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| Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

O raciocínio lembra um pouco o filme Tropa de Elite 2, quando Capitão Nascimento depõe em uma CPI com o objetivo de “detonar o sistema”, mas acaba chegando a uma conclusão frustrante. “O sistema entrega a mão pra salvar o braço”, diz o personagem do ator Wagner Moura nos minutos finais da obra.

A avaliação do nosso sistema político lembra um pouco esse último trecho, segundo o procurador da força-tarefa da Lava Jato, Carlos Fernando Lima. Para ele, o que pode acontecer como reflexo das investigações tocadas por ele e pelos colegas do Ministério Público Federal é o sistema sacrificar os políticos atuais para continuar tão – ou mais – corrupto do que atualmente.

Desde 2014 a Lava Jato está praticamente todos os dias trazendo uma notícia mais estarrecedora que a outra sobre como funciona o sistema político no Brasil. O brasileiro já assistiu os mais bem sucedidos empresários do país sendo presos, já viu malas de dinheiro circulando nas mãos de políticos, já viu cassações por causa de envolvimento em corrupção.

Em compensação, também já viu tentativas de anistia durante a madrugada, desfiguração de medidas de combate à corrupção no plenário do Congresso e outras ações para livrar a classe política da punição iminente.

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O roteiro lembra um pouco Tropa de Elite, mas, muito mais que uma obra de ficção, lembra também outra operação de combate à corrupção que não terminou com final feliz – pelo menos não para os cidadãos que assistiram atônitos os políticos envoltos em esquemas de desvios de dinheiro. A comparação com a Operação Mãos Limpas, que devastou a classe política da Itália na década de 1990, não é inédita. O próprio juiz Sergio Moro já estudou a operação italiana e vem alertando para a possibilidade de o Brasil acabar seguindo o mesmo caminho.

Por lá, a classe política reagiu e acabou tornando mais difícil o combate à corrupção no país. Aprovaram anistia, mudaram as leis e tornaram quase impossível a punição de políticos corruptos. No Brasil, a Lava Jato parece estar provocando o mesmo efeito no Congresso Nacional.

Para Lima, porém, há um detalhe importante que parece estar passando despercebido por deputados e senadores. “O que os atores políticos não percebem é que na Itália, mesmo que a classe política tenha sobrevivido nos seus métodos, os políticos da época não sobreviveram”, diz. Ele cita o exemplo do então primeiro ministro, Bettino Craxi, que acabou morrendo no exílio depois de fugir para escapar da punição.

“Nem sempre as pessoas percebem que a sobrevivência do sistema não é a sobrevivência dos atuais políticos. Porque o sistema sobrevive muitas vezes sacrificando os seus atores por novos atores”, diz Lima. O raciocínio faz sentido, já que a Itália continua com altos níveis de corrupção mesmo depois da Mãos Limpas.

Os mesmos personagens

O procurador do Ministério Público do Paraná Rodrigo Chemim, autor do livro Mãos Limpas e Lava Jato – A corrupção se olha no espelho, tem uma visão um pouco diferente. Segundo o procurador, na Itália os atores políticos implicados na Mãos Limpas acabaram voltando para a política e foram pegos em novos esquemas de corrupção.

“Alguns novos atores políticos surgiram e aqueles velhos atores, de alguma forma ou de outra continuaram na política e depois retornaram, inclusive com novas práticas criminosas”, diz Chemim. O resultado na Itália foi desastroso em termos de eliminação de práticas corruptas sistêmicas. O sistema continua corrupto, talvez mais sofisticado ainda, porque as práticas que eram meio toscas foram ganhando níveis de sofisticação”, completa.

Ele cita três exemplos de políticos que foram presos na Mãos Limpas e retornaram à vida pública. O primeiro político preso, Mario Chiesa, acabou reaparecendo em um escândalo de corrupção em 2014. O mesmo ocorreu com Primo Greganti, ex-tesoureiro do Partido Comunista Italiano, e Gianstefano Carlo Frigerio, que voltou à política usando outro nome. Todos reapareceram em esquemas de corrupção em 2014.

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“Ao invés de se candidatar como Gianstefano Frigerio, como ele sempre fazia, ele mudou a nomenclatura dele para Carlo e engana o povo, de certa forma”, conta Chemim. Ele foi eleito, mas não assumiu o mandato, pois acabou condenado a 6 anos e 8 meses de prisão.

“Ele acabou não sendo preso porque as alterações legislativas transformaram sua pena de prisão em prestação de serviços sociais. E olha que genial o que eles fizeram na Itália. Sabe o que era a pena de prestação de serviços sociais? Era permanecer na política, porque a política foi indicada como atividade socialmente útil. É bizarríssimo, o cara foi punido a permanecer na política”, ressalta o procurador do MP do Paraná.

“Os personagens vão reaparecendo depois em novas práticas de corrupção, fazendo com que o partido mude o nome, mas a prática não mude”, resume Chemim. Para o autor, duas medidas são importantes para que o roteiro não se repita no Brasil: educação e leis mais severas no combate à corrupção.

“Tem duas necessárias e urgentes providências. Uma é investir pesadamente em educação dessa juventude para cidadania, para eles entenderem a importância da cidadania, da democracia. Sem educação não vai mudar a cultura”, explica. “E enquanto isso não se concretiza, porque isso levaria duas gerações para mudar em termos de educação, a gente pensar também em leis que por hora deem conta de efetivar a punição para quem tem desvio de comportamento”, conclui Chemim.

Já Carlos Lima tem uma visão um pouco mais otimista sobre o futuro para o sistema político no Brasil. “Não acredito que haja, por exemplo, espaço na política para o [ex-deputado federal Eduardo] Cunha, mesmo que haja uma anistia”, diz. “Olhando a perspectiva histórica, eu acho que as coisas vão mudar para melhor”, conclui o procurador da Lava Jato.

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