O começo da atual legislatura do Congresso Nacional, marcada pela presença de muitos parlamentares com pouca ou nenhuma experiência na política, teve como uma das características de maior destaque o grande uso das redes sociais por parte dos congressistas, em especial dos novatos. Votações, audiências e até mesmo reuniões reservadas viraram pretexto para a realização de postagens e transmissões ao vivo nas comunidades virtuais de deputados e senadores. Esses novatos chegaram a ser chamados pejorativamente de "caçadores de pokémons" – em referência ao jogo de realidade virtual que fazia sucesso à época. Passados três anos, aquilo que era visto com receio pelos parlamentares mais experientes se consolidou. O uso das redes segue forte, mas houve uma tendência ao "amadurecimento". E, para 2022, o uso da internet deve aumentar por causa das eleições do segundo semestre.
"Alguns parlamentares refletiram sobre o papel que prestam aqui. Aprenderam com os excessos do começo e hoje cumprem um bom mandato. Teve gente que passou por um bom amadurecimento", declarou o deputado Daniel Coelho (Cidadania-PE), que cumpre seu segundo mandato na Câmara.
Coelho foi um dos principais críticos do que chamou de "excesso" por parte de outros deputados. Em 2019, o deputado apelidou de "caçadores de pokémons" os colegas que, segundo ele, mais se preocupavam em utilizar as redes do que em cumprir a atividade parlamentar.
"Alguns ainda se preocupam mais em falar com a rede do que com o próprio Parlamento. Colocam-se na terceira pessoa, como se não tivessem nenhuma ligação com o que está sendo feito pelo Congresso. Atuam mais como 'jornalistas do Congresso' do que como parlamentares eleitos", diz Coelho, reforçando parte da crítica apresentada há três anos.
Um evento em particular motivou a crítica de Coelho: a postura de deputados apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) após uma votação na Câmara em 22 de abril de 2019, quando o Legislativo determinou que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) deixaria a estrutura do Ministério da Justiça. Na ocasião, após a definição do resultado, diversos deputados da base mais ideológica de Bolsonaro acionaram seus celulares para fazerem transmissões ao vivo. Fotos com os deputados próximos entre si, cada um com o celular em punho, figuraram entre as mais divulgadas na semana.
"Os que fizeram piadinha hoje caçam pokémon", diz deputado novato
O deputado André Janones (Avante-MG) não é da base mais ideológica de Bolsonaro. Mas está em primeiro mandato e é um usuário recorrente das redes sociais. Apesar de ser do "baixo clero" do Congresso, é um dos líderes do Legislativo em engajamento nas redes sociais. A popularidade na internet o motivou a se apresentar como pré-candidato a presidente da República.
Segundo ele, o tempo que se passou entre 2019 e os dias atuais levou os críticos ao uso da internet reverem seus conceitos. "Nada como o tempo, né? O tempo é o senhor da razão. Os que fizeram piadinha hoje 'caçam pokémon'. Estão tentando ter relevância na internet", diz.
Janones acredita, contudo, que os parlamentares que não se interessaram pelas redes no passado terão dificuldades para se destacarem, hoje em dia, no ambiente virtual: "São como aquele aluno que não estudou o ano inteiro e quer passar de ano apenas com as notas do último bimestre".
O deputado qualifica as redes como uma "ferramenta de comunicação direta com o eleitorado". O parlamentar pondera que a imprensa tradicional não perdeu sua função, mas avalia que "o eleitor não quer mais apenas receber as notícias prontas".
Para ele, a eleição de 2022 será "a eleição da rede social". "Não tenho dúvida que o ápice das redes sociais nas eleições será agora. Os últimos anos deixaram bem claro que não dá para fazer política fora das redes."
Janones ganhou fama em 2018, quando ainda não tinha mandato, ao publicar vídeos em apoio às greves dos caminhoneiros em todo o Brasil naquele ano. Cndidatou-se a deputado por Minas Gerais e obteve 178.660 votos, ficando à frente de veteranos da política do estado, como Aécio Neves (PSDB), Eros Biondini (Pros) e Patrus Ananias (PT).
Direita está na liderança nas redes sociais
A ligação do uso das redes sociais com os apoiadores de Bolsonaro não se resume ao episódio de 2019 ou a eventos do início da gestão do presidente da República. Os parlamentares governistas figuram, em diferentes levantamentos, entre os congressistas mais influentes nas redes.
Pesquisa do Instituto FSB publicada em agosto de 2021, que avaliou a força dos congressistas ao longo do primeiro semestre do ano passado, identificou que os parlamentares da base de Bolsonaro ocupam os seis primeiros lugares na lista dos mais influentes. Considerando o "top 20" da relação, apenas oito parlamentares não são identificados com o governo.
Um dos parlamentares da base mais ideológica de Bolsonaro apontados entre os mais influentes nas redes sociais – o quinto do país, segundo o Instituto FSB –, o deputado Filipe Barros (PSL-PR) avalia que a força da direita nas redes se explica por um descompasso entre as preferências da população e a ideologia da maior parte dos jornalistas.
"A grande mídia tende a ser de esquerda, algo que parcela considerável da população não é. As redes sociais permitiram, simplesmente, que as pessoas pudessem falar suas opiniões, ou compartilhar opiniões com as quais concordam. Então todos, na prática, se tornaram pequenos jornalistas", diz ele.
Barros, assim como Janones, também viu uma mudança no perfil dos congressistas na comparação entre 2019 e os dias atuais. "As redes sociais se tornaram tão essenciais e imprescindíveis que parte dos que nos criticaram lá no passado hoje pedem ajuda para fazerem sucesso na rede."
Ele vê, no entanto, que a liderança de momento da direita não é garantia que o segmento terá vida tranquila nas redes à época das eleições. "O quadro que teremos em 2022 será bem distinto do visto em 2018. Porque naquela época nós estávamos fora do mandato; hoje, nós estamos no mandato. Uma parcela do nosso eleitorado não vai querer saber apenas da batalha ideológica, e sim ver o que fazemos e o que enfrentamos dentro do Congresso", diz Barros.
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