito embora o programa, em princípio, fosse declaradamente destinado aos mais pobres. A proposta é eliminar da lista itens incluídos nas últimas desonerações e que tenham pouca representatividade nas cestas de consumo das famílias de baixa renda. O impacto esperado é de R$ 2,7 bilhões em um ano e R$ 12 bilhões em quatro anos.
UM BENEFÍCIO QUE DEVE CRESCER
A desoneração da folha de pagamento foi criada no governo de Dilma Rousseff. Inicialmente, alguns setores podiam trocar a contribuição previdenciária por um tributo sobre o faturamento. O benefício, que em 2012 significou renúncia fiscal de R$ 3,6 bilhões, foi sendo estendido para mais e mais atividades econômicas até chegar a R$ 25,2 bilhões em 2015, no auge. Foi sendo revertido aos poucos, mas ainda existe para alguns setores e deve ser eliminado gradualmente até a extinção, em 2021.
A equipe econômica de Temer avaliou que essa política “não foi capaz de alcançar os objetivos propostos, em particular o aumento de emprego” e por isso sugeriu que fosse eliminada já em 2019, o que geraria um ganho de arrecadação estimado em R$ 13,5 bilhões neste ano e de R$ 60 bilhões até 2022.
No entanto, o secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, é um entusiasta da desoneração. Para ele, o problema da política implementada por Dilma Rousseff é que era válida para apenas alguns setores; o ideal, segundo ele, é estender o benefício a todas as atividades. “O que nós estamos trabalhando é a questão da desoneração de maneira universal, ampla, sistêmica. O impacto que isso terá na economia será muito maior”, disse Cintra semanas atrás.
Para compensar a perda de arrecadação, o secretário avisou que o governo estuda cobrar tributo sobre o faturamento das empresas ou então sobre outras bases, inclusive com impostos indiretos, mas sem elevar a carga tributária nessa troca.