O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é comparado por um de seus pares – Chico Alencar (PSol-RJ) – ao centroavante Quarentinha, do seu glorioso Botafogo. Craque dos anos 50 e 60, e maior artilheiro da história do clube, Quarentinha não era de se movimentar muito, mais paradão na área. Mas tinha a servi-lo, do lado direito, Garrincha, e do lado esquerdo, Zagallo. A bola chegava a ele fácil. A política imitou o futebol. Maia não precisou de muito esforço para chegar onde chegou. Ou ainda pode chegar: a Presidência da República, caso Michel Temer seja afastado do cargo para ser processado no Supremo Tribunal Federal (STF). Botafogo, em tempo, é a alcunha do presidente da Câmara na lista da Odebrecht.
O presidente da Câmara está longe de ser um craque de voto. Entre os 46 deputados do Rio eleitos em 2014, foi o longínquo 29.º mais votado, com 53.167 votos – 8,7 vezes menos que o campeão naquele pleito, Jair Bolsonaro, que faturou 464.572 sufrágios. A herança política do pai - o ex-prefeito César Maia, do Rio -–aliada a um pouco de sorte e destino - aqui lembra Itamar Franco – explicam a trajetória de Maia. Nunca teve um brilho próprio, não tem carisma, mas tem tradição oligárquica e berço político.
“O cavalinho passa sempre encilhado na frente dele, muitas vezes na vida”, diz Chico Alencar.
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Cacoetes
Cena rara é ver o presidente da Câmara sorrindo. Uma constatação fácil para quem acompanha o dia a dia na Câmara. Ele tem o cacoete de torcer o pescoço e de acertar o penteado com a mão direita muitas vezes durante uma simples entrevista. Sobre eles, os amigos dizem se tratar de um político discreto, leal, confiável e de não ter duas palavras.
Maia já foi líder da bancada do antigo PFL e foi sob sua presidência que o partido mudou de nome e passou a se chamar Democratas, em 2007. Mas sempre esteve na sombra e era um tanto apagado, até a chegada de Eduardo Cunha no comando da Câmara, em 2015. Esse é o defeito que os amigos evitam. Maia foi muito próximo de Cunha e chegou a discursar em sua defesa quando o parceiro já respondia a processo no Conselho de Ética. Numa manobra, Cunha tirou Marcelo Castro (PMDB-PI) da relatoria da reforma política e a cedeu a Maia, que ganhou os holofotes e, a partir dessa missão, ganhou visibilidade e força para virar presidente da Casa.
Proximidade com os comunistas
Uma estranha e nada ideológica proximidade com a esquerda marca os passos de Maia. Mais com o PCdoB do que com o PT, que não deve apoiá-lo numa eventual eleição indireta. Mas os comunistas estarão juntos e vão oferecer até o vice do democrata. Está praticamente batido o martelo que será o ex-ministro Aldo Rebelo.
[Rodrigo Maia] tem consciência do momento e entende que a radicalização não leva a nada. Converso com ele e digo que essa história de Presidência da República, como se diz, é uma missão e um destino
O presidente da Câmara tem poucos amigos da chamada “cozinha”, mais próximos. Um deles é Orlando Silva (PCdoB-SP). Interlocutor, conselheiro e cotado para voltar a ser ministro do Esporte numa gestão Rodrigo Maia no Planalto. Há uma reciprocidade. Quando líder do PFL, Maia levou seu partido a apoiar Aldo na sua tentativa de reeleição em 2007, mas Arlindo Chinaglia (PT-SP) venceu.
“É um amigo, um conciliador”, diz Orlando Silva , que conversa com frequência com o presidente da Câmara. “Tem consciência do momento e entende que a radicalização não leva a nada. Converso com ele e digo que essa história de Presidência da República, como se diz, é uma missão e um destino. Pelo desenho que temos aí, pode ser oferecida a ele. Tem capacidade de pactuar. É defensor de uma economia de mercado sem fechar os olhos para o social. É um opositor [dos partidos de esquerda] moderado e tem uma visão política que vai além desse Fla-Flu que estamos vendo aí.”
Direitista moderado, não “raivoso”
Verdade que Maia é um moderado. Não um político de direita raivoso, que deseje o fim do PT. Quando assumiu o lugar de Cunha, no discurso de posse, chegou a citar o ex-deputado e presidente do PT José Genoino, atingido em cheio pelo mensalão, como uma de suas referências políticas quando mais jovem.
No seu voto a favor de impeachment de Dilma, na geleia geral que foi aquela sessão de 17 de abril do ano passado, até que não pesou a mão. Disse: “Caminhando com a história hoje. Pela minha família, mas principalmente pelo meu pai, César Maia, que foi atropelado pelo governo do PT, que rasga a Constituição no Rio e aqui”.
A citação no caso Odebrecht
Rodrigo Maia está no seu quinto mandato de deputado federal. Sempre no PFL, agora DEM, com uma rápida passagem pelo PTB. Está encalacrado também no STF por causa das denúncias da Odebrecht. Se virar presidente da República, suas pendências no STF serão suspensas já que é investigado por crimes ocorridos no mandato parlamentar e não durante eventual atuação como chefe do Executivo.
Maia aparece nas delações da Odebrecht por suposta prática de caixa dois nas eleições de 2008, 2010 e 2012. Teria recebido, segundo um ex-dirigente da empreiteira, R$ 600 mil por, entre outras razões, ter atuado numa medida provisória de interesse desses empresários, o que ele nega.
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SUS Animal, gordura trans e filtro solar
Na lista de projetos de sua autoria, apresentados ao longo desses anos, chamam a atenção alguns temas a princípio estranhos para um liberal, ligado à economia de mercado e com preocupações outras. Ele defende, por exemplo, que seja criado no país um Sistema Único de Saúde (SUS) para os animais. E justifica com o argumento de que os maus-tratos a esses bichos gerou um “holocausto da vida animal” no Brasil. A proposta está parada nas comissões.
“Urge a necessidade do Poder Público federal determinar um amplo sistema público de atendimento a saúde e bem estar animal, de forma a minimizar o sofrimento de milhares de animais e confortar os sentimentos de grande parte da população brasileira carente de assistência médica veterinária para seus animais de estimação, resgatados nas ruas ou da ação de traficantes de animais silvestres”, explicou Maia na sua proposta.
A saúde do cidadão também o preocupa. Maia quer controlar o excesso do consumo de gordura “trans” e restringir sua comercialização. “Estudos recentes sobre os possíveis efeitos das gorduras trans no organismo mostraram a necessidade de prover informações para que o consumidor tenha a opção de escolher os alimentos que deseja consumir”, explica.
O excesso de sol na pele das pessoas é outro incômodo para Maia. Ele defende que seja incluído na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) a obrigatoriedade de as empresas fornecerem filtro solar para seus funcionários que trabalham expostos ao sol. E de no mínimo FPS 30.
“Falta na CLT previsão de fornecimento pelos empregadores de material de proteção solar capaz de garantir a saúde dos trabalhadores brasileiros que exercem funções laborais em exposição à luz solar. Há no mercado diversas opções de protetores contra a radiação solar. Desde vestimentas até cremes e loções que bloqueiam a ação danosa provocada pelo sol”.
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