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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), acolheu nesta quarta-feira (4) a notícia-crime enviada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e abriu uma investigação contra o presidente da República, Jair Bolsonaro, por suspeita de disseminar "notícias fraudulentas sobre as condutas dos ministros do STF e contra o sistema de votação no Brasil".
A investigação tramitará numa petição sigilosa vinculada ao inquérito das fake news e terá a mesma delegada como responsável, Denisse Dias Rosa Ribeiro.
O ministro deu 10 dias para a Polícia Federal tomar o depoimento de cinco pessoas que participaram da transmissão ao vivo de Bolsonaro na última quinta-feira (29), na qual fez acusações de fraudes nas urnas: Anderson Torres, ministro da Justiça; Eduardo Gomes da Silva, coronel da reserva do Exército; Jeterson Lordano, youtuber; Alexandre Ichiro Hashimoto, professor da Faculdade de Tecnologia de São Paulo; e Amílcar Brunazo Filho, engenheiro especialista em segurança de dados.
Moraes determinou ainda que a Polícia Federal faça a transcrição da live e que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifeste no prazo de até 5 dias.
A notícia-crime foi enviada pelo presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, na última segunda-feira (2). Foi encaminhado ao STF o link da live na qual Bolsonaro apresentou uma série de indícios de fraude em eleições passadas, sem apresentar provas. Na live, o presidente mostrou apenas vídeos que circulam há anos na internet com suspeitas já desmentidas pelo TSE, insistindo na tese de que o processo eleitoral eletrônico é passível de fraude.
Para Moraes, a divulgação do vídeo nas redes sociais foi feita de forma semelhante à disseminação de notícias falsas que tiveram como objetivo, segundo ele, "atentar contra as instituições" -- daí sua ligação com o inquérito das fake news.
O inquérito foi aberto em março de 2019, por ordem do então presidente do STF, Dias Toffoli, para apurar ameaças e ofensas aos ministros. A PGR inicialmente foi contra, por não ter sido consultada previamente. Depois, sob a condução de Augusto Aras, passou a aceitar a investigação desde que participasse. Na prática, porém, várias decisões foram tomadas por Moraes sem aval do procurador-geral.
Os supostos crimes de Bolsonaro a serem investigados
Na decisão, Moraes disse que a conduta de Bolsonaro pode, em tese, configurar os crimes de calúnia, difamação, injúria, incitação ao crime, apologia ao crime ou criminoso, associação criminosa, denunciação caluniosa, além de crimes eleitorais e contra a segurança nacional.
Ele destacou declarações de Bolsonaro que imputariam aos ministros a intenção de fraudar as eleições de 2022 para favorecer o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na live, o presidente disse que "quem tirou o Lula da cadeia e quem o tornou elegível é quem vai contar os votos lá no TSE na sala escura".
Para Moraes, "formula-se uma narrativa que, a um só tempo, deslegitima as instituições democráticas e estimula que grupos de apoiadores ataquem pessoalmente pessoas que representam as instituições, pretendendo sua destituição e substituição por outras alinhadas ao grupo político do Presidente".
Moraes ainda disse que Bolsonaro fez uma "clara ameaça" a Barroso nesta terça (3), ao conclamar apoiadores para fazer uma "concentração na [avenida] Paulista para darmos um último recado para aqueles que ousam açoitar a democracia".
"Neste caso específico, observa-se o nítido objetivo de tumultuar, dificultar, frustrar ou impedir o processo eleitoral, com ataques institucionais ao Tribunal Superior Eleitora e aos seu Ministro Presidente", escreveu Moraes na decisão.
"Não há dúvidas de que as condutas do Presidente da República insinuaram a prática de atos ilícitos por membros da Suprema Corte, utilizando-se do modus operandi de esquemas de divulgação em massa nas redes sociais, com o intuito de lesar ou expor a perigo de lesão a independência do Poder Judiciário, o Estado de Direito e a Democracia", escreveu em outro trecho.
Ele apontou a existência de uma organização criminosa que, além de disseminar "notícias fraudulentas" contra os ministros e o sistema de votação, também buscaria a cassação dos ministros do STF, o fechamento da Corte e o retorno da ditadura.