O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (30) que a ausência de revalidação do diploma e outras medidas do programa Mais Médicos, do governo federal, são constitucionais. Por 6 votos a 2, os ministros mantiveram as regras do programa, criado em 2013 na gestão da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) para ampliar o número de médicos no interior do país.
O caso foi levado ao Supremo por entidades como a Associação Médica Brasileira (AMB) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores Universitários Regulamentados (CNTU), em ações que questionam pontos como a dispensa da revalidação do diploma de médicos estrangeiros, a falta de comprovação de conhecimento da língua portuguesa, o modelo de contratação por meio de bolsas e o salário menor pago aos médicos cubanos – uma vez que parte é repassada ao governo de Cuba.
Pelas regras do Mais Médicos, profissionais sem diploma revalidado só podem atuar nas unidades básicas de saúde vinculadas ao programa “nos primeiros três anos”, como “intercambistas”. A renovação por igual período só pode ser feita caso esses profissionais tenham o diploma revalidado e o aval de gestores nos municípios.
Leia também: Para pagar aposentado, estados gastam menos com servidor da ativa
Hoje, 18.240 médicos atuam no programa – destes, 45% são brasileiros e 47% são cubanos, vindos ao Brasil por meio de cooperação com a Opas, a Organização Pan-Americana de Saúde. Os demais são intercambistas estrangeiros.
Julgamento
Para o ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso, esses pontos não possuem base legal. Seu voto foi seguido pela ministra Rosa Weber. Segundo ele, as exigências maiores para um médico brasileiro violam o princípio da igualdade, além de ser um risco para o paciente não estar com profissional qualificado.
No caso dos salários dos cubanos, disse Marco Aurélio, “a carência de médicos não pode servir de justificativa para o comprometimento dos direitos fundamentais”.
No entanto, a maioria dos ministros entendeu que essa dispensa não é inconstitucional e que a diferença na remuneração dos médicos cubanos não fere a isonomia.
Alexandre de Moraes abriu a divergência e foi seguido por Edson Fachin, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cármen Lúcia. “Quem se inscreve sabe as condições da bolsa”, disse Moraes, que destacou o papel da Opas, que recruta os cubanos.
Os ministros Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli não participaram do julgamento.
Questionamentos
O coordenador jurídico do Conselho Federal de Medicina (CFM), José Alejandro Bullon Silva, questionou a abertura à contratação de médicos estrangeiros sem a exigência de diploma revalidado no país, o que contraria as regras nacionais. “Estamos criando dois tipos de medicina: a de quem pode pagar e exigir médico com diploma revalidado e a de quem não pode”, afirma.
Leia também: Diário Oficial da União deixa de ter versão impressa após 155 anos
Para Bullon, o programa também enfrenta falhas em outros pontos, como a baixa supervisão do trabalho dos profissionais estrangeiros, por exemplo. “Supervisores e tutores estão à distância de até 32 quilômetros dos médicos. Do ponto de vista prático, essa supervisão não existe”, afirma. “Conceitualmente, essa lei é linda e sem reparos, mas do ponto de vista fático isso não acontece.”
Em defesa do programa, a advogada-geral da União, Grace Mendonça, afirma que o Mais Médicos foi criado para tentar suprir a falta de médicos em vários municípios e distritos indígenas no país. “Alguns municípios não tinham sequer o parâmetro mínimo [de médicos por habitantes]. O que se fez foi considerar que se estava diante de um quadro sério e grave”, avalia.
Mendonça nega que haja precarização do trabalho e diz que o governo procurou dar segurança jurídica ao processo, aceitando somente médicos de países com proporção maior de profissionais em comparação ao Brasil. “É um programa aceito por toda a população brasileira. Municípios que não tinham presença do médico hoje fazem uso dos serviços”, diz.