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perseguidos por moraes
O ex-deputado Homero Marchese, o deputado Eduardo Bolsonaro e o jornalista Rodrigo Constantino foram citados nas encomendas de relatórios feitas por Moraes.| Foto: Montagem/Reprodução

Nos diálogos revelados pela Folha de S.Paulo que mostraram a existência de um gabinete paralelo contra a direita dentro do Judiciário brasileiro, fica claro que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), escolhia alvos a dedo para perseguir.

Embora já tivessem consciência do caráter clandestino dos inquéritos de Moraes desde seu início, os perseguidos declaram ter recebido com surpresa a revelação de que o ministro encomendava e ajustava pessoalmente os relatórios.

"Por mais que a gente já soubesse das arbitrariedades cometidas no inquérito, em que os direitos constitucionais são violados, em que eles não têm preocupação nem de citar o acusado da existência do processo, eu nunca imaginei que o próprio ministro encaminharia um pedido para que o TSE [Tribunal Superior Eleitoral] fizesse um relatório e indicasse que a origem era anônima. Achei que aí já era demais, mas infelizmente é a verdade", comenta o ex-deputado estadual paranaense Homero Marchese, um dos alvos escolhidos a dedo por Moraes.

Marchese foi censurado em novembro de 2022 e teve suas redes sociais bloqueadas durante meses por ter emitido uma opinião sobre possíveis inconsistências na segurança das urnas eletrônicas brasileiras. Em maio, a Justiça do Paraná determinou que Marchese deveria receber da União uma indenização de R$ 20 mil pelos danos morais decorrentes da censura, mas Moraes cassou essa decisão.

O colunista da Gazeta do Povo Rodrigo Constantino, que também entrou na lista do juiz, ficou surpreso com o caráter mafioso dos diálogos. Para ele, a certeza da impunidade "talvez tenha feito eles relaxarem".

"Eu já sabia que o Alexandre vinha operando totalmente à margem da lei e usando capangas, mas quando você vê o tipo de linguagem, a postura, tudo isso que remete ao mundo do crime, é óbvio que não deixa de provocar certo espanto", diz. "O que me chamou mais atenção e me surpreendeu foi a postura de máfia mesmo, linguajar de máfia", acrescenta.

Moraes pedia ao juiz instrutor de seu gabinete no STF, Airton Vieira, relatórios que deviam ser formulados por Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED). Nas mensagens, fica claro que o ministro solicitava ajustes a seu próprio gosto, no nível dos detalhes, durante a produção dos relatórios de acusação que ele mesmo julgaria depois.

Em uma das mensagens divulgadas, Vieira orientou o servidor a "caprichar" no relatório contra Constantino. "Eduardo, bloqueio e multa pelo STF (Rodrigo Constantino). Capriche no relatório, por favor. Rsrsrs. Aí, com ofício, via e-mail. Obrigado", diz um trecho do material.

Outra vítima dos relatórios encomendados foi o deputado federal Eduardo Bolsonaro. Em conversas de novembro de 2022, Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes, pediu a Tagliaferro para relacionar Eduardo com o marqueteiro argentino Fernando Cerimedo, que naquele ano fez uma live apontando irregularidades nas eleições.

Pelas redes sociais, Eduardo Bolsonaro mostrou indignação com a escolha a dedo de alvos. "Estou sendo perseguido em meu CPF por um ministro do STF que deseja me prender. Por corrupção? Por assassinato? Não, por eu defender meus eleitores e não me dobrar às pressões dos poderosos", disse.

Desertor do gabinete paralelo teme vingança de Moraes

Assim como em máfias, Moraes já ensaia exercer controle sobre desertores do gabinete paralelo. Sua recente decisão de converter Eduardo Tagliaferro, ex-membro do gabinete, em alvo do inquérito é um exemplo disso.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Tagliaferro relatou o temor que sente de ser vítima de uma vendeta.

"Tenho alguns receios, sim. Considerando a explicação do meu advogado, dr. Eduardo Kuntz, esse inquérito nem deveria existir da forma como foi feito", disse. "Na visão dele, ao ministro Alexandre fazer ele mesmo a abertura, e me colocar em uma situação de desconfiança, pode ter como consequência até mesmo uma determinação de prisão. Seria muito constrangedor, porque não fiz nada de errado. Espero sinceramente que isso não aconteça."

Mudar situação é difícil, mas impeachment seria pedagógico, dizem vítimas do ministro

Para os alvos da perseguição, há uma cadeia de cumplicidade tão arraigada na cúpula do Judiciário que uma mudança consistente requer tempo. Ainda assim, o impeachment de Moraes é necessário, como medida pedagógica.

"Vi algumas pessoas falando que não adianta fazer o impeachment dele, porque 'o Lula coloca outro comunista lá'. O que essas pessoas estão negligenciando é justamente o fator pedagógico. O Alexandre Moraes hoje é o símbolo maior do regime de exceção, da perseguição política, da opressão, do autoritarismo, da ditadura mesmo que o Brasil vive", afirma Constantino. "Eu acho fundamental para o país que o Alexandre Moraes não saia impune de tudo isso que veio à tona."

Marchese também crê que "o pedido de impeachment é bastante importante" e recorda que "a história está cheia de exemplos de situações em que o poder mudou de mão e aquele que era o acusador, a pessoa que comandava as medidas contra os outros, acaba virando acusado".

"Muda-se a estruturação de poder e a sociedade tem a vontade de acertar as contas com o passado. Eu acho importante, por conta disso, historiar o que está acontecendo, falar para as pessoas, expor cada vez mais o que está acontecendo, porque pode até demorar um pouquinho, mas eu acredito que a justiça pode ser feita", comenta o ex-deputado.

Para Constantino, um cenário desolador seria que nada acontecesse após todas as revelações contra Moraes. "Se ficar por isso mesmo, eu realmente acho que dessa vez – e não é figura de linguagem, não – dá pra dizer que o Brasil acabou como um projeto de país sério, como tentativa de uma república, ainda que inacabada. Acabou. Seria o famoso game over."

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