A Amazônia é peça-chave para entender como a eleição presidencial nos Estados Unidos pode afetar o Brasil. Embora haja uma série de outros elementos na relação entre os governos brasileiro e americano, a floresta amazônica tem potencial para abrir ou fechar portas para acordos e parcerias estratégicas entre as duas nações. Especialmente considerando que existe uma posição divergente entre Donald Trump e Joe Biden sobre a Amazônia.
Desde o início de seu mandato, o presidente Trump nunca deu sinais de qualquer tentativa de ingerência externa sobre a Amazônia. Com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, há dois anos, o entendimento sobre não interferência dos norte-americanos sobre a região amazônica não apenas se manteve, como evoluiu, a ponto de Trump demonstrar apoio público às políticas do governo brasileiro para a floresta, em 2019.
O posicionamento de Trump sobre a Amazônia se tornou, portanto, um elemento imprescindível para pavimentar a atual aliança estratégica entre os dois países. “A Amazônia não foi o único ponto a trazer esse alinhamento, porque há similaridades entre os dois países nas agendas conservadora, de defesa e segurança, e, agora, mais recentemente, de tecnologia. Mas teve sua importância, sim”, reconhece um auxiliar do Palácio do Planalto.
Os militares que, historicamente, veem com receio a suposta cobiça internacional sobre a Amazônia, se dizem satisfeitos com a posição dos Estados Unidos para a região. Para eles, o perfil não intervencionista de Trump é o ideal.
Planalto teme que Biden mude posição sobre Amazônia
A mesma segurança que os militares sentem em relação a Trump não se reflete, entretanto, com o candidato democrata Joe Biden. Especialmente por causa de recentes declarações dele. Biden falou de “consequências econômicas significativas” caso o Brasil permaneça, do ponto de vista dele, leniente às queimadas e ao desmatamento ilegal.
Há um receio no Planalto de que, se o democrata for eleito, os Estados Unidos vão abandonar sua relação de neutralidade em relação à Amazônia. “A região amazônica é um ponto focal do Biden. E, falando de cenários possíveis desenhados sobre o que ele fala, há de fato um temor de que ele adote uma política intervencionista sobre nossa soberania. Não sabemos a capacidade que ele teria de bancar isso já estando no cargo [de presidente dos Estados Unidos]. Mas, certamente, é algo que preocupa”, diz um militar do governo.
As Forças Armadas brasileiras veem as declarações de Biden como uma ameaça que pode se estender a conquistas importantes para a defesa nacional. “Quando ele fala de ‘consequências econômicas’, entendemos que isso pode afetar a Defesa, ao desandar projetos conjuntos, como a Base de Alcântara [de lançamento de foguetes e satélites] e a designação do Brasil como aliado [militar] prioritário extra-Otan [Organização do Tratado do Atlântico Norte]”, diz um militar governista.
Também há o receio no governo de que a Amazônia possa servir de pretexto para travar acordos entre os dois países nas mais variadas áreas – especialmente na área comercial. E. inclusive, que a questão ambiental seja usada para promover retaliações comerciais ao Brasil.
Em caso de vitória de Biden, governistas dizem que o Planalto vai deixar claro ao governo democrata sua retórica de soberania sobre a Amazônia, além de apresentar suas propostas de política ambiental e medidas feitas para conter incêndios e o desmatamento ilegal.
Diplomaticamente, a ideia não é pautar o relacionamento tendo a região amazônica como espinha dorsal. Mas deixar claro, antecipadamente, que essa é uma agenda que a gestão Bolsonaro não abre mão.
Especialista diz que, mesmo com vitória de Trump, Brasil pode ter dificuldades
A especialista em sustentabilidade Verônica Prates, gerente da BMJ Consultores Associados, afirma que a estratégia do governo em caso de vitória de Biden é coerente. Ela não descarta que um possível governo Biden condicione a manutenção de relações e novas negociações, como apoio à entrada do Brasil na Organização para Cooperação e Desenvolvimento econômico (OCDE, o "clube" de nações ricas), a mudanças na política ambiental brasileira, sobretudo na Amazônia. “A Amazônia pode não ser o único fator, mas, muito provavelmente, vai ser um deles”, diz Verônica.
A tendência, em caso de vitória dos democratas, é que os Estados Unidos tenham uma postura mais crítica ao Brasil no que se refere à região amazônica, reconhece Verônica. “Vai ser revista a postura do próprio governo brasileiro com relação aos Estados Unidos. Então, podemos ter uma relação mais combativa e um pouco mais de oposição por parte do governo.”
A especialista afirma que essa ruptura na aliança estratégica pode causar impactos. “Podemos ter repercussões em formas de sanções econômicas, que podem vir desde corte de apoio financeiro, restrições ao comércio, restrições a entraves de produtos brasileiros, enfim. Agora, eu não visualizo essa relação deteriorando mais do que isso, para algo mais radical”, afirma Verônica.
Uma vitória de Trump, porém, ajudaria a consolidar a relação já construída. “Muito provavelmente haverá a manutenção da postura que eles têm mantido desde o ano passado. Enquanto sofremos duras críticas com relação à Amazônia vindo da Europa, os Estados Unidos se mantêm neutros”, diz.
A especialista alerta, contudo, para a pressão das empresas norte-americanas. “Não quer dizer que o setor privado americano e a comunidade americana não vão se manifestar. Inclusive, na Europa, por exemplo, muito dessa pressão [contra o Brasil] por mudanças [na agenda ambiental] veio do setor privado.”
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