Sindicatos das principais centrais sindicais do país estão aprovando em assembleias a manutenção da cobrança do imposto sindical ou a criação de novas contribuições antes mesmo de o governo Michel Temer editar medida provisória para regulamentar a matéria. Os sindicatos querem arrecadar o dinheiro de todos os trabalhadores e não apenas de seus sócios, tanto no caso da manutenção do imposto quanto na das novas contribuições – chamadas de assistencial ou negocial.
Essa é a estratégia montada para driblar o fim da obrigatoriedade do pagamento do imposto, previsto na reforma trabalhista que entra em vigor em 11 de novembro. Ela deve enfrentar resistência na Justiça. Para o Ministério Público do Trabalho, é ilegal. Os sindicatos dos metalúrgicos de São Paulo (Força Sindical), dos metalúrgicos de São Leopoldo (RS), filiado à Central Única dos Trabalhadores (CUT), e o dos têxteis de Guarulhos, da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), foram os primeiros a adotá-la.
O secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, afirmou que a contribuição decidida pela categoria em 15 de setembro representa 1% do valor da folha de pagamento do que o trabalhador ganha em um ano, ou seja, o valor de 3,5 dias trabalhados – maior, portanto, do que o antigo imposto sindical, que equivalia a um dia de salário do funcionário.
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Quintino Severo, secretário de administração da CUT, disse que o exemplo do sindicato de São Leopoldo (15 mil trabalhadores na base) deve ser seguido por outros da central. “Mas nosso primeiro objetivo é aumentar a filiação.” Segundo ele, o fim do imposto afeta em média 30% da receita dos sindicatos do setor privado ligados à CUT.
No caso do Sindivestuário de Guarulhos, a assembleia feita dia 9 decidiu manter o antigo imposto sob a alegação de que a reforma institui a prevalência do negociado sobre o legislado. “Quando a lei diz que é preciso prévia e expressa autorização, não quer dizer que ela deve ser individual ou por escrito. Se toda negociação é deliberada em assembleia, então essa autorização se dá na assembleia”, disse o secretário-geral da CSB, Álvaro Egea. A assembleia dos têxteis contou, segundo ele, com uma centena de trabalhadores – a base do sindicato tem 10 mil.
Crise
Os sindicalistas alegam que, sem o dinheiro, haverá uma quebradeira das entidades. “A média de sindicalização no país varia de 7% a 30% (de cada categoria). Só o dinheiro dos sócios não sustenta as entidades. Tirar a contribuição é retirar o maior dinheiro de muitos sindicatos. Vai haver muita fusão”, disse Antonio Neto, presidente da CSB.
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A União Geral dos Trabalhadores (UGT) vai seguir o caminho da Força Sindical. Seu presidente, Ricardo Patah, disse ao Estado que a central ainda luta pela medida provisória em razão da segurança jurídica, mas vai orientar seus sindicatos a adotar a contribuição negocial. Já o presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adílson Araújo, afirmou que deve propor a manutenção do imposto. “Se é aprovado em assembleia, no meu modesto entendimento, terá força de lei.”
Ubiraci Oliveira, presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), disse que, antes de aprovar em assembleia a cobrança do imposto, orientará os sindicatos a manter nas convenções coletivas os direitos acordados na última negociação.
Luiz Gonçalves, da Nova Central Sindical, é uma exceção. Ele disse que a central vai esperar pela MP. José Maria de Almeida, coordenador da CSP-Conlutas, disse que a central é contrária ao imposto. Para ele, os sindicatos devem se sustentar com a contribuição espontânea dos trabalhadores. “Se não conseguem, não devem sobreviver.” O secretário-geral da Intersindical, Edson Carneiro Índio, afirmou que a central ainda não se definiu.
Ministério Público diz que cobrança é ilegal
O Ministério Público do Trabalho (MPT) deve entrar com ações coletivas para impedir que os sindicatos descontem as novas contribuições de trabalhadores, sócios ou não das entidades. Para o procurador do trabalho Henrique Correia, esse posicionamento das centrais “é ilegal de acordo com a reforma recém-aprovada”. “Ela (a reforma trabalhista) estabelece que a pessoa que não é filiada e não autorizou não pode ser descontada.”
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Segundo ele, se os sindicatos firmarem convenção prevendo o desconto, ele será ilegal, pois a própria reforma “proíbe isso em seu artigo 661-b”. “Não pode ter negociação sobre os pontos abaixo e entre eles está o de que não pode ser imposta contribuição para quem não é sindicalizado.”
O Supremo Tribunal Federal (STF), segundo Correia, já decidiu proibir o desconto de quem não é filiado em sua Súmula 40 (ela trata da contribuição confederativa). Para Correia tanto faz o nome que se dê à contribuição – assistencial ou negocial –, pois o princípio seria o mesmo. “Para contribuir tem de se dar essa autorização.”
A expectativa do procurador é que a ação dos sindicatos seja contrastada no Judiciário. “Até o STF vai se pronunciar novamente pela ilegalidade e inconstitucionalidade dessas contribuições. Mas, se vier uma nova lei ou uma medida provisória, aí será outro caso.” O procurador afirma ainda que o trabalhador que for descontado a partir de 11 de novembro - quando a reforma entra em vigor - deve procurar o MPT e denunciar. “Eu tenho várias ações púbicas contrárias à contribuição de quem não é filiado. Com certeza o MPT deve entrar com ações coletivas.”
Para a professora de Direito do Trabalho da PUC-SP Fabíola Marques, a estratégia defendida pela maioria das centrais para cobrar a contribuição de todos os trabalhadores é ilegal. De acordo com ela, a autorização exigida pela reforma deve ser pessoal. A assembleia pode decidir somente pela cobrança da contribuição dos associados.
“A legislação foi mal elaborada e tem falhas que os sindicatos e as centrais estão tentando descobrir para retomar as contribuições e permitir, por meio de convenção coletiva, a sua aplicação.” Segundo ela, em muitos casos, isso será possível, mas as novas contribuições só devem ser cobradas dos associados. “Creio que esse será o entendimento do Judiciário.”
Como na assembleia só votam sócios, a contribuição não poderia atingir os demais trabalhadores. “Há quem tenha uma ideia mais restritiva e diga que o negociado só prevalece sobre o legislado para os sócios dos sindicatos, pois só eles votam nas assembleias.”
Já o professor de Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (USP) Otávio Pinto e Silva afirmou que o plano dos sindicatos deve ter respaldo no Judiciário por causa da lei que institui as centrais, em 2008. “A lei das centrais já dizia que a contribuição sindical compulsória vigoraria até que uma lei regulasse uma contribuição negocial vinculada ao exercício da negociação coletiva, que seria aprovada em assembleia da categoria.”
Para ele, como o sindicato representa a categoria e não só os associados, a aprovação na assembleia vincularia a todos. “É claro que essa interpretação fica sujeita a chuvas e trovoadas. Pode haver impugnação individual do trabalhador ou por meio de ação coletiva do MPT”, afirmou. Para, ele o princípio da contribuição vale também para empregadores. “Só que no caso deles, a contribuição seria vinculada ao capital social da empresa.”