Os núcleos do PSDB enviaram nesta segunda-feira (12) uma carta aberta à direção nacional do partido em que defendem a convocação de um congresso nacional para discutir o futuro da legenda e rever as teses, tendo como pano de fundo a postura em relação governo do presidente eleito Jair Bolsonaro.
A Executiva Nacional do partido se reúne na semana que vem, no dia 22, para organizar um calendário de reuniões e eleições internas, mas o debate sobre o posicionamento dos parlamentares em relação ao futuro governo Bolsonaro já se precipitou. Se vingar, o congresso nacional tucano poderia postergar a discussão para março.
“Indispensável é, a essa altura de nossa história e diante de tamanhos desafios que somos chamados a assumir, a articulação das vozes tucanas de todo o País em um Congresso Nacional. O primeiro passo é a discussão interna. Com serenidade, com responsabilidade. Sem extremismos, sem revanchismos”, diz o texto, ao qual a reportagem teve acesso. “Façamos da esperança nossa obsessão, com mais discussão e menos palanquismo. Foi-se o tempo das respostas fáceis. Foi-se o tempo dos oportunismos.”
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A ideia debatida nos bastidores é realizar o encontro dois meses antes da Convenção Nacional, prevista para maio, quando as decisões do congresso seriam homologadas. A convenção deve marcar a ascensão de um novo grupo de dirigentes no partido, liderado pelos governadores eleitos, entre eles o de São Paulo, João Doria Jr, que defende apoio a Bolsonaro. O ex-governador paulista Geraldo Alckmin, derrotado na disputa presidencial, preside o diretório nacional e tem marcado posição contra Bolsonaro.
A proposta do congresso tem apoio da Juventude Tucana, do Tucanafro e da Diversidade Tucana. O PSDB Mulher, presidido pela deputada não reeleita Yeda Crusius (RS), não assinou. Os segmentos tucanos querem que militantes e dirigentes, com ou sem mandato, tenham o mesmo direito a voto e voz - o que manteria a relevância de parlamentares e dirigentes que não se elegeram.
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A carta aberta alerta para “tentações populistas e nacionalistas” em todo o mundo e diz que, no Brasil, houve um grito de insatisfação nas urnas: “O esgotamento da chamada Nova República precipitou um interregno cheio das mais exóticas e extremas conformações políticas”.
Citando que as urnas foram “impiedosamente claras” com o partido, a carta aberta cobra a autocrítica com participação de dirigentes e militantes, alguns dos quais flagrados em escândalos de corrupção. “Convém olharmos com crítica e equilíbrio para nosso passado”, diz o documento.
Leia a íntegra da carta enviada à direção do PSDB:
Tucanos e tucanas de todo o País,
Não são raras as gerações que passam a totalidade dos seus dias sem jamais sentir a temperatura ardente que derrete e inflama os caminhos, até então certos, de uma comunidade. Avançou a marcha da história, porém, de modo a colocar diante de nós - brasileiros e brasileiras social-democratas - uma realidade nacional sem precedentes que nos obriga a novas e renovadas decisões.
Pelo mundo, ganham espaço as tentações populistas e nacionalistas. Sacrificam seu povo os velhos modelos autoritários, embora possa parecer haver algo de novo nas suas figuras retóricas. Europa, Estados Unidos e América Latina têm seus povos aflitos na busca impaciente pela solução dos problemas que um atribulado século 21 nos impôs, a título de boas-vindas.
No Brasil não é diferente. Após curtos 30 anos de estabilidade democrática, o esgotamento da chamada Nova República precipitou um interregno cheio das mais exóticas e extremas conformações políticas: a sociedade brasileira, nos últimos tempos, foi enfática ao endereçar suas demandas e impressões para a esfera pública. Nas ruas, nas redes, nas urnas, o recado é claro: cada vez menos será tolerado um sistema político que opere pelas suas costas, sem compromisso prioritário com as suas reivindicações e embriagado de cinismo.
Os tempos mudaram, há uma nova ordem do dia. Aos olhos do povo, a estabilidade econômica - já insculpida na cultura nacional que está - é boa e necessária, mas não suficiente. Aos olhos do povo, a periodicidade das eleições, a liberdade partidária - insculpidas na ordem constitucional que estão - são boas e necessárias, mas não suficientes.
Pois foi nas eleições de 2018 que nós ouvimos, de maneira inequívoca, um grito de insatisfação. Um grito, ainda desafinado, mas muito alto, por mais futuro.
Eis que aqui estamos, em 2018, quadros dirigentes e militantes do Partido da Social Democracia Brasileira, obrigados a agir, diante de tais novas - e velhas - questões nacionais.
Não nos enganemos. Nossas decisões, quaisquer que sejam, não são apenas nossas. São elementos centrais do maquinário histórico que forjará um novo tempo político neste país. Nosso papel é, como de costume, de relevância nacional e, como tal, convém olharmos com crítica e equilíbrio para nosso passado, de modo a inspirar nosso futuro.
Somos o PSDB. A conquista de uma democracia à altura do Brasil, símbolo maior da vitória contra o regime militar, foi a pedra fundamental em cima da qual se construiu a mais bem sucedida experiência social-democrata da história brasileira.
Somos o PSDB. A conquista de uma moeda forte à altura do Brasil, ferramenta maior da luta contra a pobreza, foi a bandeira inaugural a partir da qual se construíram as mais bem sucedidas experiências de governo popular e democrático da história do brasileira.
Foi esse PSDB a instituição política nacional que, bem ou mal (ou bem e mal) abrigou e organizou em seu projeto um passado, um presente e um futuro de vitórias do povo brasileiro. Instituição política, sim, mas também, nacional, como não poderia deixar de ser. Um partido político integrante, portanto, de um sistema político brasileiro. Sistema que já há muito existia antes de nós e, por certo, continuará a existir independentemente da nossa sorte.
Teremos, porém, voz e voto no seu necessário processo de evolução democrática. Pelas mãos da sociedade, o país mudou. Em seus costumes, em seu modo de produção, em seu modo de comunicação. Ela tem é pressa. E sonhos. Cresceu e se desenvolveu. Amadureceu e se modernizou. Não pode mais se deixar constranger pela política oficial.
Por certo, o caminho é o da reinvenção.
Sejamos, portanto, autênticos.
Precisamos nos reunir, forjar canais de sensatez, sobretudo entre nós. Para pensar, para debater, para decidir.
Indispensável é, a essa altura de nossa história e diante de tamanhos desafios que somos chamados a assumir, a articulação das vozes tucanas de todo o país em um Congresso Nacional.
Com mandatos e militância, com ideias e exemplos, com experiência e juventude, sempre fomos um partido decisivo nas vitórias do nosso povo. Nossa história democrático-modernizante fez seu caminho até a vitória pelas mãos de homens e mulheres de todo o país e hoje - mais do que nunca - o Brasil precisa de nós. É hora de retomarmos a confiança na nossa capacidade de agir para viabilizar o diálogo qualificado, tão escasso atualmente.
O primeiro passo é a discussão interna. Com serenidade, com responsabilidade. Sem extremismos, sem revanchismos.
Façamos da esperança nossa obsessão, com mais discussão e menos palanquismo. Em um momento tão único da vida nacional, as respostas podem parecer fugidias. Não são. Apenas exigem de nós a inspiração que só os ventos da discussão coletiva conseguem trazer. Conosco, as urnas foram impiedosamente claras.
Foi-se o tempo das respostas fáceis. Foi-se o tempo dos oportunismos.
Neste momento, as terceiras vias de todo o mundo olham para nós, à procura de exemplo, inspiração, direção. Quais são as tarefas da social-democracia brasileira neste período? Só a discussão coletiva nos trará o alívio das respostas.”
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