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Após o segundo turno das eleições municipais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enfrentará decisões cruciais e que podem definir o rumo dos dois últimos anos de mandato. Entre os problemas que estão por vir se destacam as negociações do Orçamento da União para 2025 com um Centrão fortalecido; as eleições dos presidentes da Câmara e do Senado, com uma pressão para reforma ministerial; e a briga interna pela presidência do Partido dos Trabalhadores.
O fortalecimento da direita na polarização nacional e o crescente poder do Centrão no Congresso ampliaram a dependência do governo desses partidos para aprovar suas pautas. Neste sentido, um dos principais problemas vindos dos resultados das urnas é a crescente pressão pela reforma ministerial para acomodar os centristas.
Em paralelo, Lula terá que gerir uma dura disputa interna no PT, onde o atual grupo liderado pela deputada Gleisi Hoffmann (PR) enfrenta a resistência da velha guarda do partido, representada pelo ex-ministro José Dirceu. Essa briga, que se acirra com os números das urnas, culminará na escolha em breve de um novo presidente do PT.
Além disso, Lula precisará se envolver nas articulações para a sucessão das presidências da Câmara e do Senado, cujos desfechos virão na reabertura dos trabalhos legislativos de 2025. A definição dos chefes do Congresso é essencial à governabilidade, pois deles dependem o rumo da já tensa relação com o Executivo.
Sucessão no Congresso e reforma ministerial são alvos de decisões de Lula
Para o cientista político Leandro Gabiati, da consultoria Dominium, Lula, como qualquer governante, busca fortalecer a relação com o Legislativo, atuando na sucessão dos seus comandos. “A questão principal é saber como ele conduzirá o processo, sem se expor desnecessariamente e garantindo o sucesso com os eleitos”, comenta.
Já a reforma ministerial atende à necessidade do governo de atualizar a relação com os partidos, evidenciado pelas eleições municipais. “É um ajuste inevitável diante do novo arranjo político, que influenciará os próximos anos, até a corrida de Lula pela reeleição”, disse ele, citando como exemplo o recente aceno aos evangélicos.
O cientista político ressalta que o meio do mandato é o momento ideal para um governo mexer na sua equipe em razão de mudanças no cenário político. “Isso deve ocorrer ao longo do primeiro semestre de 2025. No entanto, Lula tentará não parecer que cede a pressões, avançando na reforma só quando julgar apropriado”.
O presidente do Instituto Monitor da Democracia, Márcio Coimbra, avalia, contudo, que Lula não deverá se sentir motivado a fazer uma reforma ministerial de impacto, agindo, se precisar, de forma pontual, para contemplar um interesse particular. “No momento, o presidente precisa é mostrar estabilidade”, diz o cientista político.
Os bastidores sobre trocas de ministros não destacam a pressão para abrir espaços a partidos como PSD, PP, União Brasil e Republicanos. As conversas priorizam a necessidade de garantir vitrine para os presidentes da Câmara e do Senado – Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG) – após deixarem os cargos em fevereiro.
Sobre a sucessão nas duas casas do Congresso, Coimbra sublinha que a eleição de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) parece ser fato consumado, restando a Lula tratar da disputa na Câmara. “Embora prefira Antônio Brito (PSD-BA), ele deve acabar cedendo ao possível amplo consenso por Hugo Motta (Republicanos-PB)”, observa.
Lula terá de encarar o racha interno do PT, agravado após resultado das eleições
A relação entre Lula e o PT sofre ruídos no terceiro mandato do presidente. O partido depende do principal nome do petismo para manter a relevância, e ele, por sua vez, precisa preparar correligionários para um futuro sem sua presença. Mas o pragmatismo dele esbarra com a guinada mais à esquerda do PT, dificultando a sua renovação.
Segundo analistas, a falta de conexão do partido do presidente com a realidade social do Brasil incomoda Lula, que cobra mais atenção às bases populares e uma agenda além da identitária. Ele deixou isso claro em fevereiro, na festa de refiliação de Marta Suplicy, vice na chapa de Guilherme Boulos para a prefeitura de São Paulo.
O futuro do PT está em jogo, com divergências sobre como reformar o partido. Lula prega renovação, mas deu aval à prorrogação da atual direção da legenda por mais dois anos, contrariando o seu estatuto. Pressionada pelo resultados ruins nas urnas de 2024, a escolha do novo comando, prevista para fevereiro, será decisiva para o rumo a tomar.
Preferido de Lula para comandar o PT enfrenta resistência do atual comando
Edinho Silva, prefeito de Araraquara (SP) e aliado do ministro Fernando Haddad (Fazenda), é o nome preferido de Lula para substituir Gleisi Hoffmann. A ideia é que sua liderança pragmática molde o PT nas eleições de 2026 e 2030. Mas a transição será marcada pela briga por recursos partidários e pela orientação à militância.
Para tentar conter a tendência de vitória de Edinho, o grupo de Gleisi, do deputado Lindbergh Farias (RJ), do senador Humberto Costa (PE), entre outros, faz a defesa de “um presidente do Nordeste”, com o argumento de prestigiar a região onde o partido é mais forte. Na prática, os analistas veem na narrativa apenas resistência.
“A tendência hoje é de Lula apoiar uma sucessão no comando do PT sintonizada com a figura do ministro Haddad, até mesmo para colaborar com a sua própria governabilidade”, conclui Márcio Coimbra. “Prova disso foi a postura do presidente nas eleições, que buscou equilibrar os interesses do partido com o de aliados”.