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Livre comércio

Celebrado na cúpula do Mercosul, acordo com UE passará fácil no Congresso brasileiro?

Jair Bolsonaro e Mauricio Macri
Bolsonaro em almoço com presidente da Argentina, Mauricio Macri, em janeiro de 2019: legislativos do Mercosul precisam aprovar acordo. (Foto: Isac Nóbrega/Presidência da República)

Foi histórico: depois de 20 anos de negociações, finalmente Mercosul e União Europeia (UE) chegaram em junho a um acordo de livre comércio. A parceria vem sendo amplamente celebrada na Cúpula do Mercosul, que se encerra nesta quarta-feira (17), na Argentina. Mas existe um longo caminho para que o tratado comercial seja formalizado. Os poderes legislativos de cada um dos quatro países-membros do bloco sul-americano, além do Parlamento Europeu, precisam concordar com os termos. Bolsonaro já afirmou que espera que o Congresso brasileiro seja um dos primeiros a aprovar o acordo, até o fim de seu mandato, em 2022. Será que vai ser fácil?

Em tese, parece que sim. Mas o acordo vai enfrentar lobbies setoriais que podem complicar a sua homologação pelo Parlamento brasileiro. E a história mostra que, até que as resistências sejam vencidas, acordos comerciais não são aprovados tão rapidamente no Brasil.

Maioria simples. Mas não tão simples assim

No Congresso, o acordo precisa apenas de maioria simples para ser aprovado e começlar a valer. E, como lembra Maurício Santoro, professor-adjunto do Departamento de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, “o Congresso brasileiro nunca recusou um acordo de livre comércio assinado pelo Executivo”.

“Esse não é um assunto que desperte grandes emoções, e agrada aos liberais, que formam uma bancada de expressão”, afirma Giorgio Romano, coordenador do Observatório da Política Externa e da Inserção Internacional do Brasil (OPEB) da Universidade Federal do Grande ABC. “A questão nem é o Brasil, é que o acordo precisa passar por todos os países. Isso demora.”

Na prática, algumas dificuldades poderão aparecer no caminho da tramitação em Brasília. “A tramitação no Legislativo poderá sofrer vetos cruzados e exigir muita discussão e muita negociação. O acordo foi justamente saudado como uma conquista para a economia nacional, mas terá de ser examinado em todos os seus aspectos e em todas as suas implicações”, diz Marco Aurélio Nogueira, coordenador do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais da Universidade Estadual de São Paulo.

Para Matias Spektor, professor associado e vice-diretor da Escola de Relações Internacionais da FGV, o acordo vai encontrar alguma resistência, tanto no Brasil quanto na Argentina. “Quem vai atrapalhar a tramitação do acordo são os interesses protecionistas brasileiros e argentinos que ainda dão boa parte das cartas nos respectivos parlamentos. Caberá ao poder Executivo em ambos os países diluir essa oposição, montando uma aliança com os grupos de interesse pró-abertura”.

Setores receosos: quem pode atrapalhar

Mas quem poderia se opor ao acordo, além dos congressistas que defendem que a economia deve ser protecionista? Alguns setores podem dificultar a aprovação do tratado. Para o agronegócio, por exemplo, a abertura comercial favorece os negócios. Mas há resistência à insistência nas medidas de proteção ambiental exigidas por alguns países europeus, em especial a França. Além, disso, alguns setores brasileiros, como os produtores de vinho, podem ser esmagados pela concorrência europeia.

Já no meio industrial, se de um lado a redução de taxas de ambos os lados favorece a integração às cadeias produtivas europeias, existe o medo, em especial na indústria siderúrgica, de que o acesso a produtos europeus sem taxação comprometa a competitividade. De toda forma, a primeira reação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) foi favorável aos termos gerais do acordo.

Essa negociação vai demorar anos. Segundo a Confederação Nacional da Indústria, o tempo médio para um tratado comercial passar a valer no Brasil ultrapassa os 1.500 dias, o equivalente a pouco mais de quatro anos. É o quanto demora para as negociações dos diplomatas passarem pelos ministérios e pelas comissões na Câmara e no Senado até se tornarem um decreto legislativo, encaminhado de volta para o presidente e só então editado. Há casos em que a demora é muito maior: o acordo de dupla tributação com a Rússia demorou 11 anos para entrar em vigência.

O bloco como instrumento de abertura comercial

“Bolsonaro e Macri comungam de uma visão comum em relação ao Mercosul: ambos repetiram desde o início sua vontade de transformar o bloco em instrumento de abertura comercial, abandonando o papel de escudo protecionista que o grupo havia adquirido durante os últimos anos”, afirma o professor Matias Spektor. “O acordo UE-Mercosul dará fôlego a esse projeto de mais abertura. A próxima fronteira são os acordos com Canadá e Coreia do Sul”.

De fato, o governo brasileiro vem trabalhando em várias frentes, em busca de mais acordos de cooperação comercial, que incluem, além de Canadá e Coreia do Sul, Estados Unidos, Japão e o Efta, bloco de países que reúne Suíça, Islândia, Noruega e Liechtenstein”. O acordo entre Mercosul e União Europeia, possivelmente, será apenas o primeiro a ser apresentado ao Congresso nos próximos anos.

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