A plataforma de hospedagem online Airbnb gerou R$ 7,7 bilhões em negócios no Brasil em 2018. Foram 3,8 milhões de locações intermediadas pelo aplicativo naquele ano, um crescimento de 71% em relação a 2017. O aluguel de casas e apartamentos por temporadas ajuda a compor a renda de proprietários – segundo a plataforma, pelo menos 69% deles usam o dinheiro para manter os imóveis e 55% para colocar as contas em dias. E facilita a vida de pessoas interessadas em hospedagens mais baratas e sem complicação.
Mas um projeto de lei apresentado no Congresso Nacional estabelece novas regras que acabam por dificultar essa forma de negócio em condomínios. O PL 2.474/2019, apresentado pelo senador Ângelo Coronel (PSD-BA), prevê que o aluguel via Airbnb e outras plataformas digitais só será possível com autorização expressa de dois terços dos condôminos. A autorização legal deverá constar na convenção do condomínio, bem como regras específicas para esse tipo de locação.
O senador cita que o projeto tenta disciplinar uma situação que vem gerando tensão entre os próprios moradores: de um lado estão aqueles que não querem uma alta rotatividade de pessoas circulando pelo condomínio, temem a redução de segurança e o aumento de gastos com manutenção. E do outro estão os que, baseados no direito da propriedade privada, querem conseguir uma renda extra locando o seu imóvel.
“Não se pode negar o impacto positivo do avanço tecnológico, mas também não é razoável ignorar variáveis que acabam desvirtuando formas de usufruir da propriedade privada, principalmente quando interferem nos direitos de outros proprietários. O atual 'vazio legislativo' contribui para o aumento de conflitos nessa área”, diz Ângelo Coronel na justificativa do projeto.
Desde a criação da plataforma em 2007 até março de 2019, 500 milhões de pessoas se hospedaram via Airbnb pelo mundo, movimentando US$ 65 bilhões. São 191 países atendidos e 81 mil cidades. O valor considera toda a cadeia de negócios que envolve o turismo, como comércio e restaurantes locais, não apenas hospedagem. Segundo o Airbnb, no Brasil, os hóspedes gastaram R$ 1,8 bilhão em restaurantes e cafés em 2018.
A proposta tramita desde abril no Senado. Atualmente está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Caso o condomínio aceite liberar o uso do Airbnb, o locador é o responsável por qualquer dano eventual causado pelo hóspede; a locação pode ser tanto do apartamento inteiro, quanto de apenas um ou mais cômodos; o locador será considerado um consumidor perante o titular do aplicativo ou plataforma de intermediação, de acordo com a proposta.
Para a plataforma, o aluguel por temporada no Brasil é expressamente autorizado pela Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991) e a modalidade não configura atividade comercial hoteleira. Em novembro deste ano, o Airbnb anunciou que serão implementadas "medidas adicionais de segurança", até o final de 2020. Como a "Linha Direta do Vizinho do Airbnb", para falar sobre eventuais queixas, com uma pessoa real do outro lado da linha em qualquer lugar do mundo. O atendimento deverá funcionar 24 horas, todos os dias e será implementada primeiro nos Estados Unidos.
STJ julga caso em que condomínio proibiu locação via Airbnb
Em outubro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou pela primeira vez um caso de legalidade de locações do tipo Airbnb em condomínios. Uma mulher queria sublocar temporariamente seu imóvel em Porto Alegre, mas o condomínio entrou na Justiça em 2014 contra ela e a justiça local concordou. Proibida de sublocar o apartamento, a proprietária recorreu ao STJ.
A Quarta Turma será a responsável por julgar o caso, porém sem efeito vinculante, ou seja, a decisão não valeria para outros casos. Apesar de não ser parte, o Airbnb pediu para se manifestar defendendo que proibir a sublocação é ilegal.
O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, entendeu que os condomínios não podem proibir a locação via Airbnb e outras plataformas, porque essa forma de atividade não está inserida no conceito de hospedagem, e sim de locação residencial por curta temporada.
Também ressaltou não se tratar de atividade comercial passível de proibição, além de considerar violação de propriedade os condomínios proibirem a locação temporária. O ministro Raul Araújo pediu vista (mais tempo para analisar o processo) e o julgamento foi suspenso, devendo ser retomado no primeiro semestre de 2020.
Relator discorda da proposta no Senado
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), relator do projeto na CCJ, apresentou o parecer pela rejeição do projeto. O próximo passo é votar esse parecer – a matéria tramita em caráter terminativo na comissão.
Randolfe argumenta que a autorização para locação está prevista na Lei do Inquilino. O relatório foi apresentado no dia 17 de dezembro, antes do recesso de fim de ano. “Em nosso entendimento, a locação de imóvel por meio do uso de aplicativos não significa transformar condomínios edilícios inteiros em hotéis ou apart-hotéis, dormitórios ou assemelhados.”
O senador ressalta que para "evitar conflitos com a vizinhança, a única recomendação que nos atrevemos a fazer é a de sugerir ao proprietário do imóvel em condomínio edifício o dever de comunicar à administração do condomínio a sua intenção de fazer a locação do seu imóvel por temporada, informando, sempre, quem são os ocupantes do imóvel locado naquele período”. Caso seja aprovada, a lei entra em vigor na data da publicação.