A agilidade nas primeiras decisões no combate ao novo coronavírus foi determinante para o sucesso de países que estão vencendo a doença. Essa foi a constatação de um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que comparou a velocidade com que algumas nações reconheceram a gravidade da disseminação da Covid-19 e analisou o impacto de ações rápidas de enfrentamento.
As localidades que trabalharam para conter o avanço do vírus registraram menos casos e mortes da doença. Também puderam planejar seus protocolos para reabertura de serviços e retomada das atividades de forma mais ordenada.
No dia 11 de março, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o avanço do novo coronavírus (Sars-COV-2) como pandemia. A nota técnica: “A saúde pública e o enfrentamento da crise causada pelo coronavírus”, produzida por Edvaldo Batista de Sá, do Ipea analisou as datas em que algumas nações afetadas pelo vírus reagiram a partir do primeiro caso registrado, seguido da determinação de autoridades para que a população ficasse em casa, até o fechamento de escolas e serviços não essenciais e por fim, restrições severas a viagens aéreas.
Ações rápidas e mensagens claras à população
Foi a rapidez do governo de Portugal, por exemplo, que fez com que o avanço do vírus fosse tão diferente do que ocorre na vizinha Espanha. Entre o registro do primeiro caso e o pedido das autoridades portuguesas para que as pessoas ficassem em casa passaram-se 17 dias.
O governo espanhol, por sua vez, levou 40 dias para implementar o isolamento social. A diferença de casos é devastadora. Segundo dados coletados pela Universidade Johns Hopkins, até as 14h20 deste domingo (21) a Espanha tinha 235.290 casos confirmados e 28.752 mortos pela Covid-19.
Portugal impôs medidas para forçar a população como um todo a ficar em casa, fechou escolas e serviços não essenciais, e determinou restrições severas a viagens aéreas. Com isso, registrou 30.623 infectados e 1.316 vítimas fatais, até este domingo.
Países mais afetados demoraram a agir
Dentre os avaliados, os Estados Unidos foram o país mais lento a reagir à pandemia. Enquanto o presidente, Donald Trump, negava a gravidade da doença, coube aos governadores determinarem regras de contenção. Até agora foram registrados mais de 1,6 milhão de infectados e 97.211 óbitos no país, segundo o Johns Hopkins. O Brasil é o segundo país com mais infectados, com 347,4 mil, seguido da Rússia, com 344,5 mil.
De acordo com a projeção realizada pelo Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME), se o Brasil não mudar as ações para conter o avanço do coronavírus e o volume de óbitos seguir aumentando no mesmo ritmo, estima-se que até 88.305 pessoas podem morrer até 4 de agosto.
“A falsa dicotomia entre saúde pública e economia parece estar por trás do baixo desempenho dos países mais afetados pela pandemia. Países onde os dirigentes políticos minimizaram as consequências do Sars-COV-2 para a saúde pública e deram prioridade às questões econômicas podem perder, se é que já não perderam, o controle da disseminação do vírus e estão com sistemas de saúde sob intensa pressão, sem que suas economias apresentem sinais de estarem protegidas”, diz o estudo.
Testagem em massa e distanciamento social são estratégias de sucesso contra coronavírus
A China foi o país que adotou as medidas mais duras de controle do vírus. “Apenas três dias após a identificação dos primeiros casos de transmissão entre humanos, o governo da China impôs o bloqueio total e implementou medidas de distanciamento social em Wuhan, o epicentro da pandemia”, aponta o Ipea. Além do distanciamento social em todo o país, o governo contou com o apoio de aplicativos para celular usados para impor as restrições.
A estratégia usada pela Coreia do Sul foi a testagem em massa da população. Os kits foram desenvolvidos no país e até mesmo indivíduos assintomáticos foram testados. Também foi imposto o distanciamento social ampliado. O celular se tornou uma forma de informar a população, com um aplicativo que localiza casos confirmados a uma distância de 100 metros de onde estão.
Tanto a China, quanto a Coreia do Sul ensaiam uma reabertura, mas ainda existe o medo de uma segunda onda de contaminação. Na Coreia, por exemplo, com a abertura gradual 13 novos casos foram confirmados pelo Centro de Controle de Doenças (KCDC, na sigla em inglês), nesta terça. Com a flexibilização, pelo menos 101 novos casos de coronavírus foram descobertos na semana do dia 11 de maio e estão ligados a clubes noturnos no distrito de Itaewon, em Seul. O que levantou medo sobre uma possível segunda onda de infecções.
Disputa política atrapalha desempenho do Brasil
O primeiro caso confirmado como infecção pelo novo coronavírus no Brasil foi registrado no dia 26 de fevereiro. Desde então, a cúpula do governo federal, o Ministério da Saúde e os estados travam uma espécie de guerra fria sobre como enfrentar o problema.
O presidente Jair Bolsonaro defende a abertura do comércio e o isolamento vertical, ou seja, apenas de idosos e de pessoas do grupo de risco. O ministério é favorável ao distanciamento social, mas não passa diretrizes claras de como estados e municípios podem optar por modelos mais ou menos restritivos.
A atuação da pasta, que tem um papel fundamental para a gestão do SUS, é prejudicada pelo componente político. Desde a detecção do primeiro caso até o momento, dois ministros da saúde foram demitidos por não concordarem com a abordagem do Planalto sobre a crise. Luiz Henrique Mandetta estava no cargo desde o começo do governo Bolsonaro e caiu, entre outros fatores, por defender o isolamento social.
Nelson Teich, o sucessor, durou exatos 28 dias na chefia da pasta, deixou a promessa de um plano para definir níveis de isolamento social e saiu por se recusar a aceitar a utilização da cloroquina desde o início dos sintomas. Mandetta e Teich são médicos.
Até o momento, não existe embasamento científico suficiente para garantir que o uso de cloroquina ou hidroxicloroquina em pacientes no início dos sintomas não cause outros problemas e alguns estudos questionam até mesmo a utilização do medicamento em pacientes graves. Ainda assim, o Ministério da Saúde, sob a batuta do interino general Eduardo Pazuello, publicou um novo protocolo para o uso da substância.
Sem uma diretriz unificada, o processo de tomada de decisão no Brasil está totalmente descentralizado. E há amparo legal para isso.
Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), do dia 15 de abril, determinou que governadores e prefeitos têm a prerrogativa sobre decisões relacionadas a pandemia. No entanto, com as diferentes versões sobre como proceder durante a pandemia vindas da instância federal, a população recebe mensagens conflitantes e tem mais dificuldade em seguir o que governadores e prefeitos determinam.
Desafios do Brasil no combate ao coronavírus
O levantamento do Ipea deixa claro que não existe uma única fórmula a ser seguida para o controle de pandemias, devido aos diferentes fatores de transmissão. A epidemiologia permite, no entanto, identificar três estratégias básicas de controle, segundo o estudo. Essas ações podem ser adotadas isoladamente ou em conjunto, dependendo da incidência de casos por região. A contenção, mitigação e supressão são os primeiros passos no combate.
A quarentena em São Paulo, o epicentro da doença no Brasil, começou no dia 24 de março, em todo o estado. O governador, João Doria (PSDB), prorrogou o isolamento até o dia 31 de maio. Mas os índices de isolamento na capital nos últimos dias estiveram abaixo de 50%. Para frear a velocidade de infecção e desafogar o sistema de saúde o ideal seria um índice de isolamento de 70%. Numa tentativa de evitar a determinação de medidas mais restritivas ainda, tanto o estado quanto a capital estão adiantando feriados para tentar forçar as pessoas a ficarem mais em casa.
Algumas cidades brasileiras já enfrentam o lockdown, o confinamento mais rígido da população. É o caso de municípios no Rio de Janeiro, Tocantins, Pará, Maranhão, Roraima e Paraná. O estado do Amapá inteiro estará em lockdown entre os dias 19 e 28 de maio.
Além disso, o levantamento reforça que é preciso olhar os sistemas públicos de saúde que mesmo antes da pandemia já estavam fragilizados. O Ministério da Saúde vem tentando ampliar a testagem e a distribuição de equipamentos, como respiradores, essenciais em casos mais graves da doença. Até o início da semana passada apenas 823 de 14.100 respiradores comprados pelo ministério foram entregues.
Também não há uma linha definida sobre a adoção do isolamento social, que vem sendo decidido por governadores e prefeitos. O ex-ministro da Saúde Nelson Teich afirmou no Twitter que deixou pronta uma diretriz sobre o tema, que só não foi publicada porque secretários de saúde estaduais e municipais não concordaram com as determinações.
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF