Com a proibição de doações empresariais nas eleições, os políticos se mobilizam para viabilizar suas campanhas eleitorais e novas formas de financiamento já serão possíveis em 2018. Para levantar mais recursos, os candidatos poderão receber doações de pessoas físicas em seus sites ou arrecadar recursos de financiamento coletivo via crowdfunding, a chamada “vaquinha virtual”. A ideia consta na proposta de reforma política que está em discussão no Congresso Nacional.
As doações até três salários mínimos não devem ser divulgadas para preservar a privacidade do doador e há previsão de que mesmo doações superiores a esse valor também fiquem ocultas, embora o relator da reforma política tenha informalmente recuado dessa proposta na quinta-feira (17). O texto não traz, no entanto, instruções sobre como fiscalizar esse tipo de financiamento. As doações são limitadas a 10 salários mínimos ou 10% da renda anual do ano anterior ao pleito, o que for menor.
O ministro Gilmar Mendes, membro do Supremo Tribunal Federal e presidente Tribunal Superior Eleitoral, afirmou que essas mudanças poderiam levar a um “laranjal”. A referência é ao uso de laranjas com a falsificação de Cadastros de Pessoas Físicas (CPFs) no financiamento.
“Sabemos que pode haver aquele trabalho de formiguinha, de repetição. O caixa 2 disfarçado, de grupos que podem separar recursos e distribuir para aquilo que a gente já chamou de multiplicação de laranjas, o ‘laranjal’”, afirmou.
O uso de laranjas poderia ocorrer por candidatos ricos que tentariam financiar a própria campanha ou por grupos de poder econômico alto (empresariais ou não) que queiram elevar as chances de um candidato de seu interesse com uma maior arrecadação para campanhas, a exemplo do que aconteceu nas últimas eleições.
Seguro ou não?
Mas até que ponto esses modelos são seguros ou podem ser usados como novos meios de burlar as leis?
O professor da FGV Direito Rio, Michael Mohallem, explica que, embora esse risco exista, os benefícios das novas plataformas de financiamento se sobrepõem a ele. “O medo de se ter laranjas não pode imobilizar a iniciativa. Teria de convencer muita gente a ficar calada e o volume teria de ser grande porque são valores pequenos. Para que esse processo causasse um impacto negativo relevante seria preciso mover muita gente para fazer um estrago”.
Para Mohallem, a fragilidade dessa modalidade não chega ser uma brecha da legislação porque é natural que próximo das eleições a Justiça Eleitoral determine uma série de medidas de segurança.
O professor da FGV-Rio também afirmou que os sites responsáveis por gerenciar essas vaquinhas virtuais já preveem mecanismos de segurança. Para doar a pessoa deverá informar nome e CPF e esses dados deverão ser enviados aos órgãos de fiscalização da Justiça eleitoral. E há o risco do uso de CPFs de pessoas mortas. Ele defende que no futuro a Receita Federal cruze esses dados com os das eleições para verificar possíveis disparidades que apontariam usos de laranja.
“Estamos caminhando para esse processo. É um problema facilmente resolvível com tecnologia simples”, disse Mohallem. “Nenhuma opção de financiamento é perfeita, mas vale a pena porque têm vários lados positivos.”
Mohallem defende esse modelo de financiamento coletivo. Por meio do financiamento coletivo, disparidades entre grandes e pequenos partidos poderiam ser atenuadas e eleitores poderão apoiar financeiramente causas que acredita, pois poderão ser criadas vaquinhas por tema como da bancada de ambientalistas ou de mulheres ou de negros, etc.
Risco é grande
Para o advogado Vinicius Carneiro, autor do livro “Dinheiro da Multidão: oportunidades x burocracia no crowdfunding nacional”, os riscos de utilizar laranjas é muito grande. “Caso a Câmara crie alguma legislação nesse sentido, terá que prever diversos controles que impeçam justamente políticos mal intencionados em utilizar as plataformas de arrecadação para distorcer a origem dos fundos”, defendeu.
Carneiro ressalta que a grande maioria de eleitores ainda não é familiarizada com os meios tecnológicos de maneira a utilizá-los corretamente. Isto, em sua opinião, possibilita que partidos e candidatos “direcionem” a forma como essas doações podem ocorrer. “Temos que tomar muito cuidado para que uma propaganda digital não seja distorcida a ponto de não deixar claro ao eleitor que aquela doação está indo para aquele candidato, em uma determinada situação, e que essa doação precisa ser declarada”, explicou.
O advogado disse ainda que muitas pessoas já deixam de fazer doações a partidos ou políticos porque precisam declarar isso no Imposto de Renda e que isso não será diferente com as plataformas digitais de financiamento de campanha.
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