Após um adiamento de dois meses, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começa na próxima terça-feira (6) a decidir se vai cassar o mandato do presidente Michel Temer (PMDB). A ação de cassação da chapa Dilma-Temer havia entrado na pauta do TSE de 4 em março. Mas os sete ministros da corte decidiram autorizar o depoimento de novas testemunhas e dar mais prazo para as defesas. E só agora vão retomar o julgamento, já sob o impacto das delações dos donos e diretores da JBS.
Temer alega que não participou das irregularidades que teriam sido cometidas na campanha pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e que, portanto, o julgamento dos dois teria de ser desmembrado. Como a defesa de Temer argumenta que não há provas da participação dele, apenas Dilma seria condenada. Essa é a aposta do presidente para manter o cargo.
Mas, no meio do caminho, estouraram as acusações da JBS – que nem mesmo fazem parte do processo, mas que podem afetá-lo de modo indireto. Saiba como essas delações podem influenciar o julgamento e tudo o que pode ocorrer daqui para frente.
1 – Como os ministros do TSE tendem a votar? Eles serão influenciados pela delação da JBS?
É difícil saber. Nenhum dos sete ministros do TSE antecipou o voto. E, portanto, qualquer previsão sempre fica no campo da especulação de bastidor. Muitas vezes com algum embasamento. Mas sempre especulação. Isso porque, além dos fatores técnico-jurídicos envolvidos num julgamento como esse e do histórico de votações dos ministros em casos semelhantes, o ambiente político também costuma influenciar decisões dos tribunais superiores, como o TSE.
Antes da delação dos donos da JBS, havia a expectativa nos bastidores de Brasília de que o julgamento seria favorável a Temer. O Planalto apostava num placar de 5 a 2 a favor da manutenção do presidente no cargo.
As acusações de executivos da JBS de que Temer negociou caixa 2 nas eleições de 2014 nem mesmo fazem parte da ação de cassação da chapa Dilma-Temer. Portanto, não podem ser consideradas na apreciação dos ministros. Mas há uma pressão para que o tribunal “resolva” a crise política provocada pela delação da JBS. Isso poderia virar o jogo contra o presidente. Agora, o governo já estaria contabilizando pelo menos mais um voto contra Temer. E o placar estaria muito apertado para uma vitória dele: 4 a 3. Uma única mudança faria com que Temer fosse cassado.
O presidente do TSE, Gilmar Mendes, tido como voto a favor de Temer, disse na segunda-feira (29) que não é papel da Justiça Eleitoral solucionar a situação do país. “Não cabe ao TSE resolver a crise política. O julgamento será jurídico e judicial”, afirmou. Em março, quando a situação de Temer era melhor, Mendes tinha opinião diferente. “Sempre se considera [a manutenção da estabilidade do país, num julgamento como esse]. Nós não temos juízes de Marte. Não que isso vá presidir o julgamento”, afirmou.
Há outro fator que leva a crer que Mendes vai votar a favor de Temer: os dois têm se reunido com frequência em momentos críticos para o presidente (o ministro alega que se trata apenas de uma relação institucional entre as presidências da República e do TSE).
Do ponto de vista estritamente técnico-jurídico, porém, há precedentes para quem defende que Gilmar Mendes vai votar contra Temer. Ele já decidiu, em três julgamentos anteriores no TSE, contra a tese de desmembrar as responsabilidades e cassar apenas o cabeça da chapa.
O Planalto também teria a expectativa de contar com os votos dos ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira. Napoleão já votou tanto a favor como contra a tese de separação da chapa em ações das quais participou. No caso de maior repercussão – envolvendo o governador do Amazonas, José Melo (Pros), e de seu vice, José Henrique (SD) – separou a chapa. Já Gonzaga, num julgamento semelhante ao de Temer, foi contra a divisão das responsabilidades. Vieira nunca votou num caso como esse.
Já o voto contra Temer tido como mais certeiro é o do relator do processo, Herman Benjamin. A posição de Luiz Fux e Rosa Weber era vista como incógnita pelo Planalto até março. Ao que tudo indica, o governo teria passado a considerar os dois como ministros contrários ao presidente. Fux participou de dois julgamentos semelhantes ao de Temer e Dilma; e nas duas vezes votou pela cassação da chapa. Rosa esteva num único julgamento desse tipo. E votou contra a separação das responsabilidades.
2 – Há chances de novo adiamento do julgamento?
Sim. Mas já foram maiores. O governo esperava que algum ministro pedisse vista logo no início do julgamento, o que iria adiar o começo do julgamento. Dois deles – Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira – foram recém-efetivados nos cargos (antes eram ministros substitutos). Desse modo, poderiam argumentar que ainda não estão a par de todos os detalhes do julgamento. Nos bastidores, corre ainda a informação de que o Planalto esperava que o pedido de vista fosse feito pelo ministro Napoleão Nunes.
Mas, com a delação da JBS, a pressão para que o processo não seja interrompido por um pedido de vista aumentou. Ainda assim, o presidente do TSE, Gilmar Mendes, tentou na segunda-feira (29) minimizar a importância de um possível pedido de vista. “Há muita especulação na mídia se haverá pedido de vista. Se houver pedido de vista, é algo absolutamente normal. Ninguém fará por combinação com esse ou aquele”, disse.
Caso haja pedido de vista, nem mesmo é possível afirmar com certeza quando o julgamento será retomado. Alguns juristas argumentam que o prazo é de 10 dias, prorrogáveis por mais 10, para que o ministro que pediu vista devolva o processo ao plenário da corte. Essa é a regra definida no Código de Processo Civil – que, por analogia, poderia ser usada no julgamento do TSE. Mas há outro entendimento: esses prazos não valem para tribunais superiores. Assim, só será possível saber se haverá a fixação de uma data para a retomada do julgamento quando (e se) houver o pedido de vista.
3 – Quanto tempo o julgamento vai demorar?
É impossível saber. Mas a expectativa dentro do TSE é de que seja um julgamento longo, até mesmo por causa do ineditismo, da sua importância e do tamanho do processo (são mais de 8 mil páginas). Devido à relevância do caso para o futuro do país, a tendência é de que os votos dos sete ministros sejam extensos (para demonstrar seu embasamento jurídico) e que possivelmente sejam lidos na íntegra.
4 – Temer deixa a Presidência imediatamente após o fim do julgamento, caso seja cassado?
Possivelmente não. Há quase 100% de chance de Michel Temer recorrer em caso de derrota no TSE. Enquanto recorre, permanece na Presidência. Apenas uma pressão política muito forte contra Temer, em função da crise política, poderia demovê-lo da ideia de entrar com recursos.
Temer tem, em tese, duas possibilidades de recorrer em caso de derrota: ao próprio TSE, num primeiro momento, e ao Supremo Tribunal Federal (STF), posteriormente. O presidente afirmou em novembro do ano passado que irá recorrer até as últimas instâncias se a Justiça Eleitoral o cassar. Essa intenção teria sido reforçada a aliados nos últimos dias.
Como não há prazo para o julgamento dos recursos, em tese a decisão definitiva pela cassação ou não de Temer pode se arrastar por meses após o fim do julgamento. Segundo interlocutores de Temer, o presidente estima que poderá permanecer pelo menos mais quatro meses no cargo caso seja cassado pelo TSE. Obviamente, a grave crise política pode fazer com que o Judiciário agilize o julgamento dos recursos. Mas a Justiça tem prazos legais que nem mesmo uma crise é capaz de apressar.
5 – Além da cassação, Temer pode sofrer outro tipo de condenação no TSE?
Sim. Se o TSE cassar a chapa Dilma-Temer e entender que o presidente teve participação direta nas irregularidades de campanha, ele perde os direitos políticos por 8 anos. Ou seja, não poderá concorrer em eleições nem votar nesse período.
Mas o TSE pode cassar a chapa e manter os direitos políticos de Temer, se não ficar comprovada sua responsabilidade. Nesse caso, a Justiça Eleitoral entende que ele se beneficiou das irregularidades cometidas por Dilma e, portanto, não pode permanecer no cargo. Mas que não deve ser punido individualmente pelas ilicitudes da antiga companheira de chapa.