Em um acordo assinado nesta quarta-feira (20) na 6ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias de Belo Horizonte (MG), a mineradora Vale se comprometeu a pagar uma indenização em dinheiro a cada um dos moradores do município de Brumadinho (MG) durante um ano, em decorrência do rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão, no dia 25 de janeiro, que deixou 171 mortos e 139 desaparecidos.
A Vale deverá pagar ao longo de 12 meses um salário mínimo mensal (R$ 998) para cada adulto morador de Brumadinho, meio salário mínimo (R$ 499) para cada adolescente e um quarto de salário (R$ 249,50) para cada criança.
Não há previsão de quando os atingidos poderão começar a sacar os valores. O funcionamento dos pagamentos será definido em reunião pelos ministérios públicos de Minas Gerais e Federal e defensorias públicas estadual e da União nos próximos dias. Os pagamentos serão retroativos ao dia do rompimento da barragem.
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O IBGE estima que Brumadinho tinha 39.520 moradores em 2018. O número total dos atendidos, contudo, deve ser ainda maior porque um trecho do acordo prevê também a indenização para “as comunidades que estiverem até um quilômetro do leito do rio Paraopeba desde Brumadinho e demais municípios na calha do rio até a cidade de Pompéu, na represa de Retiro Baixo”.
Ainda não há estimativa dos valores a serem desembolsados. Em um cálculo simples, considerando que metade dos moradores de Brumadinho seja adulta, que é a média brasileira, seriam R$ 18 milhões ao mês, ou R$ 216 milhões ao ano, considerando apenas a população adulta.
A Vale pretendia incluir apenas moradores da região próxima à barragem e das comunidades de Córrego do Feijão e Parque da Cachoeira, na zona rural da cidade.
“A Vale sempre tenta reduzir seus gastos. Eu acredito que ela não está preocupada com as pessoas como a gente gostaria, enquanto instituição pública. Mas entendemos que ela vai enxergar que tem uma responsabilidade social”, disse o promotor André Sperling, do Ministério Público de Minas Gerais.
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Segundo o procurador do Ministério Público Federal Edmundo Dias, o rumo da audiência foi determinado pelo juiz Elton Pupo Nogueira. “A fome tem pressa, a sede tem pressa e essas pessoas não podem esperar pela definição da reparação definitiva, até que a Vale apurasse a sua responsabilidade”, disse Dias a jornalistas.
Na saída da audiência, o diretor jurídico da Vale, Alexandre D’Ambrósio disse que o acordo debatido em torno de Brumadinho é “sem precedentes na história do país”. “O que queríamos era dar uma partida rápida nesse processo. Como eu tenho dito sempre, a Vale quer o mesmo que as autoridades e trabalha para levar a reparação [a essas pessoas]”, afirmou.
O acordo ocorre no âmbito de uma ação judicial com pedido de tutela antecipada movida pelo estado de Minas Gerais que levou à decisão judicial pela indisponibilidade e bloqueio de R$ 1 bilhão da Vale.
O termo de acordo diz que o pagamento aos moradores de Brumadinho é emergencial “e para início das indenizações do dano difuso, individual homogêneo ou indenizações individuais de acordo com o que for decidido ao final do processo”.
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Os desembolsos previstos no acordo também não afetarão valores a serem pagos por danos socioambientais, diz o termo. Por fim, a mineradora disse concordar “com o pagamento de multas administrativas estaduais que totalizam aproximadamente R$ 99 milhões”. Os pagamentos serão feitos à Secretaria Estadual de Meio Ambiente. A Vale disse ainda que desiste dos recursos administrativos nesse processo.
“Vale assassina”, gritam manifestantes
Antes da audiência, moradores das comunidades atingidas em Brumadinho e em outros municípios, além de membros de movimentos sociais, protestaram em frente ao prédio do Tribunal de Justiça. Ao microfone, alguns gritavam “Vale assassina”.
Josiane Soares Santos, 26, estava entre os manifestantes. O pai dela, Martinho Ribas, 60, está entre as 139 pessoas que continuam desaparecidas, segundo a Defesa Civil. Trabalhador de limpeza de uma terceirizada da Vale, a filha acredita que ele estava no refeitório na hora do acidente. “Ele estava com o corpo doendo, disse para a minha mãe que nem queria trabalhar naquele dia, mas foi, porque senão iam descontar o pagamento”, conta ela.
Josiane estava com a mãe quando uma vizinha apareceu avisando que a barragem havia rompido e que eles deveriam sair. Ela viu a lama se aproximar dos fundos da casa, que não foi atingida por estar em uma parte mais alta.
Moradora de Brumadinho há 20 anos e mãe de dois filhos de 4 e 8 anos, ela disse que depois da tragédia não quer mais viver na cidade. Da audiência desta quarta, ela esperava apenas uma resposta para seguir com a vida. “[Meus filhos] perguntam pelo avô. Eu vou mudar de lá. É um lugar tranquilo, muito bom, mas não tem mais como ficar”, disse.
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