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Silvia Nobre nasceu na aldeia da etnia Waiãpi, no Amapá, na fronteira com a Guiana Francesa . Aos 3 anos, foi adotada por uma família de Macapá. | Reprodução/Facebook
Silvia Nobre nasceu na aldeia da etnia Waiãpi, no Amapá, na fronteira com a Guiana Francesa . Aos 3 anos, foi adotada por uma família de Macapá.| Foto: Reprodução/Facebook

Moradora de rua, vendedora de livros, atriz, atleta, fisioterapeuta e primeira índia militar. Todos esses rótulos passaram pela vida de Silvia Nobre Waiãpi, 42 anos, uma das quatro mulheres entre os 28 homens que integram a equipe de transição do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) até agora.

O nome da indígena – que nasceu na aldeia da etnia Waiãpi, no Amapá, na fronteira com a Guiana Francesa – foi anunciado nesta quarta-feira (6). Não há confirmação se ela terá cargo remunerado ou se será colaboradora.

Silvia Nobre foi adotada aos 3 anos por uma família de Macapá e começou a estudar com 7. “Eu passei a minha infância inteira puxando a saia das professoras e pedindo, por favor, para eu hastear aquela bandeira [do Brasil], mas ninguém deixava. Só as crianças brancas e não índias podiam”, contou, chorando, em uma entrevista a Jô Soares em 2011.

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“Eu prometi para mim mesma que, acontecesse o que acontecesse, o meu país um dia iria se orgulhar de mim”, disse. Segundo ela, foi isso que a impediu de se envolver em “coisas erradas” nos dois meses em que viveu nas ruas do Rio de Janeiro mais tarde.

Aos 14 anos, ela deixou na aldeia a filha que teve com 13 (o que é comum na sua cultura) e fugiu para a capital fluminense em busca de estudo. Sem casa nem dinheiro, vendeu a única coisa de valor que tinha nas mãos, uma pedra que acreditava ser mágica, para conseguir comer por alguns dias.

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Logo depois conheceu um ambulante, cuja sobrinha a abrigou em sua casa. De porta em porta, passou a vender seus livros velhos, o que continuou fazendo quando arrumou um emprego na editora Círculo do Livro. Foi incentivada a estudar artes, começou a declamar poesias e ganhou prêmios por elas. Nesse meio tempo teve mais um filho aos 15 anos e uma filha aos 17 – hoje tem também uma neta.

Um trabalho como fisioterapeuta com um grupo de fuzileiros navais levou Silvia ao mundo militar: hoje ela é oficial do Exército.Foto: Divulgação/Exército

Ingressou num grupo de atores, se formou em artes cênicas com 24 anos e trabalhou na TV Globo, como aderecista do departamento de figurino, preparadora de elenco da minissérie “A Muralha” e pesquisadora de texto na novela “Uga Uga”, ambas estreadas em 2000. As funções lhe renderam papéis como atriz.

O principal veio mais de uma década depois, como a empregada doméstica Domingas na minissérie “Dois Irmãos”, exibida em 2015. Na obra inspirada no livro homônimo de Milton Hatoum, contracenou com o protagonista Cauã Reymond, que interpretava os gêmeos Omar e Yaqub.

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“Procuravam uma indígena pra fazer teste e não encontravam. Aí o produtor de elenco lembrou da minha entrevista [com Jô Soares]. Quando me chamou para conversar é que ele descobriu que já havia feito outros trabalhos na casa”, contou ela ao UOL naquele ano.

Na época dos primeiros trabalhos na televisão, ela descobriu mais uma paixão, a corrida. Mas não do melhor jeito possível. Após quase ser estuprada na rua enquanto saía para caminhar, pensou: “E se um dia eu precisar correr de alguém?”. Dali passou a atleta profissional de atletismo pelo Vasco da Gama e acabou ganhando uma bolsa para estudar fisioterapia na Unisuam (Centro Universitário Augusto Motta), no Rio.

Após várias especializações, um trabalho como fisioterapeuta com um grupo de fuzileiros navais a levou ao mundo militar. Tentou entrar para as Forças Armadas pela primeira vez em 2009, mas não conseguiu. Prestou concurso de novo no ano seguinte e passou para Marinha e Exército. Escolheu a segunda opção porque “sua pele é verde oliva”, tornando-se a primeira mulher indígena militar.

Desde 2016, Silvia Nobre é chefe do serviço de medicina física e reabilitação do Hospital Central do Exército, em Benfica, na zona norte do Rio de Janeiro, atividade que exalta nas redes sociais, assim como a cultura e as reivindicações indígenas. Periodicamente, ela retorna à sua aldeia na Amazônia.

A Folha de S.Paulo tentou entrevistá-la, mas aguarda uma resposta do Comando Militar do Leste.

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