Senador de primeiro mandato, Alessandro Vieira (SE) foi escolhido nesta sexta-feira (10) como pré-candidato à Presidência em 2022 pelo partido Cidadania. A legenda integra o grupo de siglas que discutem a construção de uma candidatura de terceira via para se contrapor à polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na disputa do ano que vem.
Alessandro Vieira ganhou projeção nas sessões da CPI da Covid pelos questionamentos feitos aos depoentes. Ele foi o autor, junto com o senador Jorge Kajuru (Podemos-GO), da ação que levou o Supremo Tribunal Federal (STF) a obrigar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), a instalar a CPI.
Em entrevista à Gazeta do Povo, o pré-candidato a presidente afirma que existe espaço para a terceira via, mas que os demais políticos precisam levantar bandeiras "caras" para a população, entre elas o combate à corrupção. Além disso, ele afirma que Bolsonaro tentará "romper" com o ciclo eleitoral em 2022, mas que as instituições irão garantir a normalidade.
Ex-delegado da Polícia Civil, Vieira defende o direito dos policiais de participarem de manifestações, desde que não estejam fardados ou armados. Em outra frente, critica a reforma eleitoral aprovada pela Câmara e vê como retaliação a proposta de quarentena para juízes, militares e policiais discutida no Código Eleitoral.
Leia abaixo a entrevista com o senador Alessandro Vieira.
A CPI da Covid já está na reta final e várias linhas de investigação foram abertas durante os mais de quatro meses de trabalho. Qual deve ser o resultado final da CPI?
Alessandro Vieira: A CPI está na sua reta final e deve durar mais umas duas ou três semanas. O relator [da CPI, Renan Calheiros] afirmou que pretende colocar seu relatório para votação por volta do dia 22, o que eu acredito que não seja possível, porque surgem fatos novos a todos instantes. Mas também não deve se alongar mais do que isso.
Acho que vamos conseguir mostrar a resposta que o governo federal deu para a pandemia. O que a CPI vai mostrar são muitos erros. E, agora, a gente avança para buscar a motivação para esses erros. O que se encontra é uma grande dose de ignorância, de uma escolha injustificável e contrária àquilo que o mundo estava fazendo. E também há uma parte dessa movimentação motivada pelos interesses de grupos financeiros que tinham atuação no Ministério da Saúde por meio de lobistas.
Temos que apurar isso com muito cuidado e mostrar com clareza e apuração de forma muito sóbria e cuidadosa no resultado final, para não ser uma apuração apenas midiática.
O senhor é autor de um pedido de instalação de outra CPI, para apurar possíveis crimes de rachadinha na família Bolsonaro. Existe viabilidade política para outra investigação em um ano pré-eleitoral?
Alessandro Vieira: Tem condições técnicas. Juridicamente, a gente pode investir em uma CPI dessas, uma vez que ela parte da atuação do então deputado federal Jair Bolsonaro. Ele não pode ser processado durante a vigência do mandato de presidente por fatos anteriores, mas ele pode ser investigado.
A CPI vai permitir que a gente entenda como que esse esquema funciona, essa holding de familiares – onde você tem, em praticamente todos gabinetes, notícias de funcionários fantasmas e da prática de enriquecimento ilícito.
Estamos em processo de coletas de assinaturas [para criar a CPI]. Não estamos correndo com esse processo, pois já temos uma CPI em andamento, além de uma série de pautas. Mas não podemos deixar de lado e nem permitir que tenhamos mais uma eleição em que o eleitor vote sem saber em quem está votando.
Estamos praticamente a um ano das eleições e os nomes que se colocam como candidatos a presidente da terceira via ainda não decolaram nas pesquisas. O que o senhor acredita que falta para essa viabilização?
Alessandro Vieira: A gente vem conversando já há alguns meses com partidos políticos e lideranças que estão se colocando como possíveis pré-candidatos. E, nesse diálogo, se percebe algumas coisas.
A primeira delas é que existe espaço para uma terceira via. Existe uma demanda social muito grande por essa terceira via. Mas, ao mesmo tempo, não se percebe nenhum nome se destacando nessa tentativa de ocupação desse espaço.
Na minha visão, isso acontece porque muitas bandeiras que são caras para a população brasileira não são tocadas por esses pré-candidatos. O Brasil precisa enfrentar, definitivamente, essa questão da corrupção. A gente tem a corrupção contaminando todo processo de tomada de decisão do Brasil. Você não consegue nunca resolver os problemas porque nunca tem foco no problema. O foco está no enriquecimento de determinados grupos.
Da mesma forma, não vejo nenhuma proposta ou defesa consistente de um programa emergencial de retomada econômica, principalmente de garantia para alimentar os milhões de brasileiros que estão vivendo na miséria.
Então foi nesse sentido que coloquei meu nome à disposição [para concorrer a presidente]. Para fazer uma construção que faça sentido e sem nenhum tipo de personalismo e sem nenhum tipo de desejo pessoal que queira ser candidato a qualquer custo.
O combate à corrupção é uma bandeira defendida pelo senhor e que foi encampada pelo presidente Bolsonaro em 2018. Acredita que essa pauta será decisiva em 2022?
Alessandro Vieira: Existe uma massa muito grande de brasileiros que se sente muito decepcionada com o Lula e se decepcionou também com o Bolsonaro.
O presidente não cumpriu exatamente nada daquilo que ele prometeu ou sinalizou na campanha eleitoral. Uma vez no governo, o que ele fez foi se juntar com o Centrão e com o próprio PT para destruir a Lava Jato. Ele destruiu as iniciativas de combate à corrupção.
E os dois [Lula e Bolsonaro] têm medidas que atrasam o país em vários pontos como educação, cultura, saúde. Eles não têm políticas desenhadas.
Então acredito que essa grande massa, que acredita no combate à corrupção, vai buscar uma alternativa para o ano que vem.
O apoio ou uma composição com o ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro poderia ajudar na candidatura do senhor?
Alessandro Vieira: O apoio é uma decisão pessoal. Toda manifestação de apoio é absolutamente pessoal. Eu entendo que exista uma sintonia de bandeiras [com Moro], com algumas diferenças significativas.
Não se pode negar a política, pois ela é o meio para solucionar conflitos da sociedade democrática. A gente precisa fazer política, mas de forma virtuosa, baseada em projetos e com a compreensão das diferenças e em um processo de identificação, seja por meio de lideranças ou dos partidos.
O ministro Sergio Moro, caso tenha interesse em fazer essa jornada política, ele vai ter que enfrentar também esse aspecto de buscar aprofundar o relacionamento para trazer resultado concreto, pois promessa vazia não se sustenta mais.
Não é preciso só ganhar a eleição. Precisa saber como vai governar, como vai se adaptar a essa realidade de um Parlamento que hoje é dono do Orçamento. Eu acho que ele [Moro] precisa ter esse amadurecimento. Mas é um grande nome e que teve uma participação muito marcante na história do Brasil.
Além do senhor, os partidos da chamada terceira via contam com outras pré-candidaturas. No entanto, os líderes admitem que não há espaço para uma pulverização de nomes para a disputa. Existe um compromisso para apoiar um único nome?
Alessandro Vieira: Eu não acredito na unificação de candidaturas. Eu acredito numa redução significativa no número de candidatos. A maior parte das pessoas que vem participando desse processo participa com esse compromisso. Só que esse compromisso não é no ponto de partida, ele é no ponto de chegada. Agora é o momento de darmos alternativas para a sociedade, para que a sociedade sinalize se ela se identifica ou não [com os pré-candidatos].
Não adianta o cidadão ganhar uma prévia eleitoral dentro do seu partido e imaginar que isso vai gerar uma adesão imediata do povo. Não é bem assim. A gente tem que ter um pouco mais de paciência, de envolver esses projetos, manter o diálogo e o compromisso de manter uma caminhada conjunta.
Até lá, é colocar as bandeiras e propostas para que o Brasil possa retomar uma coisa que a gente perdeu, que é a possibilidade de votar na esperança de futuro e não contra alguma coisa. Temos que mostrar que tem solução.
O seu partido, o Cidadania, tem estrutura suficiente para lançá-lo na disputa presidencial?
Alessandro Vieira: Eu entendo que a gente tem que pensar a campanha política de uma forma diferente do que historicamente se faz no Brasil. Aqui em Sergipe eu fui candidato ao Senado em um campanha que gastou pouco mais de R$ 70 mil. Meus adversários gastaram milhares vezes mais que isso e não tiveram a mesma votação.
A chave é o engajamento das pessoas, entender se o Brasil quer esse projeto. Se o Brasil não quer o projeto não faz sentido gastar dinheiro público para fazer campanha. Esse recurso do fundo eleitoral, que por mais que eu seja contra e sempre votarei contra, uma vez que ele exista ele tem que ser direcionado para as candidaturas proporcionais, para que se possa ter capilaridade e se melhore a composição do Congresso.
Essa deve ser a meta para qualquer pessoa que queira ser presidente do Brasil. A gente precisa melhorar a configuração do Congresso Nacional. Um Congresso mal preparado ou contaminado por corrupção é um grande obstáculo para o desenvolvimento do país.
Então dinheiro não é preocupação, pois uma campanha moderna e bem realizada pode dar resultados.
O senhor é fruto de movimentos de formação política, como Acredito e RenovaBR. Esses grupos tiveram um grande peso em 2018. Isso deve se repetir em 2022?
Alessandro Vieira: Os movimentos e as escolas de formação estão fazendo o que os partidos não estão conseguindo fazer. Além do Renova Brasil e do Acredito existem outros como o MBL, o Vem Pra Rua.
Esses grupos terão um papel importante para se fazer um debate com a sociedade. Mas a grande chave está em convencer as pessoas de que é possível ter esperança e apostar em projetos diferentes desses que estão aí e que já são conhecidos. O projeto do Lula já é muito conhecido. O projeto do Bolsonaro já é muito conhecido. Eu acredito, com todo respeito, que eles não podem construir o Brasil que a gente quer para o futuro. São visões do passado e que prejudicam e atrasam o nosso desenvolvimento.
Houve uma grande mobilização do presidente Bolsonaro e dos seus apoiadores para as manifestações do feriado de Sete de Setembro. O senhor vê isso como uma mobilização de campanha?
Alessandro Vieira: A gente precisa separar as manifestações cívicas e históricas do Sete de Setembro, que é um dia de manifestação e celebração pelos brasileiros, dos atos do presidente.
Bolsonaro tentou usar essa data para os seus interesses pessoais e partidários. O pior ainda é quando ele tentou dar uma conotação golpista, uma conotação de ataques e ameaças as instituições ou a membros dessas instituições. Esse não é um papel de cidadão e muito menos de um cidadão que está na presidência da República.
O presidente Bolsonaro chegou a afirmar diversas vezes que não haveria eleições seguras caso o voto impresso auditável não fosse aprovado. O senhor vê algum risco ao pleito do ano que vem?
Alessandro Vieira: O presidente Bolsonaro vive em uma pré-campanha eterna. Ele trabalha muito pouco e tem inúmeras atividades no horário de expediente que são claramente atividades de campanha.
Dentro dessas atividades de campanha, até como mecanismo de defesa e de reconhecimento de uma eventual derrota, ele ataca as instituições constantemente. Eu não acredito em um Bolsonaro participando de um processo eleitoral limpo e democrático. Acredito que ele vai tentar tensionar e romper com esse ciclo democrático, mas também tenho certeza que ele não vai ter sucesso.
As instituições e principalmente as Forças Armadas têm se manifestado de forma constante em defesa da democracia.
O senhor foi delegado da Polícia Civil e recentemente houve uma reação por parte dos governadores em relação à participação de policiais nos atos em apoio ao governo. Qual é a avaliação do senhor sobre isso?
Alessandro Vieira: O Bolsonaro fala muito da categoria policial, mas é importante saber que não existe nenhum tipo de mobilização golpista ou antidemocrática das polícias.
Existem manifestações individuais de pessoas que são integrantes das polícias. O regramento disciplinar é claro: na folga, como cidadão comum, você pode participar da manifestação; mas claro que não se pode cometer nenhum crime.
O que não pode ser admitido é a participação de indivíduos que são policiais ou integrantes das Forças Armadas fardados ou identificados e armados. Ninguém tem o direito de se manifestar armado. Esses são os cuidados.
A Câmara dos Deputados aprovou uma reforma eleitoral que, entre outros pontos, prevê a volta das coligações. A Casa ainda discute um Código Eleitoral que também traz pontos críticos, como o enfraquecimento da Justiça Eleitoral e mudanças nas regras para o Fundo Partidário. Há chance de essas mudanças passarem no Senado?
Alessandro Vieira: Eu sou contrário à volta das coligações. Eu entendo a ansiedade de muitos deputados em ter os meios que garantam suas respectivas reeleições. Mas a gente precisa entender que o Brasil tem uma concentração de partidos; e a gente não pode ficar à mercê de uma situação e fragmentação tão grande que praticamente inviabiliza um trabalho de coordenação.
Além disso, esse tipo de projeto não tem a urgência necessária para ser discutido no meio de uma pandemia em um sistema [de sessões parlamentares] semipresencial, que claramente reduz o debate. Os projetos não passam por comissões.
Acho que a atuação de Arthur Lira [presidente da Câmara] é profundamente lamentável [ao apressar a votação de mudanças eleitorais], mas compatível com o histórico dele.
O Senado tem que ter a responsabilidade e a maturidade de evitar esses erros para que se tenha prejuízos tão graves para o Brasil. E os retrocessos não estão só na seara eleitoral. Temos aí mudanças em tributos e no Orçamento, feitas sem o menor estudo ou análise. Tudo é feito em um anseio de atender o governo, que é um governo que mais liberou emendas aos parlamentares na história do Brasil.
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