A troca de comando no Ministério da Justiça, oficializada pelo presidente Michel Temer (PMDB) neste domingo (28), é motivo de preocupação para a Lava Jato. Um dos integrantes da força-tarefa em Curitiba classificou a substituição de Osmar Serraglio como sinal de “desespero” dos políticos alvos das investigações.
Na dança das cadeiras promovida por Temer, Serraglio trocou de lugar com o ex-ministro da Transparência, Torquato Jardim – embora Serraglio não tenha dito publicamente ainda que aceitou o novo posto. A mudança acontece justamente num momento em que as investigações atingem em cheio o próprio presidente da República e pessoas próximas a ele.
Temer foi o principal alvo da colaboração premiada dos executivos da JBS ao ser gravado pelo empresário Joesley Batista dando anuência a uma série de crimes praticados pelo executivo. Agravação deu origem a um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar o presidente, o deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) – ex-assessor especial de Temer – e o senador Aécio Neves (PSDB-MG).
O novo ministro da Justiça já questionou a abertura de inquérito contra Temer no STF. Torquato também defendeu o “reexame” no STF da competência do ministro Edson Fachin como relator do inquérito que investiga o presidente. Fachin é o relator da Lava Jato no Supremo, mas a colaboração da JBS não tem conexão com a Petrobras, o que abre brecha para questionamentos e para tentativas de redistribuir o caso para outro ministro da Corte.
Com a troca de comando no Ministério da Justiça, o presidente tenta recuperar o controle da PF, que é subordinada à pasta. “A PF já está asfixiada, eram nove delegados na Lava Jato, baixaram para quatro. O orçamento caiu 43%. Provavelmente eles querem se imiscuir nas operações também”, disse uma fonte ligada às investigações.
Ainda não há informações sobre uma possível troca no comando da Polícia Federal. O diretor-geral Leandro Daiello está no cargo desde 2011 e sobreviveu a trocas de comando tanto na Presidência da República quanto no Ministério da Justiça.
Em nota, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) se disse “preocupada” com a substituição de Serraglio no Ministério da Justiça. “Os delegados da Policia Federal foram surpreendidos com a notícia da substituição, até mesmo porque desconhecem qualquer proposta de Torquato Jardim para a pasta. É natural que qualquer mudança no comando do Ministério da Justiça gera preocupação e incerteza sobre a possibilidade de interferências no trabalho realizado pela Polícia Federal”, diz a entidade, em nota.
Eleição na PGR
A Polícia Federal pode não ser a única atingida por trocas de comando. Em setembro, o mandato do procurador-geral da República Rodrigo Janot chega ao fim e Temer vai precisar indicar um substituto. A Procuradoria Geral da República é responsável pela investigação de políticos com prerrogativa de foro – como o próprio presidente – a partir de autorização do STF.
Nos bastidores circula a informação de que a escolhida para o cargo de Janot pode ser a subprocuradora Raquel Dodge. No mês passado, ela entrou em conflito com Janot ao sugerir ao Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) que restringisse o trânsito de procuradores no Ministério Público Federal.
Para Janot, a medida impactaria na Operação Lava Jato. De acordo com o proposto por Raquel, haveria uma limitação de 10% no número de procuradores que podem ser cedidos a outras unidades. Atualmente não há limites para realocação de procuradores para equipes exclusivas de investigação, como a Lava Jato.
O novo procurador-geral sairá de uma lista tríplice que será apresentada a Temer com os três mais votados na eleição interna do Ministério Público Federal. Normalmente, o presidente da República respeita a vontade dos procuradores e nomeia o mais votado nas urnas, mas Temer sinalizou há duas semanas que pode não aceitar o primeiro colocado da lista. A eleição acontece em junho. Oito procuradores se inscreveram para disputar a cadeira de Janot.
Cobrança antiga
A cobrança política pelo estabelecimento de freios à Lava Jato não é novidade. Em maio do ano passado, diálogos do delator Sergio Machado com o senador Romero Jucá (PMDB) – hoje líder do governo no Senado – revelavam a preocupação dos políticos em “estancar a sangria” causada pelas investigações.
Na conversa, Machado, que gravou a conversa e entregou à PGR ao firmar acordo de colaboração premiada, diz que solução seria “botar o Michel [Temer], num grande acordo nacional”. O diálogo ocorreu antes da votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados. Em resposta, Jucá concorda com a posição de Machado e completa: “Com o Supremo, com tudo”. “Com tudo, aí parava tudo”, respondeu Machado. “É. Delimitava onde está, pronto”, conclui Jucá.
Recentemente, após a revelação dos áudios gravados por Joesley Batista – sócio da JBS -, Aécio Neves (PSDB) faz uma cobrança parecida. O senador fala em barrar a Lava Jato e anistiar o caixa 2 no Congresso. Em trecho de uma conversa gravada por Joesley, Aécio diz: “Tem que tirar esse cara. Tá doido”, em referência ao ex-ministro da Justiça, Osmar Serraglio.
Aécio também fala na troca de delegados da PF e na anistia ao caixa dois, em uma proposta que tramitava no Congresso.
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