No mesmo dia em que assumiu a presidência da República, em 12 de maio de 2016, Michel Temer assinou uma medida provisória que reduzia o número de ministérios e órgãos equivalentes de 32 para 23. O tempo passou e Temer, atendendo aos interesses da base e remanejando cargos e funções aqui e ali, chegou à marca de 28 ministérios. E está prestes a editar uma MP para criar o 29º, o Ministério da Segurança Pública. Uma medida tão ineficaz quanto a intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro e todas as participações anteriores das Forças Armadas no estado.
A dez meses do aguardado fim do governo, o novo ministério nada fará pela segurança dos brasileiros. Servirá apenas para acomodar interesses, em especial os da bancada da bala, que há tempos clama por um ministério para chamar de seu, e tirar o foco do naufrágio da reforma da Previdência e da crise interna na Polícia Federal, causada por declarações desastrosas de seu próprio diretor-geral. O problema na PF pode até se agravar com a canetada de Temer, porque delegados da corporação não gostaram da ideia de sair da alçada do Ministério da Justiça.
Pior: o presidente pensa em fazer do “Ministério da Bala” uma pasta extraordinária, com duração determinada. Tentar resolver na caneta e a toque de caixa um problema tão complexo, que nos assombra há décadas, só reforça o caráter oportunista da iniciativa. O caos pode até aumentar, porque ações em andamento serão comprometidas durante a transição rumo ao novo ministério, e mais tarde novamente prejudicadas, quando ele for extinto.
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A nova pasta vai absorver várias funções que hoje são do Ministério da Justiça e Segurança Pública, como o controle das polícias e penitenciárias federais. Exceção feita ao uso da Força Nacional em casos pontuais, o ministério não atuará na linha de frente do combate ao crime, que é tarefa das polícias militares e civis administradas pelas 27 unidades da federação, boa parte delas com dificuldade para pagar despesas cotidianas. Não se sabe o que a nova pasta fará para ajudá-las sem violar o pacto federativo. Certo é que a situação financeira da União está longe de ser confortável. Dinheiro novo, só se for subtraído de outras áreas.
Para quê, então, criar um ministério que fará basicamente o mesmo que o atual, com as mesmas e conhecidas limitações? O deputado Alberto Fraga (DEM-DF), coronel da reserva da Polícia Militar e um dos membros mais atuantes da bancada da bala, tentou explicar. “Eles vão ter que fazer alguma coisa. É necessário que se faça alguma coisa. Não tem como permanecer do jeito que está”, disse ele em entrevista à rádio CBN, referindo-se à escalada da violência no Rio de Janeiro e à falta de dinheiro dos estados para investir na área.
Quer dizer: não dá para ficar assim, então é preciso fazer alguma coisa. E fazer o quê? Sei lá, talvez criar um ministério.
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O tema da segurança tem grande apelo. Diferentes pesquisas o situam entre as principais preocupações da população, senão a maior. Não é por outro motivo que o Congresso costuma aproveitar chacinas, arrastões e crimes que causem comoção nacional para aprovar “pacotes” de leis que supostamente dificultam a vida da bandidagem – e, no fim, resultam em nada.
Se pompa e nomenclatura resolvessem, a situação teria começado a melhorar em fevereiro do ano passado, quando Temer acrescentou o termo Segurança Pública ao nome do Ministério da Justiça, por sugestão do então ministro Alexandre de Moraes. Ou um mês antes, quando o mesmo ministro anunciou um ambicioso Plano Nacional de Segurança, dias depois que quase 90 presos foram mortos em dois presídios da Região Norte.
Moraes classificava o programa de “realista”, mas o atual ministro da Justiça, Torquato Jardim, admite que ele foi lançado no calor dos acontecimentos, em meio à “convulsão” provocada pelas chacinas em presídios. Questionado sobre os avanços tímidos do plano, Jardim disse no mês passado que o governo agora trabalha na definição de uma política com foco no longo prazo.
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Política que, com o novo ministério, não ficará a cargo de Jardim. Que também não será mais chefe do diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, que se mantém no cargo apesar de contrariar o código de ética da corporação e criticar investigações que envolvem o presidente que o nomeou.
Quem será o novo ministro? Segundo o governo, precisa ser alguém que conheça bem o funcionamento das polícias civis e militares. Político, apenas se não for concorrer à reeleição.
Fala-se em José Mariano Beltrame, criador das UPPs no Rio. Mas o histórico recente das escolhas de Temer inspira apreensão. Se nomeou uma condenada pela Justiça Trabalhista para o Ministério do Trabalho, quem colocará na chefia da Segurança Pública?