O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes concedeu nesta segunda e terça-feira (27 e 28) liberdade provisória a 173 pessoas que foram detidas após os atos de depredação ocorridos em 8 de janeiro na Praça dos Três Poderes, em Brasília. A medida foi tomada após semanas de pressão realizada por políticos de direita e advogados contra alegadas arbitrariedades adotadas pelo ministro.
Segundo o STF, até agora, 767 pessoas permanecem detidas e 639 foram liberadas para responder o processo em liberdade, seguindo medidas cautelares.
Os 173 beneficiados pela decisão de Moraes, que estavam nos presídios da Papuda (homens) e Colmeia (mulheres), terão que usar tornozeleiras eletrônicas e estão proibidos de sair do país. Eles também ficam obrigados a cumprir o recolhimento domiciliar durante as noites e nos fins de semana.
O despacho ainda manda que essas pessoas se apresentem ao Juízo da Execução da Comarca de origem em 24 horas e, depois, compareçam semanalmente, todas segundas-feiras.
Em 8 de janeiro, muitos desses manifestantes agiram movidos por uma interpretação equivocada de que a Constituição forneceria base legal para uma intervenção no resultado das eleições. Mas, a ação resultou em atos ilegais de vandalismo, violência e tentativa de interrupção do funcionamento das instituições.
Prisões contrariavam Código de Processo Penal
Os advogados dos manifestantes disseram que Moraes cometeu excessos no aspecto jurídico ao manter os suspeitos presos por tanto tempo. Entre as alegadas arbitrariedades do ministro estão: falta de acesso da defesa à investigação; denúncias genéricas, sem considerar a conduta individual de cada investigado; falta de critério claro para definir quem fica solto e quem permanece preso; e falta de perspectiva sobre onde, como e quando cada caso será analisado na Justiça.
Algumas dessas reclamações foram manifestadas pela própria Procuradoria-Geral da República (PGR) em manifestações enviadas a Moraes desde o início de fevereiro.
O órgão, a quem cabe denunciar os manifestantes, já disse que a maior parte deles não deveria permanecer na prisão preventiva, uma vez que, se condenados, pegarão penas que não levam ao regime fechado. Se provavelmente não ficarão presas após serem julgadas, não faria sentido mantê-las presas antes, quando a culpa ainda não está sentenciada.
É o que determina, aliás, o Código de Processo Penal, em seu artigo 313, segundo o qual a prisão preventiva é admitida nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 anos.
Para a maior parte dos mais de 1,5 mil presos nos dias 8 e 9 de janeiro, a PGR tem apresentado denúncias por crimes cujas penas somam menos tempo: incitação ao crime, com pena máxima de detenção de 6 meses, e associação criminosa, com pena máxima de 3 anos de reclusão.
Essas pessoas, segundo a PGR, teriam sido presas somente por estarem acampadas no QG do Exército ou presentes na Esplanada dos Ministérios ou na Praça dos Três Poderes no dia das invasões, mas sem que tenham entrado no STF, no Congresso e no Palácio do Planalto.
“Não há provas, até esse momento, de ataque direto cometido por eles contra as sedes dos Três Poderes. Se quisessem, poderiam ter se juntado ao grupo violento de manifestantes que, de mãos próprias, tentaram abolir o Estado Democrático e depor o governo legitimamente constituído. Assim não agiram, permanecendo nas imediações do Quartel General ou, mesmo se dirigindo à Praça dos Três Poderes, não adentraram e vandalizaram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal”, disse, em diversas manifestações ao STF, o subprocurador Carlos Frederico Santos, designado na PGR para cuidar do caso.
Prisão preventiva só caberia a quem invadiu e depredou
A prisão preventiva, entende a PGR, caberia só para quem efetivamente invadiu os edifícios e depredou suas instalações; para esses, estariam configurados delitos mais graves, praticados com violência e grave ameaça, com penas que podem superar 30 anos de prisão, em caso de condenação. Contra esses, a PGR vem apresentando denúncias pelos crimes de associação criminosa armada; abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado contra o patrimônio da União, além de deterioração de patrimônio tombado.
Ainda assim, muitos advogados apresentam outros motivos para acabar com a prisão preventiva. Dizem que na audiência de custódia, realizada nos dias seguintes à prisão, os juízes convocados por Moraes para verificar a legalidade da prisão em flagrante, deixaram de considerar se realmente havia risco para a ordem pública com a soltura. Essa avaliação, dizem, foi aleatória e coube ao próprio Moraes. Para uns, concedeu liberdade, para outros, não.
É o que diz o advogado Anderson Cortez, que defende cerca de 20 pessoas investigadas por Moraes. “Não tem fundamento para manter a prisão de muitas pessoas. Parte delas estava um pouco mais envolvida um pouco, no sentido de ter mais provas nas redes sociais, com incitações à invasão. Outras, nem tinham redes sociais, como uma cliente minha de 59 anos, aposentada e cardiopata. Era de Minas Gerais, e morava no Espírito Santo. Foi presa no dia 9 perto do QG. Pediram para ela entrar num ônibus dizendo que seria levada à rodoviária de Brasília para ir embora, mas ficou presa”, afirmou à reportagem.
Cortez diz que nenhum dos pedidos de revogação de prisão foi analisado por Moraes. Ele considera que a concentração dos processos com o ministro é outro problema. O acúmulo de centenas de casos não permitiria uma análise mais célere dos recursos em favor da soltura. Também é imprevisível o que ele fará: se enviará todos os casos para a primeira instância, já que quase todos os investigados não têm foro privilegiado; ou se manterá os casos no STF.
Políticos de direita vão a prisões e ao STF
Além de ações judiciais e protestos públicos dos advogados dos presos, políticos de direita vêm pressionando Moraes nas últimas semanas. Alguns visitaram os locais de prisão, como o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) e os senadores Cleitinho (Republicanos-MG) e Magno Malta (PL-ES), todos recém-eleitos e aliados próximos do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Na semana passada, Magno Malta esteve no STF junto com os também senadores recém-empossados Hamilton Mourão (Republicanos-RS) e Rogério Marinho (PL-RN) para uma reunião com a presidente da Corte, Rosa Weber. Eles foram pedir que a conduta de cada preso seja avaliada individualmente, especialmente para libertar aqueles com acusações mais leves, como os que estavam no QG do Exército.
“Deploramos o que aconteceu, mas o fato é que há uma necessidade, e tivemos a simpatia da ministra, de que haja a individualização dos delitos para que aqueles que não devem possam ser liberados e aqueles flagrados possam ter a imputação adequada. É necessário fortalecer a democracia brasileira e nós esperamos que com uma eventual reunião com Moraes, ao longo dos próximos dias, possamos ter essa condição de ter essa individualização para separarmos o joio do trigo”, disse Marinho ao final da reunião com Rosa Weber.
STF diz que liberdade é provisória e que investigações não acabaram
Segundo informações divulgadas pelo STF no fim da manhã desta terça-feira (28), a liberdade concedida aos denunciados é provisória, porque “as investigações não os apontaram como financiadores ou executores principais”.
Assim, os denunciados libertos serão submetidos ainda a sanções, como o cancelamento de passaporte e a suspensão de porte de arma de fogo. Por fim, o ministro determinou a notificação dos órgãos os envolvidos para cumprimento das medidas cautelares.
Na análise específica de casos, Moraes avaliou que a maioria dos suspeitos soltos tem a condição de réu primário e filhos menores de idade. Pelas regras do STF, os denunciados foram notificados a apresentar defesa prévia em 15 dias.
Parlamentares ouvidos pela Gazeta do Povo informaram que a notícia sobre a libertação de presos começou a circular nos bastidores da capital federal na noite de segunda.
No último sábado, Moraes definiu que os presos, com prisões efetivadas no dia 9 de janeiro, poderiam receber visitas conforme regras gerais do sistema prisional local, previstas na Portaria 008/2016 da Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal, contemplando situações excepcionais.
Dos 1.406 presos em janeiro, 803 continuam detidos
Em 20 de janeiro, Alexandre de Moraes concluiu a análise da situação dos presos por envolvimento na destruição de prédios públicos, sedes dos Poderes da República. Foram analisadas atas de audiência relativas a 1.406 custodiados. Destes, 942 pessoas tiveram prisão em flagrante convertida em preventiva e outros 464 obtiveram liberdade provisória, mediante medidas cautelares, podendo responder ao processo mediante uso de tornozeleira eletrônica, entre outras medidas. Mais de 300 haviam sido libertados em uma primeira leva de solturas em 20 de janeiro.
O argumento para as prisões preventivas foi a de que era preciso garantir a ordem pública e a efetividade das investigações. O ministro apontou evidências de crimes de terrorismo, associação criminosa, abolição violenta do estado democrático de direito, golpe de estado, ameaça, perseguição e incitação ao crime.
Em relação aos que estavam na primeira leva de libertados, o ministro considerou que, embora houvesse fortes indícios de autoria na participação dos crimes, não tinham sido obtidas provas da prática de violência, invasão dos prédios e depredação do patrimônio público. Por isso, ele entendeu ser possível substituir a prisão por medidas cautelares.
Inicialmente, com base nos primeiros dados divulgadas pelo STF, essa reportagem informou que Alexandre de Moraes havia soltado 137 pessoas presas nos dias 8 e 9 de janeiro. Por volta das 18h45, a assessoria do tribunal atualizou os números, publicados na última versão desta reportagem.
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