O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmou nesta semana que uma "PF Paralela" opera dentro da estrutura da Polícia Federal e está sendo usada para perseguir o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados. A acusação, não provada por ora, é uma resposta à narrativa da existência de uma "Abin Paralela", difundida por setores da imprensa, governo e seus aliados e pelo próprio Judiciário, que aponta o suposto emprego ilegal de recursos e servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante a gestão anterior.
A troca de acusações entre apoiadores e críticos de Bolsonaro ocorre após uma série de operações da Polícia Federal (PF) em janeiro, com foco em parlamentares ligados ao ex-presidente, e diante de especulações de que 18 nomes de parlamentares de oposição seriam alvos de acusações no Supremo Tribunal Federal (STF).
“Há uma conjuntura para perseguir Jair Bolsonaro. Espero que a PF faça uma autoanálise e expurgue essa "PF paralela"”, disse o senador Flávio Bolsonaro. Fontes da oposição ouvidas pela reportagem afirmaram que a suspeita é de que exista um grupo de policiais federais que cumpre decisões do STF e que supostamente manteria contato direto com ministros, em particular Alexandre de Moraes, e com hipotético aval da direção da organização.
O vereador Carlos Bolsonaro chegou a ser questionado pela polícia em inquérito por fazer uma postagem em redes sociais, em agosto de 2023, que foi interpretada como ofensiva ao diretor da Polícia Federal, Andrei Rodrigues. O parlamentar havia reproduzido uma publicação do perfil Dama de Ferro, que trazia imagens satíricas em alusão ao pai, Jair Bolsonaro, morto, e afirmava “zero busca e apreensão, zero inquérito, zero perfis bloqueados, zero reportagem em repúdio, pessoas presas: zero”. O título da postagem continha a frase “tudo pela manutenção da democracia”.
Já a "Abin Paralela" é um termo que vem sendo usado por opositores de Bolsonaro para alegar que o ex-presidente teria criado um grupo de servidores da agência de inteligência que atuaria de forma extraoficial com o suposto objetivo de colher informações que poderiam ser úteis para a defesa de Bolsonaro e seus aliados contra acusações judiciais. Assim como no caso da "PF Paralela", não há provas concretas sobre a existência do alegado grupo.
As versões "paralelas" tanto de Abin quanto da PF revelam a forte tensão política do país, que se reproduz nas estruturas das instituições de Estado. Na prática, são acusações muito similares. Uma diz que o STF, o governo ou ambos seriam responsáveis por uma estrutura paralela na Polícia Federal e outra afirma que o clã Bolsonaro teria usado estratégia similar em relação à Abin quando o ex-presidente estava no poder.
Na quarta-feira (31), o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) sugeriu que deve ser o próximo alvo da “Polícia Federal Paralela”, no rastro das buscas e apreensões ocorridas contra os deputados do PL fluminense Carlos Jordy e Alexandre Ramagem e o vereador do Rio Carlos Bolsonaro (Republicanos).
Nesse sentido, Flávio Bolsonaro destacou evidências de pescaria probatória, prática vedada pela legislação brasileira, na qual investigações especulativas e indiscriminadas, sem objetivo certo ou declarado, lançam “redes” a esmo na esperança de “pescar” qualquer prova capaz de sustentar uma futura acusação. Para ele, isso teria ficado evidente quando, na segunda-feira (29), em Angra dos Reis (RJ), policiais consideravam levar celulares de todos os políticos que estavam em uma casa junto com o alvo do mandado de buscas, Carlos Bolsonaro.
Flávio Bolsonaro lamentou que a instituição policial esteja minando a sua própria reputação ao agir sem indícios concretos e, aparentemente, movida a propósitos partidários. “Está muito claro pelo modus operandi. Quero crer ainda que exista Justiça e que decisões drásticas como busca e apreensão ou qualquer outra coisa sejam feitas com base em provas, e não tentando desgastar a imagem de alguém que é figura pública”, disse. Por fim, ele insinua que notícias falsas veiculadas durante as operações possam ter partido da “PF Paralela”, com o intuito de justificar atos arbitrários.
Na saída do Ministério da Justiça, Dino nega PF política
No mesmo dia das críticas de Flávio Bolsonaro, quando estava de saída do comando do Ministério da Justiça, Flávio Dino tratou de negar uso político da Polícia Federal, que era vinculada a ele, afirmando repudiar interferências na autonomia da instituição. Ele garantiu que Lula e demais membros do governo “nunca pediram nada, nem para investigar ou deixar de investigar”.
“Tenho repulsa à ideia de uso político das polícias. Isso nunca ocorreu”, disse. Apesar disso, o próprio Dino já induziu essas associações ao longo dos 13 meses no cargo, com frases como “Dinheiro não tenho, mas a Polícia eu tenho” e “a causa da Polícia Federal é a causa de Lula e do Brasil”. Ele também expressou veemência ao indicar que colocaria a PF para investigar supostos crimes praticados pelos agentes do Ministério Público Federal (MPF) e do Judiciário que atuaram na Operação Lava Jato.
A oposição aponta na chamada "PF Paralela" um alinhamento com o ministro Alexandre de Moraes, relator no STF dos inquéritos que instruíram as operações policiais focadas em aliados de Jair Bolsonaro, integrantes dos “núcleos políticos” das investigações. Parlamentares estranham despachos de mandados baseados em evidências que se provaram rapidamente falsas, como fotos adulteradas e fatos ocorridos fora da data indicada. Eles ainda questionam a própria competência legal de Moraes à frente de inquéritos.
“No caso específico do ministro Alexandre de Moraes e o 8 de janeiro, foi divulgado pela imprensa, sem que houvesse nenhuma correção, que ele foi escolhido pela então presidente do STF Rosa Weber em 9 de janeiro para presidir o inquérito sem que houvesse sorteio. Faltou a impessoalidade necessária, deixando gravemente comprometido o processo”, avaliou o senador Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição. A impropriedade de Moraes como julgador estaria no fato de ele se ver como potencial vítima dos episódios ocorridos na Praça dos Três Poderes, ao dizer em entrevista que a Polícia Federal apurou indícios de suposta tentativa de assassiná-lo.
Andrei Rodrigues, diretor-geral da PF, disse em entrevistas que o plano para enforcar Moraes visava tirar o ministro da condução do chamado inquérito das Fake News, próximo de completar cinco anos.
Operação da PF provocou atritos internos na Abin e demissões
O conceito de "Abin Paralela", que inspirou o de "PF Paralela", está expresso na “Vigilância Aproximada”, operação deflagrada no último dia 25 e dedicada a investigar "organização criminosa que se instalou na agência com intuito de monitorar ilegalmente autoridades públicas e outras pessoas, utilizando-se de ferramentas de geolocalização de dispositivos móveis sem a autorização judicial”. A controvérsia dentro da própria Abin gerada pela operação levou Lula a demitir o seu diretor-adjunto, Alessandro Moretti, além de mais quatro diretores.
O principal alvo da “Vigilância Aproximada” é o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin e pré-candidato à prefeitura do Rio. A PF chegou até a pedir a suspensão do mandato do parlamentar, mas a medida não foi acolhida pela Procuradoria-Geral da República e pelo ministro Alexandre de Moraes. O caso serviu para ampliar a tensão entre Legislativo e Judiciário, pois motivou duas operações no intervalo de uma semana, com buscas em residências e gabinetes dos parlamentares.
A PF apura se houve o uso pela Abin do software israelense FirstMile para produzir relatórios sobre ministros do STF e adversários opositores do clã Bolsonaro. Ramagem descartou qualquer uso ou relação com softwares de espionagem da Abin. Segundo delegados federais, a tal “Abin Paralela” foi criada na gestão Ramagem e tentou atrelar Moraes e o também ministro do STF Gilmar Mendes à facção criminosa PCC. A corporação afirma que os indícios estariam em documentos apreendidos na agência.
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