O pagamento de benefícios como o seguro-desemprego e o abono salarial é insustentável e terá de passar por mudanças. O Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), fonte desses recursos, não está fechando as contas.
Um especialista no assunto avalia que uma solução possível seria acabar com o fundo, que é custeado por contribuições pagas pelas empresas, e criar contas individuais para cada trabalhador, para serem sacadas parcialmente em caso de demissão. Assim, o controle e o uso desses valores, que hoje são feitos pelo governo e com grande dose de política, passariam a ser do trabalhador.
Quando o FAT não consegue fechar as contas, o Tesouro Nacional precisa injetar recursos no Fundo. Mas, como a crise derrubou a arrecadação, o governo federal está em regime de contenção, cortando recursos dos ministérios e reduzindo investimentos. Neste ano, segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, a queda dos investimentos é de cerca de 50% em relação ao ano passado.
O aumento do desemprego nos últimos anos piorou a situação do FAT. Entre os exercícios de 2016 e 2017, as despesas do fundo aumentaram 5,7%, custando R$ 75,1 bilhões para pagar o seguro-desemprego e o abono, principalmente, de acordo com boletim do FAT do 1.º semestre deste ano. O governo admite que o Fundo precisará receber novos aportes de recursos do Tesouro, que já injetou R$ 10,7 bilhões neste ano para pagamento dos benefícios.
“As projeções indicam que, preservadas as condições atuais, a cada ano, para manter o equilíbrio, o FAT necessitará de aportes do Tesouro Nacional ou utilizar recursos do Patrimônio do Fundo. Isso porque as receitas primárias do FAT têm se mostrado, a cada ano, insuficientes para o pagamento de suas principais obrigações, com seguro-desemprego e abono salarial”, afirmam os técnicos do Ministério no boletim.
Em cálculo do Ministério do Trabalho (MTE) para o Orçamento da União, este ano faltarão R$ 16 bilhões. Em 2018 e 2019 serão necessários aportes de R$ 17 bilhões e R$ 18,4 bilhões, respectivamente. Em 2020, o rombo chegará a R$ 21,6 bilhões.
Apesar do rombo, o MTE afirma que “no momento não constam da pauta de reuniões propostas de mudanças” sobre os usos e recursos do FAT e reforçou que essas mudanças podem ser pedidas por outros agentes do governo, em projetos de lei. O órgão também afirmou que não há estudo sobre mudanças no processo de fiscalização do fundo.
Para onde foi o dinheiro do Fundo?
Um dos culpados pela falta de dinheiro no FAT é a redução de impostos para setores da economia. A principal fonte de recursos para esse fundo é a arrecadação do PIS/PASEP. Durante o governo petista (de 2003 a 2016), a política de benefícios e a destinação de parte desses impostos para outras áreas que não o amparo ao trabalhador retirou R$ 194,5 bilhões do fundo, sem considerar juros e inflação. O Tesouro Nacional teve de injetar R$ 34,5 bilhões no fundo entre 2014 e 2016.
No começo de julho, circularam notícias de que o governo federal estudava acabar com o seguro-desemprego ou modificar as regras de pagamento para economizar recursos, mas as notícias não se confirmaram.
O professor da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo e coordenador do projeto Salariômetro da FIPE, Hélio Zylberstajn, avalia que a cultura brasileira nas relações de trabalho incentiva a alta rotatividade dos trabalhadores, o que leva a uma conta muito alta no pagamento do seguro-desemprego. Dados de relatório do Ministério do Trabalho mostram que a rotatividade no emprego é alta no Brasil. Em 2015, a rotatividade alcançou 40,9% e já chegou a atingir 43,1% em 2014.
Proposta: contas individuais
Por outro lado, mudanças na forma de arrecadação e pagamento desse benefício deveriam ser empreendidas. Uma proposta defendida por Zylberstajn seria a unificação do seguro-desemprego com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Assim, os recursos seriam todos depositados em contas individuais pertencentes a cada trabalhador, como já acontece com o FGTS.
Hoje as empresas contribuem para o PIS/Pasep e parte da arrecadação desse tributo é encaminhada ao FAT, que por sua vez paga o seguro-desemprego ao trabalhador que é demitido. Ou seja, na prática o dinheiro do FAT não pertence ao trabalhador: ele só o recebe, na forma de seguro-desemprego, se for dispensado, e por um tempo determinado. O FGTS é diferente: é recolhido pelo empregador em uma conta vinculada a cada emprego do trabalhador. Nesse caso, o dinheiro pertence ao funcionário.
“[Com a unificação] o trabalhador pode deixar o valor acumulado lá ou aplicar num plano de aposentadoria”, propõe Zylbertajn. “Se ele for demitido, ele usa o valor. Mas quando ele arrumar um novo emprego, ele vai voltar a depositar naquela conta, para acertar aquele saldo. Com essa regra, tiramos o incentivo [à saída constante de diferentes empregos apenas com o objetivo de receber o seguro]. Se ele ficar desempregado, vai querer logo arrumar outro emprego. E de quebra, criamos um mercado de previdência.”
BNDES concede empréstimos com dinheiro do FAT
Outro problema da atual política de gestão do FAT é o uso dos recursos depositados no Fundo para conceder crédito via BNDES. O valor vai para linhas destinadas principalmente às micro e pequenas empresas, o que é salutar e garante remuneração para o dinheiro. Porém, esse dinheiro é concedido com taxas menores que as praticadas por bancos privados, o que limita o retorno ao FAT.
Isso porque o BNDES cobra em seus financiamentos uma taxa de juros menor do que a taxa básica da economia, a Selic. A Taxa de Juros de Longo Prazo, usada pelo BNDES, está em 7% ao ano, enquanto a Selic está em 9,25%.
“A gente não sabe, não sente, mas cada vez que o BNDES concede um financiamento ele está se financiando com taxas altas e se remunerando com uma taxa menor. Tem um diferencial de taxa que nós pagamos sem saber”, afirmou Zylberstajn.
O governo está atacando esse problema. Em março deste ano foi publicada a medida provisória (MP) 777, que cria a Taxa de Longo Prazo (TLP) para substituir a TJLP. A nova taxa será mais próxima à taxa utilizada pelo mercado financeiro e que responde às variações da inflação. A MP está em tramitação no Congresso Nacional e, segundo o texto, a nova taxa será aplicada nos empréstimos que forem concedidos a partir de 2018, com período de cinco anos de adaptação entre as duas taxas.
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