O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anuncia nesta terça-feira (19) um conjunto de medidas para a área social que será elaborado por um grupo de parlamentares, encabeçado por Tabata Amaral (PDT-SP). As propostas contemplarão questões como a elevação de recursos para o Bolsa Família, principal programa social do governo federal, e ações para a ampliação do acesso à rede de saneamento, entre outras iniciativas.
A "agenda social", como o pacote tem sido chamado entre os parlamentares, aparece também como uma forma de a Câmara manter o protagonismo que deteve ao longo de 2019.
A condição de destaque da Casa apareceu principalmente por causa da reforma da Previdência, que, embora idealizada pelo governo federal, sofreu uma série de ajustes durante sua tramitação pelo Legislativo. A mudança no sistema de aposentadoria teve em Maia um defensor mais aguerrido do que muitos integrantes do próprio partido o presidente Jair Bolsonaro à ocasião, o PSL.
Agenda social de Maia também é contraponto a Bolsonaro
Além disso, a agenda social surge como um contraponto a algo que tem sido criticado até mesmo por aliados do Palácio do Planalto: uma suposta falta de "sensibilidade social" por parte da gestão Bolsonaro. Com a priorização de temas como a reforma da Previdência e as privatizações, além do indicativo para adoção de outras medidas de austeridade, o governo tem sido acusado de deixar temáticas sociais em segundo plano.
Outro "efeito colateral" da agenda social é dar uma nova oportunidade de destaque à deputada Tabata Amaral, e também uma chance para "reconciliação" entre ela e setores ligados à esquerda e a causas sociais. A parlamentar tornou-se alvo de críticas destes setores após votar a favor da reforma da Previdência.
Cinco eixos de trabalho
A agenda social de Rodrigo Maia é dividida em cinco eixos principais. Um é o de acréscimo de R$ 9,8 bilhões ao orçamento do Bolsa Família. A elevação se daria com o aumento dos valores pagos por criança (de R$ 41 a R$ 50) e do Benefício de Superação da Extrema Pobreza, que iria a R$ 100.
Outros dois dizem respeito ao universo do trabalho, com melhorias na inclusão produtiva e na rede de proteção ao trabalhador. Um quarto eixo foca a reformulação na governança do Sistema Único de Assistência Social (Suas).
O quinto eixo aborda fornecimento de água e saneamento. O grupo deseja a apreciação do novo Marco Legal do Saneamento Básico, proposta do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). O projeto já foi aprovado por comissão especial da Câmara e depende de votação em plenário. Entre outras medidas, o Marco prevê a extinção dos "contratos de programa" – acertos feitos entre prefeituras e empresas estaduais de saneamento sem a abertura de concorrência, e por consequência sem a possibilidade da participação do setor privado. Para especialistas, as barreiras jurídicas para a atuação de empresas particulares estão entre os principais fatores que dificultam a massificação do serviço de saneamento no país.
Os tópicos abordados pelo grupo de trabalho não figuraram, até o momento, entre as prioridades do governo federal. A reforma da Previdência foi o carro-chefe das políticas econômicas ao longo de 2019, e ainda concentra parte das atenções por causa da PEC Paralela – que visa incluir servidores de estados e municípios na alteração do sistema de pagamentos de benefícios e pensões.
Outro ponto tido como prioritário pelo governo é o pacote anticrime proposto pelo ministro Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública), que também tramita no Congresso desde o início do ano. E, mais recentemente, outra cartada do Palácio do Planalto foi a apresentação das PECs do pacto federativo, que buscam uma reformulação das relações entre União, estados e municípios.
Quem são os responsáveis pela agenda social
Além da deputada Tabata Amaral, o grupo de trabalho que tocará a agenda social é constituído pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e pelos deputados Felipe Rigoni (PSB-ES), João Henrique Campos (PSB-PE), Pedro Cunha Lima (PSDB-PB) e Raul Henry (MDB-PE). À exceção de Cunha Lima e Henry, todos os demais integrantes exercem seus primeiros mandatos no Congresso Nacional.
O deputado João Henrique Campos disse que o grupo já mantinha diálogos sobre o tema desde o início do ano, e que a iniciativa de conduzir a agenda social partiu do conjunto – que então procurou Rodrigo Maia para ver como poderia operacionalizar o processo. "É um grupo que já fazia esse tipo de discussão. Mesmo com divergências em alguns pontos, há afinidades entre nós em diversos aspectos. Então fizemos essa construção", diz o deputado, filho do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, morto durante a campanha eleitoral de 2014.
O deputado nega a ideia de que o grupo seja uma "resposta" da Câmara às agendas econômicas priorizadas pelo governo federal. "Não é uma resposta, mas sim um indicativo de que há uma necessidade de se priorizar o campo social. Quando há crise, como a que vivemos hoje, fica maior a importância das políticas públicas", acrescentou.
Tabata e a reconciliação com o social
O PDT decidirá o destino de seus membros que votaram a favor da reforma da Previdência na sexta-feira (22), três dias após o lançamento da agenda social da Câmara. Tabata Amaral está entre os pedetistas que votaram a favor da mudança no sistema de aposentadorias, contrariando a orientação do partido. Ela está suspensa das atividades partidárias e pode acabar expulsa da legenda.
O apoio da parlamentar à reforma acabou por impactar na imagem da deputada e colocar sobre ela um rótulo de direitista na opinião da esquerda, e de esquerdista na opinião da direita. Segmentos da esquerda consideram que ela se aliou a propostas da gestão Bolsonaro, enquanto membros da direita relembram do embate da deputada com ministros do governo e de suas propostas de inclusão social.
Ao conduzir a agenda social, a deputada se verá diante de uma oportunidade para recuperar o protagonismo que obteve no início do mandato. "Aqui no Brasil, por exemplo, 15 milhões de pessoas entraram para as linhas de pobreza e extrema pobreza. E o governo federal é muito ausente no social. É extremamente preocupante, porque a passividade do poder público diante disso pode levar muitos a questionarem a própria democracia", afirmou a deputada em entrevista ao Correio Braziliense.